Líbano comemora 76 anos da República sob contestação

Líbano comemora 76 anos da República sob contestação

Manifestantes tomam às ruas do país pedindo nova independência

AFP

Marchas civis denunciam corrupção e incompetência da classe política

publicidade

O Líbano comemora nesta sexta-feira o 76º aniversário do nascimento da República, em plena contestação popular contra a classe dominante e esperançosa de uma "nova independência" para o país. Desde 17 de outubro, o país vive protestos sem precedentes contra os líderes políticos, considerados incompetentes e corruptos.

O movimento inspirou em centenas de milhares de libaneses o desejo de uma mudança no sistema de governo, inalterado há décadas. "É a primeira vez que os libaneses, todas as comunidades juntas, protestam massivamente sem o apelo de partidos e contra todos os partidos", disse à AFP Tamara, uma estudante de 21 anos em Beirute. "Esta é a verdadeira independência", acrescentou.

Em 22 de novembro de 1943, o Líbano, sob mandato francês desde 1920, conquistou a independência após manifestações populares que reuniram, em uma primeira onda de unidade, cristãos e muçulmanos. O país, porém, passou por uma guerra civil (1975-1990) e duas ocupações estrangeiras, israelense (1978-2000) e síria (1976-2005).

E permaneceu profundamente dividido, confessionalmente e politicamente. Mas este ano, na Praça dos Mártires, centro dos protestos, Wajed também se prepara para celebrar um tipo diferente de independência.

"Marchas civis"

"Queremos a nossa independência dos (...) corruptos que nos governam", proclamou esse manifestante de 26 anos. "Quando os franceses foram embora (...), outros nos ocuparam", disse, referindo-se aos partidos no poder há décadas. A contestação virou de cabeça para baixo o programa de comemorações do aniversário de independência.

O tradicional desfile militar realizado anualmente à beira-mar se transformou em uma modesta parada pela manhã, dentro dos muros do ministério da Defesa, na presença do presidente Michel Aoun e do primeiro-ministro Saad Hariri. A cerimônia formal agendada no palácio presidencial foi cancelada. Para Wajed, isso constitui uma "vitória" adicional para um movimento que já levou à renúncia do governo em 29 de outubro e impediu a realização de sessões parlamentares sobre uma controversa lei de anistia geral.

Ao mesmo tempo, não há solução à vista para esse impasse, pois o país está mergulhado em uma crise econômica persistente. Em um discurso televisionado na quinta-feira à noite, Aoun reiterou seu pedido de "diálogo", mas sem fazer uma proposta concreta. Além disso, se o movimento permanecesse pacífico, e a resposta das autoridades comedida, duas pessoas morreram à margem das manifestações.

Mas a determinação não diminui, e os apelos dispararam nas redes sociais para organizar "marchas civis" no país para exigir a saída das autoridades políticas. Velas, luzes de celulares e isqueiros: os manifestantes também foram chamados via WhatsApp para fazer brilhar a "luz da independência" após o anoitecer. Uma versão revisitada do hino nacional está circulando em homenagem às mulheres, na linha de frente da contestação.

Diáspora mobilizada

Em sua história moderna, o país experimentou outros movimentos populares. Em 2005, a "Revolução do Cedro" ocorreu após o assassinato do ex-primeiro ministro Rafic Hariri, atribuído ao regime sírio. Mas as mobilizações em massa, que resultaram na saída das tropas de Damasco, foram organizadas por partidos, agora integrantes de um regime amplamente descreditado.

"O sentimento deste ano é diferente", resume Dina Abu Dahr, 55 anos, na Praça dos Mártires. "Esta é a primeira vez que (a festa da) independência faz sentido para mim". Não muito longe da imponente Mesquita de Al-Amine, Youssef el Gherez montou com outros barracas onde acontecem reuniões de coordenação, debates e até sessões de ioga. "As pessoas (...) querem mudar as coisas em profundidade, até as raízes", disse.

Muitos expatriados também decidiram participar deste extraordinário 22 de novembro. Uma campanha surgiu nas redes sociais, explica Tracy Saad, uma estudante de 23 anos em Amsterdã que é uma das coordenadoras. "Nos organizamos em grupos para negociar tarifas preferenciais", contou ela. Centenas de pessoas deverão vir do Golfo, Europa, América do Norte ou da Austrália. Vão se dirigir em passeata do aeroporto até a Praça dos Mártires, para participar de festividades populares.


Mais Lidas

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895