Mudança climática ameaça Canal do Panamá 20 anos após devolução

Mudança climática ameaça Canal do Panamá 20 anos após devolução

Em 2019, chuvas na região ficaram 27% abaixo da média para o ano

AFP

Degelo polar pode criar novas rotas marítimas de concorrência

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A falta de chuvas ameaça as operações do Canal do Panamá, já comprometidas pela queda do comércio, 20 anos após a transferência da administração americana para as mãos panamenhas. Ao meio-dia de 31 de dezembro de 1999, a ex-presidente panamenha Mireya Moscoso hasteou pela primeira vez a bandeira do país no edifício da administração do Canal, em um clima de euforia.

O Panamá recebeu a via interoceânica da parte do governo dos Estados Unidos, que a inaugurou em 15 de agosto de 1914 e a administrou por 85 anos. Vinte anos depois, a mudança climática é a principal ameaça para a via de 80 quilômetros, que liga o Oceano Pacífico e o mar do Caribe. Os principais usuários são Estados Unidos, China e Japão.

"A mudança climática no Canal do Panamá está amplamente evidenciada", disse o administrador da via, o economista Ricaurte Vásquez. Os alarmes foram acionados porque o país enfrenta níveis mínimos históricos de chuvas. Isso gerou "um déficit de água importante" nos lagos da bacia hidrográfica que abastecem a rota. "O desafio que o Canal do Panamá enfrenta agora é como resolver a demanda de água pelos próximos 50 anos", disse Vásquez.

A Autoridade do Canal do Panamá (ACP) afirmou que este ano as chuvas ficaram 27% abaixo da média. Além disso, a temperatura do lago Gatún, principal afluente do Canal, subiu 1,5 grau Celsius na última década, o que produziu uma perda significativa de água por evaporação. A situação fez com que dos 5,25 bilhões de metros cúbicos de água doce necessários para que o Canal opere de maneira sustentável, o local disponha apenas de 3 bilhões.

A falta de água pode criar incerteza para as empresas de navegação. As autoridades do Canal temem que estas possam procurar outras rotas marítimas como o Canal de Suez que, admite a ACP, reduziu os pedágios em 60% e tem custos de operação mais baratos.

Além disso, a mudança climática "ameaça o degelo dos polos, especialmente no Polo Norte, o que poderia abrir novas rotas marítimas de concorrência", destacou Felipe Chapman, da empresa Indesa. A ACP adotou várias medidas, consideradas insuficientes. Agora cogita buscar novas fontes de água, subterrânea ou de estações de tratamento, construção de reservatórios ou dessalinização de água do mar. Mas o custo das medidas pode afetar negativamente a contribuição anual do Canal para o Tesouro panamenho, que este ano foi de 1,786 bilhão de dólares.

Queda do comércio e novas rotas

O Canal, ampliado em 2016 e usado principalmente por navios em rotas da Ásia (China, Japão e Coreia do Sul) para a costa leste dos Estados Unidos, também enfrenta a queda do comércio com a desaceleração da economia global. O perigo vem de fatores que "obedecem a padrões globais que estão fora do controle do Panamá, e que tem a ver com a consolidação das economias asiáticas, principalmente a China", declarou Horacio Estribí, assessor do ministério da Economia.

A rota panamenha recebia há pouco temo 5% do comércio mundial, mas o número caiu a 3,5%, apesar de ter registrado este ano o recorde de faturamento (US$ 3,365 bilhões) e de carga (450,7 milhões de toneladas). A incerteza do comércio mundial com a nova onda de protecionismo também gera preocupação.

Vinte anos depois da transferência de controle, Vásquez não tem dúvidas de que o Canal do Panamá vai seguir forte, mas alerta: "Não podemos continuar presos ao modelo tradicional de negócios, temos mais concorrência e as rotas estão mudando".


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