Não existe prazo de validade para justiça às vítimas do Terceiro Reich, diz advogado alemão

Não existe prazo de validade para justiça às vítimas do Terceiro Reich, diz advogado alemão

Thomas Walther representa sobreviventes e familiares de pessoas levadas aos campos de concentração do regime nazista

AFP

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Não existe um "prazo de validade" para fazer justiça às vítimas dos crimes do Terceiro Reich: é esta convicção que guia o advogado Thomas Walther em sua perseguição dos últimos nazistas julgados, no fim de suas vidas, pelos tribunais alemães. O advogado, de 78 anos, representa os sobreviventes e familiares de pessoas levadas pelo regime de Hitler ao campo de concentração de Sachsenhausen, perto de Berlim.

Um ex-guardião desse campo, de 100 anos, comparece a partir de quinta-feira (7) à Justiça na Alemanha por "cumplicidade com as mortes" ocorridas entre 1942 e 1945. Após uma carreira de juiz, Thomas Walther esperou se aposentar para embarcar em um novo rumo, totalmente dedicado às vítimas do Holocausto e a seus descendentes. "Estar ciente de uma injustiça implica o dever de corrigi-la", disse à AFP.

O advogado alemão coletou, ao redor do mundo, depoimentos que permitiram iniciar nos últimos anos vários processos contra os responsáveis pela máquina de extermínio nazista. Mesmo 66 anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, os processos permitiram "fazer justiça para dezenas de milhares de vítimas de assassinatos. A justiça não tem prazo de validade", afirmou Walther.

Advertência para o presente

As controvérsias sobre a pertinência de uma justiça tão tardia irritam o advogado: "ninguém protesta quando um assassino é perseguido por crimes de 30 anos atrás, mas acham problemático perseguir idosos, mesmo que se trate de 1 mil, ou 5 mil assassinatos". Localizado a cerca de 30 quilômetros ao Norte de Berlim, o campo de Sachsenhausen recebeu entre 1936 e 1945 quase 200 mil prisioneiros, sobretudo, opositores políticos, judeus e homossexuais.

Dezenas de milhares de pessoas morreram, principalmente de exaustão, devido ao trabalho forçado e às condições de prisão "deploráveis (...) que tinham o objetivo de matá-las", segundo Walther. O advogado quer acreditar que esses procedimentos também oferecem aos réus um processo para "a justiça e a paz". E envia uma "advertência" dissuasiva: "há lugares e atos, aos quais ninguém deve se associar", sob a pena de algum dia ter de responder por seus crimes.

Tempo recuperado

Josef S., o guardião do campo julgado na quinta-feira, radicado em Brandeburgo, região vizinha de Berlim, não se pronunciou antes de seu processo. Com 21 anos em 1942, era apenas um cabo. Com mais idade durante a guerra, "os oficiais de maior escalão morreram há muito tempo (...). Em tese, apenas os cargos inferiores podem estar vivos hoje" para depor à Justiça, explicou o advogado.

Na semana passada, uma mulher de 96 anos que trabalhou como secretária de um campo de concentração nazista iria comparecer à Justiça alemã. A audiência foi adiada para 19 de outubro, porque a idosa fugiu. Acabou sendo encontrada horas depois. Se os criminosos nazistas de segunda categoria devem ser responsabilizados hoje, é, em grande parte, graças a uma jurisprudência iniciada por Walther. Reconhecido por seu trabalho, ele já foi condecorado com a Cruz Federal ao Mérito, máxima distinção da Alemanha.

Nos anos 2000, ainda juiz, Walther elaborou o documento de acusação que conduziu, em 2011, à condenação de John Demjanjuk, de 90 anos, ex-guarda do campo de extermínio de Sobibor. Desde então, todas as engrenagens da máquina de extermínio são suscetíveis a serem perseguidas.

É uma forma de a Justiça alemã se redimir de sua falta de determinação para perseguir os principais culpados. "Conheço todos os meios possíveis usados por promotores e juízes há 30 ou 40 anos para abandonar os casos, ou exonerar os acusados de crimes nazistas", contou o ex-magistrado. "Essas práticas não têm nada a ver com o direito e com a justiça", afirmou.


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