Papa pede perdão a ciganos por "discriminação e maus-tratos" da Igreja

Papa pede perdão a ciganos por "discriminação e maus-tratos" da Igreja

Francisco considerou que "a história nos diz que, até mesmo cristãos, inclusive os católicos, não são estranhos a tanto mal"

Correio do Povo e AFP

Francisco foi recebido por milhares de pessoas no bairro de Barbu Lautaru

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O papa Francisco pediu perdão aos ciganos em nome da Igreja pelos ma, durante um encontro neste domingo com representantes deste povo na cidade de Blaj, na região central da Romênia. "Peço perdão, em nome da Igreja, ao Senhor e a vocês, pelas vezes em que, no curso da história, nós os discriminamos, maltratamos ou os olhamos mal, com o olhar de Caim em vez do de Abel, e não fomos capazes de os reconhecer, apreciar e defender na sua peculiaridade", declarou o pontífice em um discurso dirigido à comunidade cigana do país, que conta com entre um e dois milhões de pessoas entre os 20 milhões de habitantes da nação, onde constituem uma aglomorados pobres e muitas vezes marginalizados.

O Pontífice lamentou que "a história nos diz que, até mesmo cristãos, inclusive os católicos, não são estranhos a tanto mal". "A Caim, não importa o irmão. É na indiferença que se alimentam preconceitos e fomentam rancores. Quantas vezes julgamos, imprudentemente, com palavras que doem, com atitudes que semeiam ódio e criam distâncias! Quando se deixa alguém para trás, a família humana não avança. Não somos completamente cristãos, nem sequer humanos, se não soubermos ver a pessoa antes de suas ações, antes dos nossos juízos e preconceitos", defendeu o argentino.

Francisco disse aos ciganos que, como povo, eles têm um papel de protagonista a ser assumido e não devem ter medo de partilhar e oferecer as caraterísticas específicas que moldam e marcam o seu caminho: “O valor da vida e da família em sentido alargado; a solidariedade, a hospitalidade, a ajuda, o apoio e a defesa dos mais frágeis no seio da sua comunidade; o respeito e a valorização dos idosos; o sentido religioso da vida, a espontaneidade e a alegria de viver”.

O Papa os convidou “a caminhar juntos, lá onde estiverem, na construção dum mundo mais humano, superando medos e desconfianças, deixando cair as barreiras que nos separam uns dos outros, alimentando a confiança recíproca na busca, paciente e nunca vã, da fraternidade. Esforçar-se por caminhar juntos com dignidade: a dignidade da família, a dignidade de ganhar o pão de cada dia e a dignidade da oração. Sempre olhando para frente”.

O encontro veio depois de uma cerimônia em Blaj em que Francisco beatificou sete bispos que foram presos e torturados durante o regime comunista na Romênia. Autoridades detiveram os homens em 1948 por traição depois que eles se recusaram a se converter ao cristianismo ortodoxo. Todos os sete morreram em confinamento e foram enterrados em segredo.

Segregação histórica

Ao longo da história, os ciganos têm enfrentado perseguições na Europa e centenas de milhares foram mortos durante o Holocausto. Atualmente, eles vivem principalmente no sul e centro da Europa e representam entre 10 e 12 milhões de pessoas, isto é, 1,2% da população da União Europeia. Eles estão presentes em muitos países, incluindo Hungria, Bulgária, França, Grécia, República Tcheca ou Itália, e reclamam que lutam para conseguir trabalho por causa da discriminação, e muitos vivem na pobreza.

Apesar do nível de vida dos ciganos ter melhorado desde que o país entrou para a União Europeia (em 2007), ainda existem "bolsões de miséria, guetos urbanos ou rurais onde nada mudou", afirmou o sociólogo Gelu Duminica, originário desta comunidade. "É um círculo vicioso, no qual o acesso limitado à educação leva a um reduzido acesso ao mercado del trabalho", completou.

A minoria romani continua esperando que a Igreja ortodoxa, majoritária no país, peça desculpas depois de ter submetido a comunidade à escravidão durante 500 anos, até meados do século XIX.  O papa dedicou a viagem à Romênia à "coexistência fraternal" entre religiões, idiomas e culturas. O país, que tem a segunda maior Igreja ortodoxa do mundo em número de fiéis, reconhece 18 minorias nacionais, fruto da história de um território que fica em cruzamento de influências latinas, orientais e eslavas. 


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