BPChoque organiza treinamento à imprensa para a Copa América

BPChoque organiza treinamento à imprensa para a Copa América

Profissionais puderam conhecer um pouco mais da atividade policial e a maneira mais segura de cobrir conflitos

Franceli Stefani

No campo do batalhão, os policiais fizeram uma demonstração sobre o avanço em uma possível ação real

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É muito comum em uma manifestação ou desordem pública perceber policiais militares com fardas escuras, escudos e capacetes pretos, posicionados em linha para proteger o patrimônio público, a integridade física das pessoas ou o direito de ir e vir da população. Eles atuam em reintegrações de terra, no controle de presídios, jogos de futebol, em votações na Câmara de Vereadores, protestos, entre outros. São homens e mulheres que dedicam parte da sua vida para treinar, servir o Estado e proteger a população. Eles são os integrantes do Batalhão de Polícia de Choque (BPChoque).

Com a aproximação dos primeiros jogos da Copa América, o primeiro BPChoque realizou um treinamento voltado para profissionais da imprensa na sede da unidade, em Porto Alegre. Os 15 participantes tiveram mais de 10 horas de explanações técnicas, teórica, demonstrações de equipamentos utilizados durante as atividades profissionais e, a mais esperada pelos participantes, a parte prática – que tomou boa parte da tarde da segunda-feira, dia 10.

Foto: Ricardo Giusti

Recebidos pelo comandante da unidade, coronel Cláudio dos Santos Feoli, coube aos capitães Leonardo Luizelli Altafini, Wellington Camargo de Oliveira e ao segundo sargento, Daniel dos Santos Barboza, a tarefa de acompanhar os passos dados pelos jornalistas e fotógrafos durante o dia de atividade intensa. O principal foco, falou logo no início o comandante, era orientar o posicionamento daqueles que são responsáveis por divulgar as informações à população no terreno, com segurança, principalmente durante manifestações e ocorrências em que os policiais precisam atuar.

Com habilidade ao elencar as funções do batalhão, o capitão Altafini conduziu cerca de quatro horas de explicações, demonstrações e também respondeu aos tantos questionamentos feitos pelos profissionais. Junto com Wellington, demonstrou o nível de exigência para ser um integrante do Choque e o porquê da necessidade de treinar, treinar e sempre treinar, de conhecer os equipamentos usados e de confiar no colega, no líder e no feeling ao se deparar com uma situação. Um choqueano - integrante da tropa - não pode errar. Ele precisa prezar pela sua vida e pela do outro. Precisa ter precisão, cautela, capacidade de análise de risco, calma ao agir e responsabilidade.
No turno da tarde foi a parte prática. Depois de explicar quais são as munições utilizadas, os sprays de pimenta, o armamento, os equipamentos de proteção individual e quando/como cada um deles são usados, foi a hora de sentir na pele o que é vestir a “armadura”, sentir a pressão e, porque não, a tensão que cada um enfrenta quando entra em um “campo de batalha”. A responsabilidade, acredite, é enorme.

Pois bem, antes de escolher o capacete, o colete balístico e demais equipamentos, teve a experimentação do spray de pimenta. Em uma sala de treinamentos, os profissionais sentaram e aguardaram menos de 15 segundos para sentir o poder do jato. Os olhos começam a lacrimejar. O nariz tem coriza. A garganta se irrita. É impossível segurar a tosse. Outros, espirram. E imediatamente saem do espaço em busca do ar limpo e fresco. Uma dica: contra o spray não adianta esfregar os olhos. Vento e água em abundância são capazes de eliminar o produto da pele.

Foto: Ricardo Giusti

Para amenizar os efeitos é preciso não esquecer de puxar o ar. Respirar curto, constantemente, sempre lembrando de salivar. Tudo ajuda, mas nada resolve. Mesmo não parecendo, é preciso ter ciência que a irritação vai acalmar e nenhuma lesão restará – a não ser que seja em quantidade excessiva ou a pessoa tenha alguma alergia ao componente.

A segunda parte da tarde foi a mais intensa. O campo do batalhão foi o “local do conflito”. Os policiais que integram o Choque se apresentaram. O “adestramento da tropa” chamou atenção. Movimentos precisos e formatura exemplar. Não é atoa que a unidade é referência em “tropa adestrada”. A unidade foi responsável por ministrar a formação de polícia de choque para as instituições de outros estados durante a Copa do Mundo de 2014. Os cães do canil do batalhão fizeram uma apresentação especial, demonstração em um circuito com obstáculos, faro e ataque. A destreza e agilidade de policiais e cães arrancaram aplausos.

Em seguida, com os braços entrelaçados um aos outros os jornalistas e fotógrafos formaram uma espécie de círculo. “Lembrem que o que vocês vão sentir é passageiro. Lembrem de respirar com calma e diversas vezes. Não esqueçam de salivar. Não esfreguem os olhos”, orientaram os capitães que estavam ao redor do grupo. Logo, a fumaça começou a ser sentida. Ardência, irritação, lágrimas que teimaram em cair dos olhos e a sensação de: “o que eu estou fazendo aqui?” Em poucos segundos a turma dispersou. Mas ainda teria mais.

Foto: Ricardo Giusti

A oficina de vivência com uma situação real foi a última tarefa do dia. O Choque foi formado. Em frente os escudeiros. Os atiradores e lanceiros, com o comandante, mais atrás. Todos devidamente equipados e já preparados para o que viria. Distante cerca de 20 metros: os manifestantes. Um grupo de pessoas com caixas de frutas, que simulavam artefatos perigosos, preparado para não sair da área. Mesmo com as tentativas de solucionar o conflito sem o uso da força, a situação não amenizou. Com o avanço da tropa de jornalistas e fotógrafos houve o confronto. Gritos de “Choque” ecoavam. Logo, as frutas começaram a serem arremessadas. Cabeças, pernas, braços e tórax atingidos. Quando atirar? Quando parar? O que fazer? E agora? Os questionamentos começaram ainda antes da primeira bomba ser arremessada. Não houve quem saísse ileso da situação.
Era apenas uma simulação. Um treinamento. Um teatro que poderia ser real. Sim, poderia. A tensão mínima que todos sentiram não representa nem 0,001% da sensação em uma situação real. Esse não é o único peso dos militares. Há o desgaste físico: eles usam um colete balístico de cerca de 15 quilos (quando completo), um bornal com outros tantos – para carregar o equipamento necessário –, caneleira, capacete, escudo, armamento e assim vai. 

Quem disse que é fácil ser policial? Quem disse que é fácil integrar o Batalhão de Polícia de Choque? Quem disse, mentiu ou não conhece o que é ser parte do grupo. Porque é difícil, muito difícil. Os profissionais da imprensa, acostumados com a cobertura jornalística dos fatos, sentiram na pele o que é vestir a farda e encarar as adversidades do terreno. 

Toda a comunidade deveria ter a oportunidade de acompanhar o trabalho feito pela Brigada Militar - nem que fosse apenas uma vez - para poder ter a dimensão do significado que há em vestir uma farda e da responsabilidade em agir, quando necessário. No Brasil não há nenhum programa que facilite a imersão do cidadão no mundo militar. Julgar do lado de fora é fácil, assim como publicar imagens e relatos de situações cotidianas sem vivenciá-las na íntegra. É preciso além de entender, vivenciar. Óbvio que há erros. Não há humano que não cometa equívocos. O detalhe é não persistir em situações que não são as ideais.

Das 10 horas de treinamento os aprendizados foram muitos: tomar decisões exige calma, cautela e paciência. Nem todos podem vestir a farda camuflada e ir para a linha de frente. Não é tamanho, é equilíbrio. É ter persistência. Nem sempre o policial parte para o confronto porque quer, mas sim porque é seu dever. Ser do Choque exige mais inteligência do que força. Exige treinamento, competência e dom. 


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