Cães farejadores auxiliam no combate ao tráfico de drogas

Cães farejadores auxiliam no combate ao tráfico de drogas

Normalmente em um ano o animal já está bem treinado e pode começar a atuar

Jessica Hübler

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Dana e Califa, ambos com 9 anos, são dois cães veteranos do Denarc. Eles iniciaram o trabalho de faro na Polícia Civil do Rio Grande do Sul e, recentemente, fizeram a transição do trabalho para a aposentadoria. Os dois permanecerão ao lado dos treinadores que os acompanham desde o início da carreira. André Vizeu, inspetor de Polícia e adestrador, treinou e acompanhou Dana, uma labradora de cor preta, desde o primeiro dia no Denarc, e André Travassos, que foi responsável pelo treinamento e conviveu durante 7 anos com Califa, um pastor malinois. Os dois trabalharam de 2011 a 2017 em operações especiais, buscas, demonstrações e cursos de formação desenvolvidos pela Polícia Civil. Desde o primeiro momento, conforme o diretor de Investigações do Denarc, delegado Mario Souza, foi possível observar que eles fariam parte da “linha de frente”.

Os cães de faro que cooperam nas operações da Polícia Civil geralmente trabalham de 6 a 7 anos, dependendo das condições físicas e também de possíveis problemas de saúde que venham a apresentar. Dana, além de estar no limite do tempo de serviço, também apresentou uma displasia de quadril - que prejudica a estabilidade da articulação coxo-femural -, que é uma preocupação para a raça, justamente pelo porte grande. Como os dois entraram juntos no canil, Califa vai acompanhar Dana neste momento de transição para a aposentadoria.

Em relação ao treinamento dos cães de faro, Vizeu explica que, primeiramente, os animais precisam ser sociáveis e atentos. “Como é preciso trabalhar em ambientes diversos, como matos, veículos e residências, precisamos treiná-los para serem sociáveis”, afirma. Os cães devem ter facilidade para atuar em diversos tipos de situação. Em qualquer ação policial, a responsabilidade da integridade física dos que estão nos locais, é da Polícia Civil. “Quando entramos numa casa, eventualmente nos deparamos com outros animais ou até mesmo crianças. Também somos responsáveis por esses outros seres que habitam os lugares onde fazemos as buscas”, ressalta Travassos.

Desta forma, é preciso fazer o cão entender, durante os treinamentos, que ele precisa estar focado para encontrar entorpecentes. Quando se trata da relação das drogas com os agentes caninos, como são chamados os cães de faro do Denarc, há um tabu antigo e persistente. Muitas pessoas dizem que os cães são viciados. Conforme Travassos, esse é um mito que eles sempre buscam desconstruir. “Não seria nem possível um animal ser viciado, considerando o potencial olfativo dele, que seria o nosso multiplicado por mais de mil. O cão, em contato com as drogas, teria uma vida muito curta. Dependendo do teor da droga, não sei nem se sobreviveria a um único contato”, diz.

Os treinadores condicionam os cães, desde filhotes, a um brinquedo, como uma bola de tênis, por exemplo. O brinquedo com o qual eles estão acostumados, contém o odor de uma ou mais drogas e, através da brincadeira, eles vão entendendo que, quando encontrar aquele entorpecente - que tem o mesmo aroma do brinquedo - ele deve indicar ao treinador onde está. “Quando eles raspam o local, estão pedindo nada mais do que esse brinquedo. Quando eles identificam o odor, fazem automaticamente a ligação com o brinquedo”, enfatiza. Como os cães de faro são tratados como atletas, precisam, permanentemente, de um estímulo positivo para continuar aprimorando os treinamentos. “Mesmo que não haja droga no local de busca, precisamos deixá-lo com o registro de uma fotografia positiva. O cão sempre é o grande vencedor das buscas. Se não há droga, nós simulamos uma situação para que eles retornem felizes ao canil”, diz. Travassos ressalta que, no fim das contas, tudo para eles não passa de uma brincadeira.

O tempo de treinamento varia de cão para cão, depende da resposta de cada um aos estímulos feitos, mas, conforme os adestradores, normalmente em um ano o animal já está bem treinado e pode começar a atuar. A rotina deles inclui treinamentos diários e completos, como se fossem atletas. O ideal é que o cão comece a ser treinado ainda filhote, antes de completar o primeiro ano de vida. “Desta forma, é possível conhecer cada detalhe, cada ponto fraco e forte, cada gesto, cada virada de orelha. Tudo isso faz diferença no momento das buscas”, afirma Travassos.

Em todas as operações, os agentes caninos participam acompanhados de seus treinadores. Tanto Califa quanto Dana são amplamente conhecidos por conta dos trabalhos desenvolvidos na Polícia Civil. Os dois já encontraram droga em ambientes hermeticamente fechados, em partes de veículos soldadas, onde teoricamente o odor do entorpecente não passaria e o olho humano jamais encontraria. Quando a sinalização do cão é direcionada a lugares incomuns, é preciso destacar a intimidade com o treinador. “Muitas vezes a indicação não é tão clara, mas, como conhecemos eles muito bem, qualquer alteração de comportamento nos permite afirmar que aquele ambiente está contaminado”, ressalta Vizeu.

Segundo ele, a intimidade só é possível com anos de convivência e treinamentos intensos. Sobre as principais operações realizadas com o apoio dos cães, Vizeu destaca uma em especial. Segundo ele, foi na época de veraneio, quando a Polícia Civil desenvolve diversas ações no Litoral Norte para coibir a entrada e saída de entorpecentes. Eles estavam na Rodoviária de uma das praias gaúchas e, como de costume, formaram uma fila com passageiros de um ônibus que chegara de Porto Alegre. “Levaríamos muito tempo para inspecionar bagagens e vistoriar cada um dos passageiros. Por isso usamos os cães. A ação é muito mais rápida e eficaz desta forma”, explica Vizeu. Naquela ocasião havia cerca de 40 passageiros e pelo menos 80 malas. Ao formar a fila, Vizeu explica aos passageiros o que estava acontecendo e pede que, se alguém estivesse com droga, que falasse, pois Dana acharia de qualquer forma.

Se o cão encontrar 200 gramas ou 2 toneladas de maconha, ele dará a mesma indicação ao treinador. “Geralmente usuários (de drogas) costumam falar, pois estão com pouca quantidade e sabem que o cão sempre acha. Nesta vez, ninguém havia falado. Dana apontou para uma mulher, apenas ela estava com drogas”, ressalta. Vizeu disse que a mulher não admitiu que estava com a droga e, quando abriu a bagagem, encontrou pequenas porções de maconha. “Eu sabia, naquele momento, que ela tinha, sim, algum entorpecente. A Dana nunca errou.”

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