Três Passos começa a virar a página após júri do Caso Bernardo

Três Passos começa a virar a página após júri do Caso Bernardo

Município, que teve rotina alterada ao longo da semana do julgamento, inicia volta à rotina com sensação de justiça

Henrique Massaro

Julgamento do Caso Bernardo tirou Três Passos de sua rotina habitual

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A manhã seguinte ao julgamento que mobilizou a comunidade de Três Passos foi de contraste aos dias anteriores, quando olhares de todo o país se voltaram para o município no Noroeste gaúcho. A casa em que Bernardo Uglione vivia até ser assassinado, em abril de 2014, quando tinha 11 anos, era a imagem do que uma população que tenta seguir seu curso após ter recebido a justiça que pedia há quase cinco anos. Anteriormente tomada de faixas e cartazes em homenagem à vítima, a fachada do imóvel amanheceu limpa. Os materiais haviam sido retirados ainda na noite anterior, logo após o fim do júri, pela multidão que, agora, quer apenas paz e respeito à memória do menino.

Nas ruas da cidade, o clima que marcou a semana inteira havia se dissipado. O trânsito pouco movimentado de veículos e pedestres, comum no município de menos de 25 mil habitantes, enfim retomava o seu curso após dias atípicos, em que diversos veículos de imprensa circulavam pela região. Próximo ao Fórum, onde ocorreu o julgamento e as condenações, algumas faixas ainda estavam penduradas em homenagem a Bernardo. Em frente ao prédio, no entanto, apenas uma equipe de televisão fazia imagens do espaço. Não havia mais nenhuma multidão reunida.

Do outro lado da rua, uma cafeteria era o reflexo da movimentação atípica em Três Passos nos dias anteriores. O gerente Lucas Dresch disse que o estabelecimento já esperava o aumento da procura e que se preparou para isso, funcionando até além do horário de costume. Pela proximidade do Fórum, o local era um dos principais a receber diversas pessoas envolvidas de alguma forma no júri, como jornalistas, promotores e advogados ao longo dos dias de julgamento. Em função da transmissão de alta repercussão, em alguns momentos a população que passava ficava observando curiosa.

Ao longo do sábado, o café já ia registrando o retorno à normalidade no movimento, assim como o restante do município. Segundo Lucas, o julgamento, assim como o caso inteiro ao longo dos últimos cinco anos, mexeu com a cidade inteira. Jovem, o gerente do estabelecimento, por exemplo, foi colega de catequese de Bernardo. Antes de fazerem a primeira comunhão, os dois costumavam voltar juntos para casa caminhando. “Ele era um guri bem bacana”, afirma, ao dizer que todos gostavam dele, das professoras catequistas aos colegas de escola.

Região acompanhou julgamento de perto

Proprietário de um restaurante a algumas quadras de distância, Eneias Anger afirma que não somente a cidade de Três Passos, mas a região toda parou para acompanhar o julgamento. Enquanto o estabelecimento ficava até de madrugada aberto para atender a demanda de quem saía do Fórum e precisava se alimentar antes de mais um dia de trabalho, a população local se mobilizou para assistir às transmissões. Também dono de uma pizzaria em Santo Augusto, a cerca de 50 quilômetros de distância, Anger não conseguiu abrir o local na quinta-feira, por exemplo, dia em que a maioria das pessoas ficaram em casa vendo o júri popular.

A população local, na visão do comerciante, ficou mais em casa ao longo de toda a semana também devido ao clima de tristeza que há em torno do caso. Ele próprio se emociona ao falar do menino, pela proximidade que sua família tinha com ele – Eneias é sobrinho de Juçara Petry, que era considerada a “mãe afetiva” de Bernardo. “A nossa família adotou ele”, comenta, ao explicar que o garoto estava sempre por perto. Na sua opinião, ainda deve demorar pelo menos um mês para que a rotina da população volta à normalidade. 

Nas ruas e na mobilização da noite final do julgamento, o clima era de que é momento de virada de página após a justiça ser feita. Mas é inegável que o fato não vai cair no esquecimento da população. Na opinião de Eneias, talvez apenas depois de passar a geração de seus filhos o caso possa vir a ser algo esquecido no passado do município, que tem o crime como um dos fatos mais marcantes em seus 74 anos de emancipação. “Marcou a história de uma maneira negativa. Três Passos ficou conhecida em nível mundial por causa de uma desgraça dessas.”


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