Após encontro com Mandetta, Bolsonaro recebe Osmar Terra

Após encontro com Mandetta, Bolsonaro recebe Osmar Terra

Presidente também defendeu uso da cloroquina no tratamento de pacientes com Covid-19

Estadão Conteúdo

Após reunião que durou duas horas, ministro da Saúde deixou Planalto sem falar com a imprensa

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Pouco antes de se reunir com o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, o presidente Jair Bolsonaro voltou a defender, nas redes sociais, o uso da cloroquina no tratamento de pacientes com Covid-19. O uso do medicamento é um dos motivos de embate entre ministro e presidente, que se reúnem na manhã desta quarta-feira, no Palácio do Planalto. O tema do encontro não foi divulgado. As informações são do jornal O Estado de São Paulo.

Bolsonaro e Mandetta discordam sobre a melhor estratégia para enfrentar a crise. O embate deu protagonismo ao ministro, que ganhou mais autoridade para falar sobre a pandemia do que o próprio chefe.

Além da cloroquina, o desentendimento também envolve a questão do isolamento social. Enquanto o presidente defende flexibilizar medidas como fechamento de escolas e do comércio, Mandetta tem mantido a orientação da pasta para as pessoas ficarem em casa, seguindo o que dizem especialistas e a Organização Mundial de Saúde (OMS).

O encontro entre Bolsonaro e Mandetta durou pouco mais de duas horas, duração muito além da previsão de meia hora que constava na agenda oficial do presidente. O ministro da Saúde saiu pela garagem do Planalto, evitando a imprensa.

Antes das rusgas com o presidente, o costume de Mandetta era chegar e sair a pé do Planalto. No trajeto até o Ministério, ele costumava responder perguntas de jornalistas que o acompanhavam. Hoje ao chegar no Ministério, também não fez declarações.

Cerca de 40min após a saída do ministro, o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) chegou ao Palácio do Planalto. O nome de Osmar Terra não consta na agenda pública de Bolsonaro desta quarta-feira.

Cotado como sucessor do ministério da Saúde em caso de demissão de Mandetta, Terra negou ter sido convidado pelo presidente para substituir o atual ministro no cargo durante uma entrevista ao Estado nesta terça-feira.

Em relação à cloroquina, Bolsonaro é um entusiasta do medicamento indicado para tratar a malária e doenças autoimunes, mas que tem apresentado resultados promissores contra o coronavírus.

O ministro, por sua vez, tem pedido cautela na prescrição do remédio, uma vez que ainda não há pesquisas conclusivas que comprovem sua eficácia contra o vírus. “Há 40 dias venho falando do uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19. Sempre busquei tratar da vida das pessoas em 1° lugar, mas também se preocupando em preservar empregos”, disse.

Bolsonaro disse ter feito contato com “dezenas de médicos” e alguns chefes de Estados de outros países para falar sobre os medicamentos. “Cada vez mais o uso da cloroquina se apresenta como algo eficaz”, disse.

Na publicação, o presidente também citou que dois médicos brasileiros "se negam" a divulgar se utilizaram os dois remédios em seus tratamentos contra o novo coronavírus. Bolsonaro faz referência ao coordenador do Centro de Contenção para o novo coronavírus no Estado de São Paulo, David Uip. Nas redes sociais, o presidente tem pressionado Uip, que testou positivo para a Covid-19, a revelar se utilizou ou não cloroquina e a hidroxicloroquina.

“Dois renomados médicos no Brasil se recusaram a divulgar o que os curou da Covid-19. Seriam questões políticas, já que um pertence a equipe do governador de SP?”, questionou. “Acredito que eles falem brevemente, pois esse segredo não combina com o Juramento de Hipócrates que fizeram. Que Deus ilumine esses dois profissionais, de modo que revelem para o mundo que existe um promissor remédio no Brasil.”

Na terça-feira, David Uip já havia falado sobre o assunto. “Eu não me prescrevi, eu não me receitei, eu fui cuidado por médicos da minha confiança”, disse o infectologista. “É algo absolutamente pessoal e, como eu respeito os meus pacientes, eu gostaria de ser respeitado em algo que é muito pessoal e muito particular. Não faço isso para esconder nada, mas não quero transformar o meu caso em modelo para coisa alguma."

Nesta terça-feira, em coletiva de imprensa, Mandetta afirmou que o Ministério da Saúde acompanha estudos clínicos sobre a eficácia de medicamentos contra o novo coronavírus, entre eles, a cloroquina e a hidroxicloroquina. Os primeiros resultados devem ser conhecidos a partir do dia 20.

No Brasil, a droga já está disponível nos hospitais para pacientes com quadros moderados e graves. Fora desse grupo, o ministério não recomenda a utilização. "Já liberamos cloroquina e hidroxicloroquina tanto para os pacientes críticos, aqueles que ficam em CTIs, quanto para qualquer paciente em hospital, o moderado. O medicamento já é entregue, já tem protocolo”, disse o ministro.

Na segunda-feira, Mandetta afirmou ter sido pressionado por dois médicos a editar um protocolo para administração dos medicamentos, após reunião com Bolsonaro. Ele se recusou alegando ausência de embasamento científico.

Ministro sob risco de demissão

A recusa do ministro de contrariar recomendações de organizações de saúde para atender o que prega o presidente levou a um estremecimento na relação e a rumores de que ele seria demitido. Em entrevista na segunda-feira, Mandetta admitiu que seus auxiliares na pasta chegaram a limpar suas gavetas.Na ocasião, em um pronunciamento à imprensa, ele pediu "paz" para trabalhar e reclamou de críticas que, em sua visão, criam dificuldades para o seu trabalho.

Na semana passada, Bolsonaro chegou a dizer que Mandetta "extrapolou" e faltava "humildade" ao chefe da pasta da Saúde. E destacou que não o demitiria no "meio da guerra", apesar de ninguém em seu governo ser "indemissível".

A avaliação do presidente, porém, é de que seu ministro adotou uma postura arrogante diante da crise e deveria ouvi-lo mais. “Algumas pessoas do meu governo, algo subiu à cabeça deles. Estão se achando demais. Eram pessoas normais, mas, de repente, viraram estrelas", afirmou o presidente no domingo, ao receber apoiadores no Palácio da Alvorada.

Era uma indireta por Mandetta ter participado de uma “live” da dupla sertaneja Jorge e Mateus, quando voltou a defender o isolamento social, um dos pontos de divergência com o chefe do Executivo.

Durante entrevista na segunda-feira, Mandetta afirmou que não deixaria o cargo por vontade própria, destacando que um "médico não abandona o seu paciente". Disse ainda que, caso seja demitido, toda a sua equipe, que está na linha de frente do combate ao coronavírus no País, deve sair junto.

Militares do governo ajudaram a serenar os ânimos e intercederam junto a Bolsonaro para que ele não demitisse o ministro neste momento. O grupo de generais que trabalha no Palácio do Planalto insiste que essa é uma guerra que não é boa para ninguém. E alertam para falta de opção.

O ex-ministro Osmar Terra, um dos aliados que mais tiveram acesso a Bolsonaro nos últimos dias e passou a ser cotado para a vaga na Saúde, foi demitido do Ministério da Cidadania porque não dava resultado.

Desde a situação envolvendo a saída de Mandetta, Bolsonaro tem mantido o silêncio e evitado a imprensa. Ontem chegou a faltar dois compromissos previstos em sua agenda.


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