Após vazamentos, juristas analisam como grave a postura de Moro

Após vazamentos, juristas analisam como grave a postura de Moro

Constitucionalistas também entendem que provas do processo contra Lula e outros réus tendem a ser anuladas

Samantha Klein

Ministro da Justiça Sérgio Moro teria conduzido atos do procurador Deltan Dallagnol.

publicidade

Após a divulgação de uma série de reportagens do site The Intercept Brasil mostrando a troca de mensagens atribuídas ao ex-juiz federal Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, do Ministério Público Federal, neste domingo, juristas analisam como grave a postura do então julgador dos casos referente à Operação Lava Jato.

Eduardo Carrion, professor titular de Direito Constitucional da UFRGS e da Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP), diz que a conduta de Moro inviabiliza sua permanência no Ministério da Justiça e Segurança Pública. "Não tem mais legitimidade para permanecer no ministério, onde tivemos ilustres ministros no passado", ressalta. "A postura dele revela, entre outras coisas, a falta de compromisso republicano de membros com nossas instituições", complementa.

"Tecnicamente o processo contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva poderá ser anulado", considera o professor de Direito Penal Sérgio Salomão Schecaira. O docente da Universidade de São Paulo (USP) lembra o caso da Operação Satiagraha, conduzida pelo então delegado e ex-deputado federal Prótogenes Queiroz, que foi totalmente anulada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Na época, a Corte aplicou a tese dos frutos da árvore envenenada: se a árvore está podre, os frutos que ela dá, por consequência, também estão, ressalta o professor Schecaira. "O juízo parcial é muitíssimo mais grave do que ilegalidade na coleta de provas. O delegado tem interesse em mostrar alguma coisa e o Ministério Público também, agora, o juiz não tem que querer demonstrar nada". 

Moro, conforme o docente da USP, dificilmente assumirá vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). "Se como juiz de primeira instância produziu tamanho estrago, imagine como ministro do STF. Não deverá obter a vaga", conclui. Em novembro do próximo ano, a aposentadoria do decano Celso de Mello abrirá a primeira vaga para nomeação de ministro a ser realizada pelo presidente Jair Bolsonaro. 

Combinando as regras do jogo 

Professor de Direito Constitucional da Unisinos, o jurista Lênio Streck disse que esse é um dos fatos mais graves desde a promulgação da Constituição de 1988. Ele complementa o entendimento do professor Sérgio Salomão. "Não adianta dizer que o vazamento foi ação de hackers ou ação de algum X9. Tudo isso é irrelevante. E mesmo que nenhum dos procuradores sofra qualquer sanção ou pena, e parece que ninguém está negando o conteúdo dos arquivos do Telegram; no Direito, você não pode ser condenado por provas ilícitas, você pode ser absolvido por provas ilícitas", ressaltou em entrevista ao programa Direto ao Ponto da Rádio Guaíba, na manhã desta segunda-feira (10). 

Conforme Streck, existem elementos para que a defesa de Lula peça a anulação do julgamento do caso referente ao triplex do Guarujá. A tese de suspeição do ex-juiz Sérgio Moro será utilizada pelos advogados do ex-presidente. "Pelo menos até aqui os diálogos mostram que a defesa tinha razão. Sem entrar no mérito da condenação do petista, ninguém pode ser condenado se as autoridades são suspeitas de estarem combinando as regras do jogo", disse.

A revelação da troca de mensagens e a indicação de que Sérgio Moro conduzia a conduta dos procuradores da força-tarefa da Lava Jato no Ministério Público Federal no Paraná poderão resultar em uma enxurrada de recursos a penas aplicadas no âmbito da operação. "A conduta ajuda a vitimizar os réus e condenados da Lava Jato, entre os quais o ex-presidente Lula. Essa atuação, no meu entender, é anti-republicana, atingindo e desqualificando a própria Operação Lava Jato", considera Carrion.

A defesa do ex-presidente Lula disse, em nota, que a troca de mensagens confirmam tese que já vinha sendo denunciada pelos advogados. No texto, os advogados de Lula também destacam urgência em reconhecer que o ex-presidente não praticou qualquer crime e que é "vítima de manipulação das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política". Segundo a defesa, as matérias do portal The Intercept revelam "detalhes de uma trama na Lava Jato, entre os procuradores e o ex-juiz Sergio Moro", com o "objetivo pré-estabelecido e clara motivação política, de condenar o petista". 

Lula está preso na sede da superintendência da Polícia Federal em Curitiba desde 7 de abril de 2018 por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá (SP). Os advogados do ex-presidente apresentaram recursos contra a sentença da Quinta Turma do STJ, que reduziu a pena do petista em abril, pedindo a eventual progressão de Lula para o regime aberto.

Posicionamento do MPF e Moro 

O Ministério Público Federal do Paraná (MPF-PR) publicou nota oficial sobre o caso. Segundo o comunicado, seus membros foram “vítimas de ação criminosa de um hacker que praticou os mais graves ataques à atividade do Ministério Público, à vida privada e à segurança de seus integrantes”.

Também por meio de nota, Sérgio Moro disse que “lamenta-se a falta de indicação de fonte de pessoa responsável pela invasão criminosa de celulares de procuradores”. Em uma das reportagens sobre o caso, o site afirma que as conversas foram enviadas ao veículo por uma fonte que é mantida sob anonimato. Conforme o The Intercept Brasil, as mensagens foram obtidas semanas antes da notícia da invasão do celular do ministro da Justiça.


Mais Lidas

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895