Bolsonaro abandona ideia de "pacto dos poderes" sem conseguir acordos com Congresso

Bolsonaro abandona ideia de "pacto dos poderes" sem conseguir acordos com Congresso

Presidente pregou necessidade de "pacto de ideias" para aprovar reformas e evitar "populismo"

Estadão Conteúdo

Agenda de Maia "pós-Previdência" preocupa o Executivo

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Sem conseguir fechar acordo com o Congresso e após sofrer uma série de derrotas, o presidente Jair Bolsonaro decidiu enterrar de uma vez por todas o "Pacto pelo Brasil". Trinta e seis dias após a reunião entre Bolsonaro e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, o protocolo de intenções que sugeria a união entre os Poderes para o surgimento de "um novo tempo" nunca chegou a sair do papel e acabou escancarando divergências.

Ao participar nesta quarta-feira, em São Paulo, da cerimônia do Exército que marcou a troca de chefia no Comando Militar do Sudeste, Bolsonaro afirmou que "a política mudou" e deu novas estocadas na direção do Congresso. "Nós não precisamos de pacto assinado no papel. O pacto que nós precisamos, com o Poder Legislativo e com o Poder Executivo, é o nosso exemplo de votarmos matérias, de apresentarmos proposições que fujam do populismo", comentou ele.

Logo em seguida, dirigindo-se ao general Luiz Eduardo Ramos - que assumirá hoje a Secretaria de Governo no lugar de Carlos Alberto dos Santos Cruz -, Bolsonaro afirmou que o passado do militar será útil na articulação do Palácio do Planalto com o Congresso. "Ajudaremos, e muito, a resgatar a credibilidade de nossas instituições", argumentou o presidente.

O "Pacto pelo Brasil" foi proposto a Bolsonaro por Toffoli, ainda em fevereiro. Em 28 de maio, quarenta e oito horas depois das manifestações de rua que defenderam o governo e alvejaram o Congresso e o Supremo, uma reunião dos chefes dos Poderes, no Palácio da Alvorada, terminou com o esboço de documento que destacava cinco pontos prioritários para o Brasil sair da crise. Na lista constavam a reforma da Previdência, a "modernização" tributária, a desburocratização das rotinas administrativas, a repactuação federativa e o combate ao crime - "nas ruas e nos gabinetes" - à corrupção e aos privilégios.

O texto, porém, foi rechaçado tanto na Câmara como no Senado. Para começar, integrantes do Centrão entenderam o trecho do documento que falava em crime de "gabinetes" como uma provocação de Bolsonaro à chamada "velha política", por causa das investigações da Lava Jato. Parlamentares chegaram a dizer, ainda, que a iniciativa representaria um "cheque em branco" para Bolsonaro. Na outra ponta, magistrados observaram que a medida feria a independência do Judiciário. "Pactos com agendas que caminham para o debate ideológico têm dificuldade de passar", disse Maia, para quem o documento acabou rotulado como "pauta do governo". Toffoli, no entanto, foi em linha oposta. "Eu penso que um pacto pelo desenvolvimento econômico e social do Brasil é um dever de todos os Poderes", afirmou o presidente do Supremo. "Ainda acredito na necessidade da harmonia e da ação conjunta nesse sentido."

Derrotas

Desde que a proposta de pacto foi discutida, o governo sofreu uma série de reveses no Congresso e até mesmo no STF. Bolsonaro ficou contrariado, por exemplo, quando o Senado derrubou os decretos que flexibilizavam o porte e a posse de armas, obrigando-o a mudar de estratégia. Além disso, a decisão do ministro Luís Roberto Barroso de suspender a Medida Provisória que transferia a demarcação de terras da Fundação Nacional do Índio (Funai) para o Ministério da Agricultura também representou uma derrota para o governo.

A retirada do sistema de capitalização da proposta de reforma da Previdência foi vista no Planalto como outra tentativa de enquadrar Bolsonaro. O presidente declarou, recentemente, que o Congresso quer transformá-lo em uma "rainha da Inglaterra", que reina, mas não governa. E nesta quarta falou na necessidade de proposições que "fujam do populismo".

A afirmação causou mais um ruído num momento em que Bolsonaro precisa de apoio para aprovar mudanças no sistema de aposentadoria. Nos bastidores, o presidente critica a intenção do Congresso de montar uma agenda própria, pós-Previdência. Maia tem feito reuniões periódicas com a diretoria do Banco Central e quer emplacar projetos populares, como o que reduz a taxa de juros do cheque especial. Não sem motivo: um estudo do BC apresentado a ele mostrou que famílias com salários de dois a três salários mínimos entram com frequência no vermelho.

Nos bastidores, auxiliares de Bolsonaro avaliam que Maia quer concorrer à Presidência, em 2022, e tem um plano de ação no Congresso que poderá ser embalado como plataforma eleitoral.


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