Eduardo Leite: "Me sinto preparado para me apresentar em 2026"

Eduardo Leite: "Me sinto preparado para me apresentar em 2026"

Governador comenta desafios pela frente e ambição de ser candidato à Presidência

Mauren Xavier

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No próximo 1º primeiro de janeiro, Eduardo Leite (PSDB) assumirá pela segunda vez o comando do Palácio Piratini. No cargo,  terá pela frente diversos desafios, que passam pelas relações políticas, a economia e as projeções políticas para 2026. Em entrevista exclusiva ao Correio do Povo, Leite  projetou os próximos desafios, falou sobre o Banrisul, a presidência do PSDB e o governo Lula.

A seguir, os principais trechos:

CP: O senhor tem falado muito sobre performance do governo nessa segunda gestão, qual é o maior desafio ao reassumir o Palácio Piratini?

Quando digo que temos que ter foco na performance e no desempenho não significa que a questão fiscal esteja totalmente superada. Ela é um desafio constante. Até porque décadas de problemas fiscais do Rio Grande do Sul não serão resolvidos em quatro anos. É um esforço que exige uma continuidade. A gente conseguiu vencer a parte mais crítica desse desajuste fiscal, mas a gente ainda tem uma situação que inspira cuidados. E ocorre dentro de uma circunstância econômica. O Rio Grande do Sul não é uma ilha e nós estamos submetidos aos impactos da situação econômica do Brasil e do mundo, que vive ainda incertezas no seu cenário econômico.

CP: Dentro dessa cautela com o equilíbrio fiscal, a Assembleia aprovou projetos, entre eles o que eleva o salário de funções gratificadas e cargos em comissão, além do seu, do seu vice e dos secretários. Como o senhor avalia esse impacto? 

A folha de pagamentos do Estado gira ao redor de R$ 30 bilhões no ano, o impacto dessas aprovações é de algo em torno de R$ 100 a R$ 120 milhões para o Estado. Estamos falando de um impacto bastante reduzido no custo da folha de pagamento. Eu vejo muitas comparações feitas que não são adequadas. Não dá para comparar a revisão salarial feita simplesmente neste ano para servidores com o que vai haver de incremento em determinadas posições, seja dos secretários ou do próprio governador ou de outras áreas em que não houve revisão. A questão objetiva é que estamos tentando puxar e acertar a remuneração de posições de chefia estratégicas de liderança ao que a gente observa no mercado de trabalho. Para que possamos recrutar pessoas capacitadas porque o governo vai ter exigências ainda mais rigorosas no preenchimento de determinadas funções estratégicas.

CP: Melhorar o desempenho?

Sim, por exemplo quem vai ser coordenador regional de educação e que ganhava R$ 4,5 mil, passará a ser em torno de R$ 10 mil, em vista da responsabilidade que tem sobre um conjunto de escolas. Um professor trabalha no Estado tem um salário de R$ 4,2 mil de entrada. Ah, o coordenador Regional assume uma obrigação pela qual ele responde e deve ter uma remuneração que justifique. É um esforço para melhoria de desempenho e performance. É claro que temos ainda uma situação fiscal que inspira cuidado, mas o Estado tem a o cuidado com a área fiscal como meio para atingir um objetivo. Não é um fim.

A finalidade do Estado é o de melhorar a vida das pessoas e para isso preciso de uma estrutura qualificada, que é composta pelas posições de chefia de lideranças. E outras carreiras que vamos também endereçar ações nos primeiros meses do governo, na questão da revisão de estrutura remuneratória. Estas posições (FGs e CCS) foram olhadas agora porque a virada de um governo para o outro é quando a gente vai começar a preencher essas posições. É a janela de oportunidade política. O próximo passo é a análise de estruturas de carreiras que são críticas para o desempenho. As carreiras transversais, de engenheiros, de analistas de planejamento e orçamento e gestão, analistas de políticas públicas. 

CP: Que são cargos difíceis de manter? 

Porque a gente disputa, inclusive com outros poderes e prefeituras. Por exemplo, a Prefeitura de Porto Alegre, que tem uma remuneração eventualmente melhor que a do Governo do Estado, e para outros poderes, como Judiciário ou Assembleia Legislativa. Então, se o Executivo não tiver uma remuneração adequada, a gente faz uma contratação e esses profissionais ficam pouco tempo e em seguida saem. Então a gente vai ter que olhar especialmente para essas que são carreiras transversais que tanto desempenham a sua função no Executivo quanto em outras posições de outros lugares para que a gente consiga ter uma melhor retenção desses profissionais. 

CP: Voltando à questão fiscal, como estão as negociações para a compensação das perdas com a arrecadação, no caso do ICMS?

O movimento que foi feito neste ano, de redução forçada das alíquotas por um movimento do congresso nacional e com liderança do governo federal, foi claramente um movimento de cunho eleitoreiro. Houve uma redução e passado o período de dois três meses, os preços voltam. O imposto não é o vilão da história. Todo mundo quer pagar menos impostos. Eu também quero. Mas há um custo de manutenção das atividades públicas. Agora, existe uma previsão legal de compensação pelo governo federal. Agora com o novo governo eleito apresentar os caminhos da compensação devida aos Estados. E o Rio Grande do Sul exigirá. Esta compensação pode chegar a um valor suficiente para que o Estado fique um período substancial sem pagar a dívida com a União. Aí vai ter que discutir o formato de abatimento de despesa ou receita transferida para o Estado? Entendemos que é mais interessante a transferência de receita  do que abatimento. 

CP: Por quê? 

A nossa receita diminuiu fortemente por conta do impacto da redução das alíquotas. Vamos tirar a despesa com a dívida, mas todas as outras despesas que são controladas e limitadas pela lei de responsabilidade fiscal de pessoal não diminuíram, ela se mantém. Ou seja, a despesa de pessoal sobre a receita vai aumentar proporcionalmente, isso pode fazer com que o Estado venha a entrar no limite prudencial, que gera uma série de efeitos, como de não chamamentos, de não aumento de despesas com pessoal, que acabam afetando os servidores.

CP: Nessa semana tivemos a operação da Corsan, e como fica a situação do Banrisul? 

Nesta eleição eu fiz o compromisso de não encaminhar a privatização do Banrisul. Embora, acho que seja um tema que merecesse discussão. Ou seja, não privatizar o banco. Mas por que merecia uma discussão? Porque você tem uma alteração de cenário econômico do setor bancário, no sistema financeiro e novas tecnologias. As razões pelas quais o Estado criou um banco há mais de 90 anos atrás eram outras 

Os tempos mudam e exigem novas posturas e um novo entendimento do governo e da sociedade sobre determinados assuntos. Mas compreendemos que a política é uma arte de ampliar os limites do possível. E neste processo eleitoral ficou claro que, para evitar retrocessos em áreas nas quais nós estávamos avançando, como a própria privatização da Corsan e as reformas que tinham sido feitas, era importante fazer gestos a outros grupos que tenha outro entendimento e entre eles sobre o Banrisul. Eu assumi esse compromisso e vamos mantê-lo público.

CP: E como foi o movimento da Corsan? 

Nós entendemos que foi acertado dado que há uma lei federal estabelecendo no Marco Regulatório do Saneamento algo que é razoável, que o Brasil avança até 2033 a mais de 90% de coleta de tratamento de esgotos. Recentemente, alguém me indagou justamente sobre a existência de rumores que o novo governo pode mudar e ampliar este prazo. Bom, então para manter as empresas públicas, vamos manter a população, especialmente mais vulnerável, exposta ao esgoto aberto? É no mínimo polêmico. Ou seja, em nome de manter, em um ponto de vista ideológico, as empresas públicas, a gente mantém a população sem saneamento. Porque no modelo de empresas públicas a maior parte das empresas foi incapaz de viabilizar os investimentos, com honrosas exceções, substanciais em esgotamento sanitário.

No caso da Corsan, ela tem hoje 20% de coleta e tratamento de esgotos nas áreas onde atua, dos quais 10% foram feitos nos últimos oito anos e desses 10%, seis a sete no nosso governo. Na verdade, então um um processo se revelou ao longo de 60 anos, praticamente, pouco capaz de avançar nesse investimento sanitário a gente entende que a privatização vai viabilizar a ajudar esses investimentos.

CP: Os embates jurídicos impactaram na negociação? 

Eventualmente. É difícil tudo que impactou sobre a participação (no valor da operação) porque se eu não me engano, oito ou dez empresas participaram do espaço que é aberto pro governo. Sabia e tinha conhecimento de que outras empresas tinham até contratado os bancos para fazer a estruturação da proposta que apresentariam e acabaram optando por não apresentá-la. O que eu ouço é que alguns temas influenciaram a decisão. Nós estamos nesse momento econômico em há subida de aumento de juros, o governo eleito no nível federal, que ainda não tem a sua agenda muito clara e que também gera dúvidas e incertezas. E a gente tem o próprio modelo da Corsan que é diferente. Assim, quem compra compra com todos os riscos inerentes à companhia leva os riscos. Então, nós vendemos pelo preço que foi analisado como o preço da companhia e o Estado não ganha apenas o recurso da venda. Acho que o grande benefício na venda da Corsan está em um conjunto de obrigações que o comprador compra junto que é de investir nos próximos 10 anos cerca de R$13 bilhões.

CP: O senhor ainda está formando o seu secretariado. Quais as diferenças na comparação com o primeiro? 

A minha tarefa aqui é trabalhar para que a gente tenha (o secretariado) até o dia primeiro. Se não houver essa possibilidade, a maior parte do secretariado estará composto. Eu sempre digo que a gente tem que conciliar técnico e político. Não existe uma coisa alternativa a outra. É importante que a gente olhe para os partidos políticos que compõem a nossa base. Eles são o primeiro banco de Recursos Humanos. Neles estão pessoas que, por estarem filiadas e participando da vida política, já dão demonstração de interesse de querer participar. Mas não se esgota ali a análise do governo. A gente olha também para o que a gente está precisando em cada frente e busca na sociedade.

Do ponto de vista da formação do time, vai respeitar as minhas convicções e dentro do contexto político que a gente vive, assim como a população me elegeu governador, elegeu uma Assembleia Legislativa com 55 deputados e 15 partidos políticos. De certa forma a Assembleia reflete o pensamento político da sociedade e eu preciso buscar afinar. O nosso sistema político eleitoral brasileiro é assim. A gente está se esforçando para fazer convergências. 

CP: O senhor teve uma ampla base no primeiro governo. Pós-eleição, trabalhou para ampliá-la. Foi importante a adesão do PP, que terá uma bancada com sete deputados para formar esse apoio neste segundo governo?

Em 2018 eu enfrentei o MDB no segundo turno. Agora inverteu. O PP fez a sua escolha  no segundo turno e legítima. E nós conseguimos o apoio. Sempre disse que após três anos e meio de convergência, no esforço de colocar o Rio Grande do Sul aí em condições, não vão se apagar por conta de algumas semanas de divergência e enfrentamento. É muito maior o que a gente tem de convergência. E política é isso, não dá para querer reunir só quem pensa igual. Como disse, a sociedade me escolheu governador, e sete deputados dos progressistas escolheu seis deputados do MDB. Então, vamos dialogar com as bancadas formadas e ter sempre uma relação muito respeitosa com os partidos de oposição. Ali está representada parcela da população gaúcha e, embora tenhamos visões distintas ideologicamente, eles têm toda a legitimidade.

CP: O senhor assume em fevereiro a presidência nacional do PSDB, como será o desafio de recuperar o partido, que perdeu muito espaço na política? 

O caminho para quem está no centro, quem busca o caminho da moderação, da ponderação, da sensatez ,da razoabilidade e do equilíbrio ficou muito estreito nesse processo eleitoral. A polarização entre Lula e Bolsonaro fez com que muitos eleitores simplesmente não quisessem saber dos candidatos qual a sua ideia para economia, para as obras, para os investimentos, posição sobre assuntos polêmicos sejam eles quais fossem. O interesse da sociedade foi reduzido a estar com Lula ou com Bolsonaro. O caminho ficou estreito e acabou gerando o impacto. Partidos que têm agenda, como o PSDB, embora com as suas dificuldades e fragilidades ao longo dos anos, estão nesse campo. Bom, o resultado é este. Estamos com uma bancada bastante reduzida.

O meu esforço será em buscar, mais do que o próprio PSDB, tentar ajudar o Centro a se reposicionar, fazer a sua discussão, a sua autocrítica do PSDB junto com Cidadania e com outros partidos que se disponham a conversar e dialogar conosco. Como disse o Fernando Henrique, o centro tem que polarizar. É uma frase que parece não fazer sentido. O centro está aí, tem que ter sabor, não pode ser insípido, tem que ter posição, ter clareza das suas ideias, ter bandeiras visíveis. Então, é uma discussão de fundo programático na minha visão. Então, o desafio é como atingir e mobilizar a sociedade para nesse esforço conseguir fazer que uma eleição de 2026 não seja uma repetição da polarização vista em 2022. 

CP: O senhor já afirmou que irá concluir o segundo mandato. Mas caso o seu nome apareça como viável para a disputa presidencial, o senhor pode rever essa decisão? 

Quando a gente está dentro da política a gente não se pertence. Na verdade, se eu fosse pensar unicamente assim talvez não tivesse concorrido à reeleição. Mas fui mesmo contrariando um posicionamento inicial porque entendi que o projeto que nós representamos para o Estado estava sob ameaça diante da polarização. Então, estou muito feliz de ser governador do Estado do Rio Grande do Sul por mais um mandato, porque estou muito entusiasmado com o que serei capaz de fazer. Daqui a três anos e meio nós vamos ver as circunstâncias e contexto.

A política é muito dinâmica. Simplesmente as pessoas me dizem: 'mas tu vai ser um dia presidente'. Mas tenho tranquilidade que não é assim. Tantas pessoas se prepararam para ser presidente e não foram, tantos outros não se prepararam e acabaram sendo por conta das circunstâncias. Tancredo dizia que a Presidência é o destino. E tem outro ditado que diz que sorte é quando preparo encontra oportunidade. Eu me sinto tanto nesse momento preparado, como no passado me senti preparado para me apresentar. Imagino que estarei preparado.

A oportunidade acontecerá? Não sei. Quais serão os meus erros de acertos de Lula, quais terão sido os meus erros e os meus acertos? Qual será, portanto, o cenário econômico? Qual será o humor do eleitor? Estará querendo uma mulher, um jovem, um sênior, a repetição do modelo atual. Tantas variáveis existem. Uma candidatura a presidente não é simplesmente uma aspiração pessoal. Ela é um momento, uma circunstância política.

CP: Para finalizar, o que o senhor espera do próximo governo Lula? 

Desejo o melhor. O que seja, um desejo pessoal, antes de tudo um momento de fortalecimento das instituições, de fortalecimento da nossa democracia. Acredito que há espaço para isso,  e que há disposição para isso.  Tem uma expectativa de que temas da área social sejam olhados com especial atenção, acredito na sinceridade e na honestidade de propósito do presidente de movimentar-se nessa direção. No entanto, temos visão do ponto de vista ideológico e programático de como chegar a esses objetivos bastante distintos. Especialmente na questão da gestão econômica e fiscal do governo. Aí já é expressa um cenário de incertezas, de preocupações, de riscos, que acabam afastando os investidores. Vamos dar tempo a ele.

A gente passou por um momento estressante da nossa vida democrática. Recentemente ainda estamos passando, com grupos contestando as eleições, na minha visão de uma forma absolutamente equivocada. Evidentemente que qualquer ruptura ou tentativa de ruptura com contestações são muito piores para o Brasil do que qualquer coisa que o governo eleito possa fazer. Porque o governo eleito tem uma legitimidade escolhida pela população e isso tem que ser respeitado, vamos dar tempo a ele. E observados movimentos errados e claro se houver movimentos incompatíveis com a democracia, com a legalidade, com  transparência e com a lisura, que devem estar nos atos de governo, bom aí, ele sofre as consequências, mas acho que a gente tem que dar tempo e espaço para que esse governo.

O que se apresentou até aqui, infelizmente, não dá em termos de composição de ministérios de discursos no presidente eleito e infelizmente ainda não dá perspectivas efetivamente positivas porque ainda mantém questionamentos sobre efetivamente o será feito. Não é bom para o país, que precisa crescer e se desenvolver, e a previsibilidade é determinante. 


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