Conheça os bastidores da briga pela vaga no segundo turno em Porto Alegre

Conheça os bastidores da briga pela vaga no segundo turno em Porto Alegre

Pesquisas diárias, denúncias e informações internas de campanhas adversárias integram estratégia dos candidatos

Flavia Bemfica

As candidaturas de Nelson Marchezan Jr., Sebastião Melo e José Fortunati lideram a disputa por uma vaga no segundo turno em Porto Alegre.

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A última semana da campanha eleitoral começa tensa e cheia de expectativas em Porto Alegre, onde tanto pesquisas públicas como internas apontam para uma disputa ‘palmo a palmo’ por uma das vagas no segundo turno. Os diferentes levantamentos mostram a candidata Manuela D’Ávila (PCdoB) à frente, sempre com mais de 10 pontos de vantagem. Por isso, em praticamente todas as campanhas adversárias, o entendimento é o de que dificilmente ela ficará de fora da segunda etapa da eleição. Já o embate pela segunda vaga indica que a reta final da campanha terá uma sucessão de lances ao estilo ‘sangue no olho’. As candidaturas de Nelson Marchezan Júnior (PSDB), Sebastião Melo (MDB) e José Fortunati (PTB), que, a partir do início oficial da corrida, se intercalaram no segundo lugar nas pesquisas, admitem que, em função da evolução dos números, quem conquistar a segunda vaga muito provavelmente o fará com uma vantagem mínima em relação ao terceiro colocado.

Eles estão realizando trackings (as chamadas pesquisas qualitativas) diários, para medir as variações de humor do eleitorado. E, neste ano, o eleitorado em Porto Alegre tem se mostrado especialmente volúvel. Em qualitativas de diferentes campanhas começou, por exemplo, externando uma rejeição considerável à Marchezan, que busca a reeleição. Mas, depois, essa rejeição arrefeceu. De forma concomitante, o tucano mostrou reação nas pesquisas. E, hoje, não está claro sobre se pode voltar a aumentar. Além da escala do dia, as qualitativas medem variações a cada bloco, por exemplo, a cada quatro sondagens, de forma a captar tendências. E identificam preferências de diferentes parcelas, divididas conforme as solicitações dos contratantes: por faixa salarial, escolaridade, região geográfica, idade...

Nesta última semana, a partir do que foi identificado, é visível a preocupação dos três candidatos em concentrar esforços na periferia. Por pelo menos três motivos. Porque todos admitem que a ‘cobertura’ feita por Manuela tem mostrado uma extensão não só homogênea como de bastante visibilidade. Porque os embates sucessivos entre Marchezan e o antigo aliado PTB na prefeitura acabaram respingando na força que os trabalhistas detinham em diferentes comunidades, abrindo espaço para novas alternativas. E porque, na esteira do segundo fator, e com uma estratégia tão antiga quanto eficiente, de contato direto casa a casa e com lideranças, o PSol vem conseguindo ano a ano entrar tanto em redutos que já foram do PTB como em outros, do PT.

Na noite de domingo, Melo reuniu todos os candidatos a vereador e suas coordenações, para “dividir tarefas”. “Vamos dividir a cidade territorialmente com os vereadores. Vou passar a semana em cima de um caminhão. O Ricardo (Gomes, candidato a vice) vai atuar mais junto ao eleitorado das classes média e média alta (o eixo Encol/Parcão). E eu vou para as vilas. Existem temas específicos destes eleitores e eu conheço bem as regiões e seus problemas”, afirma o emedebista.

Segundo Fábio Bernardi, estrategista de campanha de Marchezan, na disputa acirrada pelas periferias, a estratégia do tucano foca em mostrar realizações. “O pessoal que usa os serviços sabe, e por isso é difícil tirar votos de quem já está com o Marchezan. Como ele é prefeito em meio a uma pandemia e tem responsabilidade, não vai promover o mesmo tipo de aglomerações de outros, mas vai em pessoa e na propaganda, mostrar o que fez, e que estava escondido pela briga com essa parte da classe média e média alta que não se conforma com coisas como a justiça feita no IPTU”, diz.

“O Fortunati vai estar presencialmente em todos os bairros da cidade. Mapeamos todos os candidatos a vereador e vereadora em cada um deles e vamos centralizar regionalmente. As pessoas querem enxergar propostas com as quais se identifiquem e que tenham a ver com os serviços públicos nas suas regiões. Nossa avaliação é de que elas sabem que as políticas públicas diminuíram, apesar de haver propaganda que tenta dizer o contrário”, rebate Everton Braz, que preside o PTB municipal e coordena a campanha de Fortunati.

NOS BASTIDORES

Para além dos discursos públicos dos candidatos e seus estrategistas, a ‘briga’ por uma vaga no segundo turno é construída minuciosamente nos bastidores e está repleta de rounds nesta semana, alguns deles já iniciados. No PTB há um esforço para rebater uma narrativa que ganhou corpo nos últimos dias entre campanhas adversárias, após uma inversão de posições em algumas sondagens. A de que o partido já ‘jogou a toalha’; de que o candidato estaria desmotivado; e de que a candidatura não teria recebido os recursos acordados com a direção nacional, que, em função dos números, estaria dando prioridade a disputa na vizinha Canoas.

Os dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) atualizados até a manhã desta segunda-feira de fato mostram Fortunati como recebedor de montante inferior a Luiz Carlos Busato, que disputa a reeleição pelo PTB em Canoas. Para Fortunati, na corrida pelo comando da Capital, constam R$ 770.200,00. E, para Busato, que concorre no terceiro maior colégio eleitoral gaúcho, R$ 781.102,95. O presidente do PTB em Porto Alegre, Everton Braz, nega qualquer possibilidade de esvaziamento. “Estamos muito mobilizados e com um insight de chegada. O Magrão (Fortunati) é um cara de luta e esta semana vai mostrar isto”, resume. Mas, não bastasse o zum-zum-zum na concorrência, na tarde desta segunda-feira a campanha sofreu um grande revés. O Tribunal Regional Eleitoral (TRE) julgou procedente o pedido de impugnação da candidatura do vice na chapa de Fortunati, o médico André Cecchini (Patriota). Não há possibilidade de o recurso ser julgado antes do dia 15, a chapa se mantém na disputa ‘sub judice’ e há uma série de desdobramentos jurídicos possíveis. Mas, politicamente, o impacto no sentido de perda de votos e no da não obtenção de novos recursos financeiros é admitido internamente até por lideranças do PTB. Há, entre elas, quem use o termo nocaute. No MDB, no PDT, no PCdoB e até no PP, no PSD, no PSol e no PSDB, são feitas estimativas sobre potenciais transferências de votos.

Na campanha de Marchezan também não há tranquilidade. Além da energia dispensada ao processo de impeachment que corre na Câmara de Vereadores em paralelo à eleição,  adversários vêm chamando cada vez mais atenção para iniciativas que dizem conter irregularidades. O destaque, conforme apontam em propagandas e redes sociais, primeiro foi para a distribuição, pela prefeitura, do chamado ‘kit bebê’, alvo de investigação judicial eleitoral. Na semana que passou, cresceram os questionamentos e solicitações de detalhamentos sobre a distribuição de cestas básicas pela administração tucana. Agora, a coligação encabeçada pelo MDB obteve na justiça eleitoral deferimento de pedido para que publicações nas redes sociais da primeira-dama em que constem imagens dela mesma e do prefeito entregando cartões sociais sejam retiradas. Na decisão judicial consta que devem ser evitadas condutas que possam significar promoção pessoal e “risco ao resultado útil do processo, em face da proximidade das eleições.”

No fim de semana, foi aberta mais uma frente: uma candidata a vereadora do PSL na Capital denunciou que não recebeu os recursos divulgados no site do partido. E que outras candidatas se encontrariam na mesma situação. Adversários anunciaram que na tarde desta segunda elas entregarão documentos ao Ministério Público Eleitoral. O PSL está coligado com o PSDB na corrida na Capital e tem o candidato a vice na chapa de Marchezan. “Tem início um outro momento agora, no qual vários candidatos, que sabem que não vão mesmo para o segundo turno, começam a fazer um jogo acessório”, rebate Fábio Bernardi, estrategista de Marchezan. Segundo ele, a campanha está preparada para não deixar o que for classificado como fake news ganhar dimensão. O núcleo da campanha tucana também vai focar na disputa com Manuela porque identifica que, por uma série de fatores que extrapola questões ideológicas, ela concorre com Marchezan em determinadas fatias do eleitorado e é quem mais trava potencialmente seu crescimento.

Na campanha de Melo há muita preocupação com o que é identificado como uma diferença mínima nos números, mas determinante para que o emedebista prossiga ou não na corrida eleitoral. Por isso, a aflição com o tempo e com a sintonia fina do discurso. Parte de seus estrategistas assegura que a vantagem que Marchezan tem nas sondagens internas, além de já ser pequena, estaria em queda. A dúvida seria sobre a estratégia certa para garantir que Melo chegue e permaneça em segundo, porque ela precisa ser exata. Entre adversários, a narrativa que predomina é outra e vem sendo verbalizada inclusive por ex-aliados, como a deputada Juliana Brizola, que disputa a prefeitura pelo PDT. A de que o emedebista, apesar de não enfrentar questionamentos na justiça eleitoral ou em relação ao exercício do próprio mandato, e sem como se movimentar em direção à esquerda, onde já existiam três candidaturas bem consolidadas, adotou uma conduta ‘errática’, tentando acenar à conservadores e progressistas ao mesmo tempo. Fundindo discursos incompatíveis e priorizando inicialmente o “pessoal do Parcão”, eleitorado que nunca foi o seu forte. “Não adianta fazer tracking todo dia se você não sabe como conduzir. O tracking é só uma leitura. Importante, mas quem conduz é o candidato”, alfineta um integrante de campanha adversária. Melo rebate. “Queremos votos. Então, não vou direcionar. Vou consolidar o que já tenho e tirar de quem conseguir tirar. O que importa é convencer o eleitor a ficar conosco.”


Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895