MDB enfrenta impasse sobre candidatura no RS

MDB enfrenta impasse sobre candidatura no RS

Disputas internas e dilema sobre possibilidade de aliança com PSDB seguem gerando desconfiança e movimentos paralelos

Flavia Bemfica

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O MDB gaúcho enfrenta um impasse em relação a manutenção da candidatura própria ao governo do Estado, representada pelo deputado estadual Gabriel Souza. Apesar de Gabriel publicamente seguir percorrendo o Estado em exaustivos roteiros de pré-campanha, e fazer movimentos abertos de busca por outras siglas para fechar uma coligação que lhe dê votos e tempo de TV, internamente seu nome vem sendo ‘rifado’ por parte das lideranças partidárias, sob diferentes justificativas, e o clima que impera nos bastidores é de desconfiança e troca de acusações. O dilema emedebista fica evidente nas manifestações do presidente do diretório gaúcho, o prefeito de Rio Grande, Fábio Branco. Questionado sobre a possibilidade de retirada da pré-candidatura própria e apoio ao PSDB, Branco responde: “O Gabriel está trabalhando, é nosso candidato e não existe essa discussão hoje. No futuro, amanhã, posso até não estar vivo.”

Dentro deste contexto, a narrativa de que a direção nacional do MDB estaria ‘pressionando’ o diretório do RS para apoiar o ex-governador Eduardo Leite (PSDB) na disputa pelo Piratini, em troca do apoio nacional do PSDB à pré-candidatura da senadora Simone Tebet (MDB/MS), é apontada internamente como uma ‘cortina de fumaça’ que poderá representar uma ‘saída honrosa’ para o partido. Da parte do PSDB, a estratégia no RS lembra a mesma adotada em 2018 para garantir a aliança com o PP. Naquele ano, a coalizão nacional entre PSDB e PP foi determinante para que a posição majoritária dentro do diretório gaúcho do PP pela candidatura própria fosse derrubada e Leite conseguisse o apoio de uma grande sigla, sem o qual era difícil viabilizar sua candidatura.

No cenário atual, contra a manutenção da candidatura de Gabriel pesam seu até aqui baixo desempenho em diferentes sondagens eleitorais e a mudança nas condições impostas pelo PSDB para uma aliança com o MDB. Após ter suas pretensões na corrida presidencial frustradas pela cúpula nacional tucana, Leite, que desde o ano passado indicava não apenas que apoiaria um nome do MDB para sua sucessão, como externava sua preferência por Gabriel, agora pretende disputar novamente o governo, ofertando ao MDB a vaga de vice na chapa. O movimento é considerado uma humilhação por uma parte da legenda, enquanto outra segue ocupando cargos na administração estadual e considera que a aliança com o PSDB é a única capaz de garantir que o partido esteja em uma chapa que chegue ao segundo turno. Caso o MDB não aceite as condições, os tucanos ameaçam ofertar a vaga de vice ao União Brasil.

Na outra ponta, entre os fatores que favorecem a candidatura própria está o tamanho do partido. O MDB é o maior do RS em número de filiados, detentor da segunda maior bancada na Assembleia Legislativa e está à frente de 135 prefeituras. Como bradam internamente parte dos negociadores emedebistas, a sigla não tem até aqui um nome com a mesma densidade de Leite, mas o PSDB, sem o MDB, abre mais um flanco nas pretensões do ex-governador, que perdeu pontos após renunciar ao governo para tentar se colocar na disputa nacional e, na sequência, teve que alterar a narrativa para retornar ao jogo no RS. Outro ponto que pode auxiliar a alavancar a candidatura própria são movimentos de outras siglas. Na semana passada, por exemplo, Gabriel teve um encontro reservado no Plaza com a pré-candidata do PSD ao Senado, a ex-secretária Ana Amélia Lemos, até então apontada como aliada incondicional de Leite. Na conversa, ela teria sinalizado descontentamento, e a disposição de integrar uma aliança liderada pelo MDB, em detrimento do tucano. Hoje, acompanhado pelo ex-governador José Ivo Sartori, o deputado vai jantar na casa do pré-candidato do PDT ao governo, o ex-deputado Vieira da Cunha.

Divididos

As disputas internas do MDB gaúcho sobre a eleição para o governo do Estado se intensificaram desde que a sigla fechou um acordo com o então governador Eduardo Leite (PSDB) e passou a fazer parte da base aliada da administração. Na época, além da ocupação de espaços e melhor trânsito na destinação de recursos, lideranças emedebistas receberam a garantia de que Leite não disputaria a reeleição e trabalharia para eleger um sucessor emedebista. Foi quando passou a ser construído o discurso, por ora abandonado, de que haveria uma continuidade entre as administrações de José Ivo Sartori (MDB), do tucano e de seu sucessor, destinado a herdar votos e dar prosseguimento às diretrizes política e econômica implementadas.

A união, contudo, nunca foi pacífica, e o MDB acabou por entrar em uma sucessão de embates que envolveram, entre outros capítulos, o cancelamento de uma prévia para definir o pré-candidato ao governo e a ‘derrubada’ do deputado federal Alceu Moreira na corrida interna. Agora, ante o impasse de manter a pré-candidatura própria ou aceitar as imposições do PSDB, a sigla se divide em pelo menos quatro grupos.

Uma fatia majoritária do partido, que tem entre seus membros integrantes da chamada ‘velha guarda’, não sabe o que fazer para sair do impasse e tenta não se vincular diretamente às disputas, adotando uma postura de observação. Esse grupo faz gestos públicos de apoio a Gabriel. Mas, em reservado, avalia que as chances de a candidatura chegar ao segundo turno são muito pequenas. De público. Dentro dele há partidários com esperança de ainda encontrar uma liderança alternativa, que pudesse ‘unir’ a sigla, mas as buscas, até agora, resultaram infrutíferas.

Outro grupo defende que Gabriel ‘vá até o fim’ na manutenção da candidatura. Esses emedebistas seguem inconformados com a maneira como se deu tanto o processo como a definição da pré-candidatura dentro do partido, desfiam uma lista de críticas à relação do MDB com o PSDB no RS e são abertamente opositores internos do deputado. Para eles, o resultado mais provável é que o parlamentar tenha um desempenho eleitoral ruim, o que resultaria em uma espécie de ‘morte política’ pelo menos no curto prazo.

Outra ala do partido, também adversária interna de Gabriel, entende que deve haver uma composição com o PSDB, mas sem que ele ocupe a vaga de vice. Para esses emedebistas, permitir que o deputado seja vice de Leite é lhe conceder um prêmio após ele ter feito movimentos que, em sua avaliação, aumentaram a divisão do partido. Tanto integrantes dessa ala como da que argumenta que o deputado ‘vá até o fim’ avaliam que as conversas com o PDT fazem parte de um ‘teatro político’ que ambas as legendas saberiam estar fadado ao insucesso.

Um quarto grupo, apoiador de Gabriel, se subdivide. Uma parcela considera que a melhor saída é ele ser vice de Leite, porque entende que o tempo para uma virada é cada vez mais exíguo, e a manutenção da candidatura, caso sigam os baixos índices, pode acabar respingando nas eleições para a Câmara Federal e a Assembleia Legislativa. Outra fatia, contudo, usa levantamento interno recente para defender que o deputado tem potencial para conseguir fechar um arco de alianças que o torne mais competitivo. Esta última refuta de modo enfático insinuações de grupos adversários de que o parlamentar, apesar da manutenção da agenda de pré-candidato, já estaria, com discrição, procurando uma forma de compor com o PSDB na condição de vice.


Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895