Governo Bolsonaro flexibilizou exigências para exportação de madeira brasileira

Governo Bolsonaro flexibilizou exigências para exportação de madeira brasileira

Organizações socioambientais recorreram à Justiça para tentar derrubar decisão 

AE

Bolsonaro prometeu à cúpula do Brics "revelar" os países que compram o produto brasileiro

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A preocupação que o presidente Jair Bolsonaro expõe agora com a exportação ilegal de madeira da Amazônia, prometendo à cúpula do Brics "revelar" os países que compram o produto brasileiro, não encontra respaldo em atos recentes do próprio governo, que flexibilizou a fiscalização nacional.

Em março deste ano, quando o Brasil entrava na pandemia do coronavírus, o Ibama acabou com as inspeções que eram feitas nos portos do País. Na ocasião, madeireiros do Pará parabenizaram o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, com uma "nota de agradecimento e esperança" do Centro das Indústrias do Pará (CIP), por ter liberado a exportação de madeira de origem nativa, sem a necessidade dessa uma autorização específica.

Por meio de um "despacho interpretativo", o Ibama suspendeu os efeitos de uma instrução normativa (15/2011) do próprio órgão. Com a decisão, os produtos florestais passaram a ser apenas acompanhados de um documento de origem florestal (DOF). Esse DOF de exportação, que existe desde 2006, serve, na prática, apenas para que a madeira seja levada até o porto, enquanto a instrução normativa previa autorização para a exportação em si.

Uma análise técnica do próprio Ibama aponta que o Código Florestal distingue a licença de transporte e armazenamento (DOF) da autorização de exportação. A instrução previa, por exemplo, inspeções por amostragem e outros controles para a exportação que o DOF não exige. Os madeireiros, no entanto, defenderam que a exigência daquela autorização específica teria "caducado", porque teria sido revogada pela existência de outro recurso, o Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaor), que começou a ser implantado em 2014.

O presidente do Ibama entendeu que o argumento fazia sentido e que nem seria preciso revogar a instrução normativa de 2011, porque o próprio Sinaflor teria alterado as regras, "sendo su?ciente para exportar o DOF exportação ou a Guia Florestal expedida pelos Estados-membros". Na prática, uma guia de transporte estadual passou a valer no lugar de uma autorização de exportação do Ibama.

Em carta de 28 de fevereiro deste ano, o Centro das Indústrias do Pará afirmou que o presidente do Ibama "colocou em ordem as exportações de madeira" e criticou o Ibama.

O mercado brasileiro de madeira é, historicamente, marcado pela ilegalidade. Não há números precisos sobre a dimensão das atividades criminosas no setor, mas estima-se que até 90% das madeiras que vão para fora do País são fruto de extração irregular. O ipê, chamado de o novo "ouro da floresta", é a madeira mais cobiçada.

Dentro daquilo que o Brasil consegue rastrear como operações legais no comércio de madeira, os dados apontam que 90% das derrubadas abastecem o mercado nacional, enquanto os demais 10% seguem para o exterior. Os Estados Unidos compram mais da metade do que o Brasil exporta atualmente, seguidos dos países europeus

Maquiagem

A ilegalidade das madeiras exportadas, na maioria dos casos, ocorre em processos internos no Brasil, com emissão e gerenciamento irregular de documentos. A venda de madeira ilegal para os Estados Unidos e a Europa envolve um mercado milionário, com a participação de agentes públicos e engenheiros florestais.

Apenas uma operação da Polícia Federal, em 2017, apreendeu 10 mil metros cúbicos de madeira, volume que, se fosse enfileirado, cobriria o percurso entre Brasília e Belém, no Pará (1,5 mil quilômetros).

Toda a carga ilegal estava sendo vendida por 63 empresas, que também passaram a ser investigadas. A madeira seria destinada para outros Estados brasileiros e também para exportação, a países da América do Norte, Ásia e da Europa.

A apreensão aconteceu no âmbito da Operação Arquimedes, após um alerta emitido pela Receita Federal e pelo Ibama, que constataram, naquela época, um aumento incomum do trânsito de madeira pelo porto Chibatão, em Manaus (AM).

ONGs recorreram de decisão de Bolsonaro

Chamadas de "câncer" pelo presidente Jair Bolsonaro, as organizações socioambientais foram as instituições que recorreram à Justiça para tentar derrubar uma decisão do governo que, na prática, fragilizou o controle da exportação de madeira no País, favorecendo a saída de material ilegal do Brasil.

Em junho deste ano, o Instituto Socioambiental (ISA), a Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) e o Greenpeace Brasil entraram com uma ação na 7ª Vara ambiental e agrária da seção judiciária do Amazonas, para pedir a anulação imediata de uma decisão do Ibama, que acaba com a autorização de exportação que era emitida pelo órgão

A Ação Civil Pública pedia, em síntese, a nulidade de um despacho do Ibama que, na prática, conforme afirmam as ONGs, "liberou a exportação de madeira nativa sem fiscalização a pedido de madeireiras". A ação requer ainda que a União deixasse de emitir qualquer outro ato normativo que comprometesse a legislação já existente de controle fiscalizatório da exportação de madeiras nativas no País.

Segundo as ONGs, o objetivo era "evitar o flagrante desrespeito à legislação protetiva do meio ambiente, especialmente a que disciplina os procedimentos de fiscalização e controle da exportação de madeira nativa, afetando com vigor especial a Amazônia, patrimônio nacional e bioma essencial para a garantia do núcleo essencial do direito da coletividade ao meio ambiente ecologicamente equilibrado".

A Justiça indeferiu a liminar na primeira instância. As ONGs, então, entraram com um recurso no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que ainda aguarda apreciação.

Como mostra reportagem do Estadão, em março deste ano, o Ibama acabou com as inspeções que eram feitas nos portos do País. Por meio de um "despacho interpretavo", o Ibama suspendeu os efeitos de uma instrução normativa (15/2011) do próprio órgão. Com a decisão, os produtos florestais passaram a ser apenas acompanhados de um documento de origem florestal (DOF). Esse DOF de exportação, que existe desde 2006, serve, na prática, apenas para que a madeira seja levada até o porto, enquanto a instrução normativa previa autorização para a exportação em si.

Uma análise técnica do próprio Ibama aponta que o Código Florestal distingue a licença de transporte e armazenamento (DOF) da autorização de exportação. A instrução previa, por exemplo, inspeções por amostragem e outros controles para a exportação que o DOF não exige. Os madeireiros, no entanto, defenderam que a exigência daquela autorização específica teria "caducado", porque teria sido revogada pela existência de outro recurso, o Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sina?or), que começou a ser implantado em 2014.

O presidente do Ibama entendeu que o argumento fazia sentido e que nem seria preciso revogar a instrução normativa de 2011, porque o próprio Sinaflor teria alterado as regras, "sendo su?ciente para exportar o DOF exportação ou a Guia Florestal expedida pelos Estados-membros". Na prática, uma guia de transporte estadual passou a valer no lugar de uma autorização de exportação do Ibama.

Ilegalidade interna

A maior parte da madeira que sai do Brasil rumo ao Exterior, para virar móveis e assoalhos de casas, chega ao destino final com papeis que, a rigor, comprovariam a sua legalidade. Isso acontece porque toda a parte ilegal do comércio dessa madeira ocorre internamente. São muitos os casos em que Secretarias do Meio Ambiente dos Estados "esquentam" papeis para dar um respaldo legal de madeira que, na realidade, foi extraída de forma irregular, ou seja, de áreas protegidas, onde a madeira não poderia ser "manejada".


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