Janela partidária gera grande expectativa entre partidos no RS

Janela partidária gera grande expectativa entre partidos no RS

Período ganhou ainda mais projeção depois que o governador decidiu confirmar se troca o PSDB pelo PSD para concorrer à presidência

Flavia Bemfica

Presidente estadual do PSDB, Lucas Redecker (a esquerda), vem tentando manter Leite no partido. Enquanto isso, no PSD de Jairo Jorge (a direita) o clima é de euforia

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O prazo da janela partidária, o período do ano eleitoral no qual parlamentares podem trocar de partido sem risco de perder o mandato, transformou o mês de março em uma espécie de linha de largada para as eleições gerais de 2022. A janela abriu no último dia 3, se estende até 1º de abril e, dentro dela, parlamentares em todo o país já deram início às migrações. Não bastasse a agitação que caracteriza o período, no RS ele ganhou ainda mais projeção, em função de o governador Eduardo Leite (PSDB) deixar para anunciar durante a janela se abandona o ninho tucano e se filia ao PSD de Gilberto Kassab, em mais uma tentativa de disputar a presidência da República, após ter a pretensão frustrada dentro do PSDB.

Na prática, Leite poderia trocar de sigla a qualquer tempo até seis meses antes das eleições, e, para disputar a presidência, tem a mesma data limite para se desincompatibilizar do cargo de governador. Mas aproveitar a janela para a troca partidária embute uma estratégia duplamente vantajosa: aumenta a visibilidade da decisão e, ao mesmo tempo, permite que parlamentares da base que desejem acompanhá-lo o façam de forma simultânea, em bloco, agregando também mais peso à migração.

No PSD, o clima é de euforia. “Estamos aguardando pela decisão do governador, a expectativa é de que se posicione após o retorno dos Estados Unidos, e muito entusiasmados. Nossa convicção é de que sua vinda para o PSD mudará o quadro eleitoral nacional. E se decidir permanecer no PSDB e concorrer à reeleição, o que, no nosso entendimento, é uma possibilidade remota, também o apoiaremos. Nosso apoio é incondicional”, elenca o prefeito de Canoas e um dos principais articuladores do PSD hoje no RS, Jairo Jorge.

Conforme o prefeito, a sigla tem uma meta ambiciosa, de emplacar três deputados federais pelo RS e quatro estaduais, com possibilidade de ampliação em função do movimento de Leite. Hoje o partido tem um federal e um estadual. O PSDB gaúcho, por sua vez, detém duas cadeiras na Câmara Federal e quatro na Assembleia Legislativa, e é seguro de que parte deles vai seguir Leite que o PSD faz suas projeções. Jairo confirma também as tratativas para a migração do vice-governador, Ranolfo Vieira Júnior, que trocou o PTB pelo PSDB há seis meses. “Estamos com as portas abertas ao vice porque, com o governador candidato à presidência, Ranolfo assumirá o posto e passará a ser o grande nome de centro no RS. Isto abre, inclusive, a possibilidade de construirmos uma grande aliança com MDB, PSDB e União Brasil”, especula.

Além do ‘apoio incondicional’ citado por Jairo Jorge, outro indicativo de que a ida de Leite e de parte dos tucanos gaúchos para o PSD está sacramentada é o fato de que o partido já traçou a estratégia de como o governador, que sempre destacou estar em campo oposto ao do PT, vai responder sobre a muito provável adesão de Kassab a candidatura do ex-presidente Lula no segundo turno da eleição presidencial. A sigla primeiro vai repetir à exaustão que Leite irá para o segundo turno. Caso isto não aconteça, vai apostar na necessidade de ‘união de forças políticas antagônicas’ e fazer um comparativo com o ex-governador paulista Geraldo Alckmin, que também deixou o PSDB, e deve ser anunciado vice de Lula. “Isto não é um complicador. O governador vai crescer e ser a alternativa à polarização. Bem, se lá na frente por acaso nossa candidatura não estiver no segundo turno, vamos conversar e ver quem traz menos prejuízos ao país”, diz o prefeito.

Mudança de Leite desestabiliza PSDB e MDB

Enquanto no PSD a empolgação é corrente, no atual partido do governador, o PSDB, o clima é tenso. Uma parte dos tucanos admite internamente estar de malas prontas para acompanhar Eduardo Leite, mas são muitos os receios, a começar pelo que apontam como ‘instabilidade’ do PSD, uma das mais importantes siglas do chamado centrão na Câmara dos Deputados.

O presidente estadual do partido, deputado federal Lucas Redecker, diz que a sigla trabalha para manter Leite, e admite que sua saída prejudica bastante o partido no RS, mas evita responder objetivamente sobre o próprio destino. “Não sei. Temos que trabalhar com a hipótese de que todos fiquem”, diz, ao ser questionado sobre se permanecerá ou não no partido. O deputado só é assertivo ao falar sobre um provável apoio de tucanos gaúchos que venham a migrar para o PSD à candidatura de Lula na disputa presidencial. “Eu acho muito, muito, muito difícil que membros desta linha a qual eu pertenço apoiem o PT. Eu não apoio o PT.”

O MDB gaúcho é outro que acabou desestabilizado pelos movimentos do governador já que, até bem pouco tempo, ele articulava com parte dos emedebistas a escolha do nome da sigla que prometia apoiar para sua sucessão no Piratini. Leite não escondia a preferência pelo deputado estadual Gabriel Souza, que segue pleiteando a indicação, em disputa com o deputado federal Alceu Moreira.

As tratativas já haviam gerado reação no MDB, onde grupos como o do entorno do ex-governador José Ivo Sartori e outros históricos acusavam Leite de tentar escolher o candidato do partido. A escalada das divergências acabou ocasionando o cancelamento da prévia interna do MDB marcada para fevereiro, em uma tentativa de acalmar os ânimos. Eles, no entanto, voltaram a se acirrar com as últimas movimentações do governador e, internamente, uma parcela de emedebistas passou a usar adjetivos como ‘traíra’, ‘sem palavra’ e ‘traiçoeiro’ para se referir ao tucano.

 PL também deve se beneficiar com migrações

Além do PSD, outra sigla que projeta crescer no RS é o PL. Primeiro parlamentar a trocar o PSL pelo PL foi o deputado federal Bibo Nunes, ainda antes da janela, e a partir de uma das possibilidades previstas na legislação: O PSL se fundiu ao DEM e, juntos, se transformaram no União Brasil. “Aqui no Estado tínhamos (o PL) um estadual, agora já são dois (o deputado Luciano Zucco, eleito pelo PSL, foi para o PL na semana passada). Vamos receber mais um estadual, o Eric Lins (eleito pelo DEM). E, federais, vamos receber pelo menos três: o Marlon Santos (PDT), o Sanderson (eleito pelo PSL) e o Onyx Lorenzoni (eleito pelo DEM), que está ministro, e será nosso candidato a governador”, enumera Bibo. Na Assembleia gaúcha, o antigo PSL, que elegeu quatro deputados em 2018, implodiu. Além de Zucco migrar para o PL, Vilmar Lourenço deve ingressar no PP. Já Ruy Irigaray é alvo de processo de cassação em estágio avançado.

Com as trocas, o PL terá quatro deputados federais e dois estaduais com mandatos na atual legislatura que tentarão uma vaga na Câmara Federal. Bibo admite que alguém “vai sobrar”. “Vamos eleger de quatro a cinco federais, e há lideranças novas. Então, alguém desses seis vai ficar de fora. Mas é o risco que se corre quando se faz uma nominata competitiva.” Para a Assembleia, onde projeta fazer entre seis e sete cadeiras, o PL vai investir também nos vínculos familiares. Devem compor a nominata, por exemplo, o atual secretário de Desenvolvimento Econômico da Capital, Rodrigo Lorenzoni, filho de Onyx, a filha de Bibo, Camila, que disputou uma vaga na Câmara de Vereadores em 2020, e a esposa do deputado federal e presidente da sigla no RS, Giovani Cherini.

Entenda

  • A janela partidária é um período de 30 dias, previsto em anos eleitorais, para que parlamentares possam trocar de partido sem perder o cargo. A janela ocorre seis meses antes da eleição. Neste ano de 2022 ela foi aberta no último dia 3 de março e se estenderá até 1º de abril.
  • A norma foi regulamentada pela reforma eleitoral de 2015, e funciona como escape à regra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que determina que os mandatos pertencem aos partidos, e não aos candidatos eleitos. Ela também está prevista na Emenda Constitucional 91, aprovada em 2016. Em 2018 o TSE estabeleceu que só podem usar a janela do ano correspondente aqueles que estejam no fim dos mandatos atuais, ou seja, deputados federais, estaduais e distritais nos anos de eleições gerais e, vereadores, nos de pleitos municipais.
  • Fora dos 30 dias da janela a mudança sem possibilidade de perda de mandato pode ser feita em casos específicos: criação de uma sigla; fim ou fusão do partido; desvio do programa partidário e grave discriminação pessoal. Mudanças que não se enquadrem nesses motivos podem levar à perda do mandato.
  • Presidente, governadores e senadores, por sua vez, não precisam se submeter ao prazo da janela para trocar de partido. O entendimento está sacramentado por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e, também, por súmula do TSE. Os eleitos em chapas majoritárias, contudo, também devem cumprir outra regra da legislação eleitoral: a que determina que a filiação partidária à sigla pela qual desejam concorrer seja efetuada pelo menos seis meses antes da eleição, bem como a inscrição no domicílio eleitoral pelo qual vão disputar o cargo. Na prática, o fim do período da janela e o prazo limite para as filiações são concomitantes.
  • Além disso, chefes de Executivos, caso do presidente da República e de governadores, precisam se desincompatibilizar de suas funções até seis meses antes se desejarem concorrer a outro cargo que não o que ocupam. Para reeleição, isto não é necessário. Já os vices não precisam se afastar nem em caso de reeleição nem se pleitearem outro cargo, contanto que, nos seis meses anteriores ao pleito, não tenham substituído o titular. E eleitos para cargos legislativos, como senadores e deputados, têm algumas restrições referentes a substituições. Com exceção delas, não precisam se desincompatibilizar de suas funções para disputar outro cargo.

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