MP ingressa com ação em caso de testes de coronavírus por agropecuária de Pelotas

MP ingressa com ação em caso de testes de coronavírus por agropecuária de Pelotas

Promotoria pede suspensão da execução do contrato firmado pela Secretaria da Saúde e solicita que Estado apresente documentos

Flavia Bemfica

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A Promotoria de Defesa do Patrimônio Público do Ministério Público estadual ingressou com ação, com pedido de liminar, para a suspensão da execução do contrato firmado no dia 6 de abril entre o governo do Estado e a empresa M&S Produtos Agropecuários Ltda., de Pelotas. A empresa agropecuária foi a primeira do RS a ser contratada fora da estrutura pública, para a realização de testes de coronavírus. A contratação aconteceu sem licitação, tomando por base a Lei 13.979/2020, que dispõe sobre a aquisição de bens, serviços e insumos destinados ao enfrentamento da emergência decorrente da pandemia do coronavírus.

Na ação, de tutela cautelar em caráter antecedente (quando a causa em si é a liminar), a promotoria solicita a suspensão da execução do contrato pelo prazo de 30 dias e também de pagamentos por serviços já prestados, até que o Estado apresente relatório que comprove a adequação da empresa às normas vigentes da Anvisa, com chancela das vigilâncias sanitárias estadual e municipal.

Em 12 páginas, assinadas pelo promotor Voltaire de Freitas Michel, a promotoria aponta que “os movimentos paralelos e simultâneos da empresa a ser contratada e a tolerância do Estado com vários aspectos no mínimo controvertidos a respeito de sua capacidade de cumprir o contrato, assim como o caráter inusitado de um laboratório agropecuário adquirir uma proeminência diante de toda a rede laboratorial clínica privada do Estado, levantam indícios de ação concertada entre agentes públicos e privados, de modo oportunista, diante do relaxamento das regras licitatórias a pretexto da pandemia mundial.”

A ação sucede um inquérito civil instaurado pelo MP ainda na semana passada, com o objetivo de apurar se ocorreram irregularidades na contratação da empresa para realizar testes de coronavírus, depois de uma série de denúncias e notícias apontando pontos controversos na transação. A primeira informação sobre o caso, no MP, ocorreu em 8 de abril, quando foi lavrado um termo de informação sigiloso na Promotoria de Justiça na cidade de Rio Grande. Nele, o noticiante demonstrava “preocupação com a realização de exames por amostragem em razão do quantitativo proposto de análises/dia e da estrutura de uma agropecuária para realizar tais análises, o que poderia acarretar em falsos positivos.”

Juntado a ação está também ofício da presidente do Conselho Regional de Farmácia (CRF), datado de 7 de abril e endereçado à secretária estadual da Saúde, solicitando esclarecimentos sobre a contratação. No ofício, o CRF questiona a contratação da agropecuária ante o fato de o Estado contar com 628 laboratórios de análises clínicas registrados e ativos junto ao conselho e outros 300 registrados junto aos conselhos de Biomedicina e Medicina. A inicial discorre ainda sobre o fato de a empresa posteriormente ter buscado e obtido, em 9 de abril, junto ao CRF, certidão de regularidade técnica (a existência de um profissional com responsabilidade técnica).  

E cita a nota do Conselho Regional de Medicina Veterinária na qual é informado que o conselho negou à empresa declaração no sentido de que autorizava ou não se opunha à realização de testes RT-PCR para detecção do vírus, destacando o conselho que médicos veterinários não têm competência para firmar laudos realizados com seres humanos.

Nas investigações realizadas no curso do inquérito, o MP apurou que a empresa, estabelecida em Pelotas como uma agropecuária, requereu em 1º de abril de 2020 a alteração de seu contrato social na Junta Comercial do RS, para acrescentar entre suas atividades a de laboratório clínico, sendo a alteração registrada na mesma data da celebração do contrato com o Estado. O MP aponta ainda a realização de levantamento fotográfico da empresa via fontes abertas, que levou a promotoria a identificá-lo como “estabelecimento comercial de padrão modesto.”

Após a polêmica, em 10 de abril o governador Eduardo Leite (PSDB) declarou, em vídeo, na live diária que faz na página do governo no Facebook, que a secretaria da Saúde fez contato com dezenas de laboratórios para a realização dos testes, mas que “boa parte deles argumentou que tinha a estrutura, mas não os insumos”. Segundo o governador, a empresa de Pelotas informou ter os insumos e a estrutura necessários e sua contratação ocorreu com acompanhamento de funcionários públicos. Leite disse ainda que todos os laudos e vistorias foram feitos e assinalou que laboratórios agropecuários podem fazer os exames se cumprirem as exigências legais.

Até o momento, o governo não confirmou se a empresa está mesmo realizando 250 testes por dia para detecção de coronavírus. O governo e a empresa ainda não se manifestaram publicamente a respeito da ação do MP.

48 horas

Nesta quinta-feira, o juiz Murilo Magalhães Castro Filho, da 5ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, concedeu prazo de 48 horas para que o governo do Estado forneça explicações a respeito da contratação da empresa agropecuária de Pelotas para a realização dos testes de detecção de coronavírus. A solicitação do prazo para apresentar manifestação antes de qualquer decisão foi requerida pelo próprio governo. No despacho, o magistrado considerou que “a complexidade da contratação objeto do feito, a gravidade dos questionamentos levantados pelo autor e o relevante interesse público acerca da avença torna imprescindível neste momento a oitiva do Estado do Rio Grande do Sul antes de qualquer decisão concernente à necessidade  ou não de suspensão do contrato firmado entre os réus, especialmente diante do impacto social que qualquer determinação ocasionará.”


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