Na CPI, Franco diz que atraso no desenvolvimento da Coronavac não permitiu antecipar vacinação

Na CPI, Franco diz que atraso no desenvolvimento da Coronavac não permitiu antecipar vacinação

Ex-secretário-executivo comentou que o governo federal não tinha interesse na vacina chinesa

R7 e AE

Ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde Elcio Franco prestou depoimento na CPI

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O ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde Elcio Franco encerrou o seu depoimento, no início da noite desta quarta-feira, na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19. Entre os destaques, a maioria dos questionamentos foi em relação às vacinas contra a doença e a demora para adquiri-las. Franco afirmou que a vacinação contra a Covid-19 não começou mais cedo no País por atrasos do Instituto Butantan no pedido para uso à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Para o ex-secretário, o atraso no desenvolvimento da Coronavac impediu que a vacinação contra a Covid-19 fosse antecipada no País.

À época, o presidente Jair Bolsonaro criticou diversas vezes o imunizante e reforçou que "a vacina chinesa de João Doria" não seria comprada pelo governo federal. "Nós não tínhamos interesse na vacina chinesa. Tínhamos interesse na vacina a ser produzida pelo Instituto Butantan", justificou Franco.  "Nós não poderíamos apoiar o desenvolvimento da vacina do Butantan porque ela estava sendo desenvolvida pela Sinovac na China. O Butantan não estava desenvolvendo, estava apenas conduzindo os estudos clínicos de fase 3 para depois colocar na linha de produção", completou.

Ele ainda reforçou que o governo não tinha como comprar lotes da Coronavac em 2020 porque a vacina ainda estava em estudos da fase 3.  "A fase 3 de estudos clínicos também é considerada um cemitério de vacinas, porque pode haver o insucesso no desenvolvimento. Então o acompanhamento constante do desenvolvimento ocorria por parte do ministério justamente por essa dúvida sobre essa fase", explicou. "A incerteza em relação às vacinas é muito grande", acrescentou o ex-secretário-executivo.

Falta de consenso com a Pfizer 

O ex-secretário-executivo também falou que a falta de consenso sobre cláusulas apresentadas pela Pfizer para o fornecimento de vacinas partiu do Ministério da Economia. Diante do pedido do vice-presidente da comissão, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), para que fosse convocado à comissão o ministro da Economia, Paulo Guedes, Franco esclareceu que não tratou do assunto com o ministro, mas sim com auxiliares e técnicos da pasta.

Mais cedo, durante depoimento, Elcio havia afirmado que a falta de consenso se dava, em especial, sobre os dispositivos do contrato que tratavam de quem deveria partir a iniciativa uma vez que deveria ser convertida em lei, se do Executivo federal ou do Legislativo.

Ele disse também não ter conhecimento dos primeiros contatos da farmacêutica Pfizer com o governo brasileiro para o fornecimento de vacinas contra a Covid-19. Segundo Randolfe, 90% - das 81 correspondências da farmacêutica ao governo brasileiro enviadas desde 17 de março - não tiveram resposta.

"Vírus" atrapalhou tratativas

Franco declarou que em meio às tratativas com a Pfizer em dezembro de 2020 houve "lapso temporal" do ministério causado por um "ataque de vírus" no servidor interno, o que teria atrasado em uma semana as respostas de sua equipe à farmacêutica. 

Em um destes e-mails, que chegou no dia 2 de dezembro de 2020, a farmacêutica cobrou o ministério por uma resposta das ofertas, já que a empresa estava reservando doses ao Brasil que já poderiam ser enviadas a outros países da América Latina. 

O ex-secretário confirmou a chegada do e-mail, e disse que a farmacêutica exigiu no contrato a edição de uma Medida Provisória para garantir segurança jurídica. "Mandaram sugestão de Medida Provisória e mandaram essa proposta de MOU (Memorando de Entendimentos). Foi aquele período em que houve um lapso temporal que o Ministério da Saúde, assim como o STJ e o governo do Distrito Federal ficaram fora do ar, o que atrasou a nossa análise desse material. Por uma semana não funcionava o servidor do ministério por causa do ataque de vírus", respondeu Elcio Franco. 

Imunidade de rebanho

O ex-secretário-executivo negou que a pasta tenha tratado da chamada imunidade de rebanho, teoria de contaminação em massa, como estratégia de imunização da população contra a Covid-19. "Nunca se discutiu na área técnica do ministério entre os secretários com o ministro essa ideia de imunidade de rebanho", afirmou. "Não se visualizava isso. Tínhamos noção da gravidade da pandemia e, assim como a Influenza, imaginávamos que teríamos que ter campanhas anuais de vacinação", afirmou.

Para o ex-secretário do Ministério da Saúde, entre os motivos para a demora em fechar o acordo com a Pfizer estão "cláusulas muito restritas" impostas pela farmacêutica, dificuldades com os termos da proposta e a falta de "garantia de sucesso da vacina". "Lembro que as exigências da Pfizer eram de ativos no exterior, como o prédio de uma embaixada, fundo garantidor, arbitragem em Nova York, sem penalidades para atrasos na entrega de imunizantes, pagamento adiantado, isenção completa para eventos adversos, projeto de lei, e assinatura pelo presidente da República", relatou Franco.

De acordo com o ex-secretário, o Ministério da Saúde esteve "sempre" negociando com a farmacêutica soluções logísticas e jurídicas. Apesar das reclamações, Franco disse não ter os documentos que comprovem a cronologia de negociação com a Pfizer desde abril. Sobre as 53 correspondências eletrônicas que não tiveram resposta do Ministério da Saúde, o ex-secretário da Saúde disse que os contatos por e-mail foram prejudicados em uma ocasião por ataque hacker e em outras houve conversas por videoconferência, contato telefônico e e-mail de resposta.

Repasses

Franco, que era braço direito do ex-ministro Eduardo Pazuello, citou uma série de dados e repasses do governo federal para defender a atuação da União no enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. O custeamento de leitos de UTI, de equipamentos médicos, os repasses federais para Estados e municípios foram algumas das informações levantadas pelo ex-número 2 da pasta.

Franco ainda repetiu o discurso de Pazuello quando depôs à CPI, de que a atuação da União teria ficado "limitada" após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que deu aval para Estados e municípios decidirem medidas de enfrentamento à Covid-19. 

Oxigênio em Manaus

Franco afirmou, durante o depoimento à CPI, que o Ministério da Saúde  empregou "todos os esforços" na aquisição de cilindros de oxigênio hospitalar para uso em Manaus e reforçou que "não faltou dinheiro" para a compra dos insumos, mas que a responsabilidade para adquirir e monitorar o consumo é do Estado do Amazonas e do município de Manaus, bem como do fabricante do insumo. "Todas as demandas foram atendidas em 24h da oportunidade da demanda. Inicialmente, o ministro da Saúde recebeu uma ligação na noite do dia 7 de janeiro do secretário estadual de Saúde, onde ele solicitava apoio logístico no transporte de cilindros para Manaus", relatou Franco.

De acordo com o ex-secretário, o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, só tomou conhecimento das escassez na produção e fornecimento do oxigênio três dias depois, no dia 10 de janeiro, após visita ao Estado. Franco também ressaltou a versão dada por Pazuello à CPI e reforçou que a oferta de oxigênio hospitalar já havia sido equacionada uma semana depois da primeira ligação, em 15 de janeiro.

As declarações, entretanto, foram contestadas pelo líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM) que disse serem "contraditórias" a informação sobre o estoque de oxigênio e as mortes no Amazonas. "No dia 15 de janeiro não estava equacionado o problema de oxigênio de Manaus e do Amazonas. O nosso problema de oxigênio e a curva de mortes e mais os vídeos que temos comprovam que o problema de oxigênio no Amazonas foi até o fim do mês de janeiro e início do mês de fevereiro. Essa informação é errada, é mentirosa", respondeu Braga.

Kit covid  

Franco disse desconhecer a solicitação de "kits covid", coquetel de remédios que não conta com aval médico, por secretários municipais de Saúde à pasta. À CPI da Covid, o ex-secretário afirmou que a cloroquina, medicamento sem eficácia comprovada contra a Covid-19 e defendida pelo presidente e apoiadores como alternativa às medidas de prevenção, estava prevista na relação do Ministério da Saúde para ser usada no tratamento da malária e do lúpus.

Segundo narrou o relator da CPI da Covid, Renan Calheiros (MDB-AL), "em janeiro de 2021, secretários de Saúde dos municípios foram procurados por parlamentares bolsonaristas, entre eles Bibo Nunes (PSL-RS), para que fizessem a solicitação ao Ministério da Saúde para receberem o kit covid para tratamento precoce". Franco respondeu que "o kit de tratamento precoce não é utilizado pelo ministério" e reforçou que os remédios eram fornecidos mediante a demanda de Estados e municípios.


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