Na CPI, Luana Araújo reforça que a ciência não encontrou tratamento inicial para Covid-19

Na CPI, Luana Araújo reforça que a ciência não encontrou tratamento inicial para Covid-19

Médica infectologista prestou depoimento no Senado nesta quarta-feira

AE e R7

Para a médica não tem mais cabimento a discussão sobre o tratamento precoce contra a Covid-19

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A médica infectologista Luana Araújo encerrou, no fim da tarde desta quinta-feira, o seu depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid no Senado Federal. Ao longo do dia, a médica, cujo nome não foi aprovado pelo governo para integrar o Ministério da Saúde mesmo após o anúncio do titular da pasta, Marcelo Queiroga, frisou, mais de uma vez, aos senadores que a ciência ainda não conseguiu encontrar um tratamento inicial para pacientes com Covid-19.

"Não existe tratamento inicial da doença", disse, após a insistência do senador governista Marcos Rogério (DEM-RO) em falar sobre a existência de medicamentos que, administrados no início da doença, impediriam sua evolução.

"Ciência não é opinião"

A médica também fez questão de destacar que "ciência não é opinião". "Eu posso juntar a opinião de um milhão de pessoas, elas vão ser, ainda assim, opiniões. Ciência é método. Ciência é feita com desenvolvimento de atividades específicas que se encadeiam para que a gente tire de nós a responsabilidade de arcar com fatores de confusão", declarou.

Luana também respondeu ao senador Marcos do Val (Podemos-CE) de que todas as suas posições referentes à saúde em seu depoimento foram feitas de forma técnica e condizentes aos maiores especialistas do mundo. "Eu não estou aqui sozinha, eu represento uma classe enorme desse País de cientistas muito sérios", afirmou. Do Val, contudo, pediu que Luana "respeitasse" a opinião de especialistas contrários a ela.

"Eu respeito todos os meus colegas senador, e louvo o esforço que todos tem feito, mas existe uma diferença entre respeito e responsabilização, que é uma coisa que todos nós respondemos", declarou a infectologista, dizendo ter bastante confiança no seu conhecimento e na sua competência para discorrer sobre o tema.

Não há resposta eficaz

Luana destacou que a comunidade científica tem feito testes, mas que até o momento não houve resposta eficaz e ainda explicou ao senador porque medicamentos como a cloroquina, defendida pelo presidente Jair Bolsonaro, não funcionam para tratar a Covid-19.

"Não é que a gente não queira que as pessoas não tenham acesso, pelo contrário, nossa vida seria mais fácil, perdi amigos, perdi colega de plantão da Fiocruz que era um gênio, morreu salvando a vida das pessoas. Se houvesse oportunidade a gente teria usado. Infelizmente, não tem", declarou a médica.

Para a médica não tem mais cabimento a discussão sobre o tratamento precoce contra a Covid-19 no País. Segundo ela, a discussão "é delirante, esdrúxula, anacrônica e contraproducente".

Kit Covid

Ela reforçou a ineficácia de medicamentos usados no "kit covid". Luana afirmou que apesar de o SUS (Sistema Único de Saúde) não ter patrocinado a distribuição dos medicamentos, ela aconteceu "fartamente" no território nacional. Para a médica, se os fármacos fossem úteis, "a gente não teria os números que a gente tem hoje".

A médica disse também não acreditar que gestores adotem o "kit covid" por "ma-fé", mas que existe a necessidade de um preparo maior para lidar com a saúde no País.

Para a infectologista, faltam profissionais de saúde pública integrados à gestão de todos os níveis. "Não dá pra ter um infectologista somente numa cidade de grande porte, ou médio grande porte", declarou, defendendo uma "granularidade" de profissionais de cidades para cidades.

Passagem no Ministério da Saúde 

A médica afirmou não ter sido informada pelo ministro Marcelo Queiroga do motivo pelo qual seu nome não foi aprovado para comandar a Secretaria Extraordinária de Enfrentamento à Covid-19 do Ministério da Saúde. "Não foi me dado nenhum tipo de justificativa pela minha saída", disse. Luana deixou a equipe de Queiroga dez dias depois de ser indicada para o cargo, antes mesmo de sua nomeação se confirmar.

No entanto, ela avaliou positivamente a atuação do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, que tem "toda a competência" para lidar com as dificuldades da pandemia. Luana também afirmou que deposita nele, como "médica e cidadã", todas as suas esperanças de que ele possa exercer seu trabalho à frente da Saúde.

Declarações 

Luana disse não saber se a causa da recusa foram suas falas contra o tratamento precoce defendido pelo presidente Jair Bolsonaro. Observou, porém, que suas declarações foram publicadas pela imprensa. "Mas quem pode esclarecer isso melhor não sou eu", afirmou a médica.

Sobre as declarações proferidas pelo presidente Jair Bolsonaro ao longo da pandemia, dos quais ela discorda, Luana comentou que "dói" ouvi-las. Ela pediu para não personificar suas falas e que gostaria de se manter em análises técnicas sobre a pandemia. No entanto, disse sentir um "impacto emocional" após o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apresentar um vídeo na CPI com manifestações polêmicas do presidente.

Cloroquina 

Segundo Luana, a cloroquina é responsável pelo aumento de 77% no risco de óbitos em pacientes com Covid-19. "Eu considero natural que lá no começo da pandemia a gente tenha insistido em algo que não tem realmente valor", disse, completando que o remédio já foi descartado por "estudos científicos sólidos" de instituições renomadas do mundo inteiro.

O senador governista Eduardo Girão (Pros-CE) perguntou então o que ela diria se médicos e enfermeiros do País estivessem salvando vidas com o tratamento precoce? E ela rebateu: "Infelizmente  isso não é o que aponta (a ciência). Existe uma revisão sistemática que mostra elevação de risco de 1.77 para o uso da cloroquina, o que mostra um aumento da mortalidade de 77%."

Luana Araújo discordou com veemência da afirmação de que a classe científica está dividida. "Ciência não tem lado, ou é bem feita ou é mal feita. A bem feita é aquela que não busca o resultado que você quer. Ela faz a pergunta e espera para entender o que aconteceu. É preciso ter uma criticidade bastante desenvolvida para que a gente consiga dar aos nossos colegas as ferramentas necessárias para esse tipo de análise."


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