Nise Yamaguchi nega tentativa de alterar bula da cloroquina

Nise Yamaguchi nega tentativa de alterar bula da cloroquina

Em depoimento à CPI da Covid, médica contradisse relatos de Mandetta e do presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres

R7 e AE

Médica depõe na CPI da Covid nesta terça-feira

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A médica oncologista Nise Yamaguchi afirmou aos senadores da CPI da Covid, nesta terça-feira, que não agiu para alterar a bula da cloroquina para que o medicamento tivesse indicação de uso em tratamento precoce contra Covid-19.

Yamaguchi é conhecida defensora do tratamento precoce contra o novo coronavírus, apesar de grande parte da comunidade científica apontar que não há eficácia comprovada e possíveis efeitos colaterais.

Ela contradisse o diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres, que afirmou à comissão que a médica propôs mudança da bula em reunião no Palácio do Planalto no ano passado. Também apresentou versão contrária à do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, que afirmou ter visto na reunião uma minuta para alterar a bula da cloroquina.

Segundo a médica, no encontro realizado em abril do ano passado discutiu-se uma minuta relativa ao medicamento, mas que não se tratava de um documento para a alteração das recomendações de uso do remédio. Conforme a oncologista, era um "um rascunho de como poderia ser disponibilizada uma medicação que estava em falta" e abordava também a "adesão ao tratamento de acordo com um consentimento livre esclarecido e notificações no site da Anvisa".

Ela também descartou que na reunião tivesse sido debatido um decreto para alteração da bula. "Não existiu ideia de mudança de bula por minuta, nem por decreto", disse.

Ela negou ainda que o encontro tivesse sido uma reunião de um suspoto gabinete paralelo e não oficial do governo para aconselhamento e decisões envolvendo a pandemia." Fui convidada científica para a reunião, uma reunião oficial, dentro da Presidência da Casa Civil, com o ministro da Saúde [Mandetta] e o presidente da Anvisa", afirmou.

Barra Torres declarou que, na reunião, a médica tinha sugerido a mudança na bula e que ele prontamente rejeitou a ideia. "Minha reação foi imediata, dizendo que aquilo não poderia ser feito", disse aos senadores.

"Ele (Bolsonaro) queria saber o que tinha de dados científicos da hidroxicloroquina e eu fiz a seguir essa reunião com o Conselho Federal de Medicina para caracterizar o que tinha de científico. A dúvida dele era em relação às possibilidade com o que estava acontecendo no mundo", relatou a médica. "O que eu disse para ele (Bolsonaro) é que os médicos estavam divididos e que existia uma discussão sobre a parte científica do medicamento", afirmou.

De acordo com Nise, a participação dela nos esforços do governo federal para conter a crise da Covid-19 esteve restrita à participação em algumas reuniões. Segundo afirmou a médica, os convites partiram de assessores do então ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, e do gabinete presidencial.

"Foi somente aquela reunião onde eu participei desse comitê de crise e depois não houve necessidade e eles não formalizaram. Eu fui uma colaboradora eventual", afirmou. "Não houve um convite formal para o gabinete de crise. Houve um convite para participar daquela reunião pontual. Eu fiz parte dessa discussão daquele dia com relação a isso. Reitero que o presidente nunca me convidou para ser ministra da Saúde", reforçou.

A médica disse que esteve reunida com o assessor da Casa Civil, Élcio Franco, à época secretário-executivo da Saúde e com o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello para discutir, entre outros assuntos, os protocolos para o tratamento precoce. Nise afirmou que se reuniu também com o ex-ministro da Saúde Nelson Teich, porém não tratou do uso da cloroquina. Segundo a médica, Teich foi um "excelente gestor", uma vez que garantiu o contrato para as vacinas da AstraZeneca ao País.

Nise apontou também que durante os encontros estiveram presentes também o empreendedor Carlos Wizard e Arthur Weintraub, irmão do ex-ministro da Educação, apontados como integrantes do assessoramento paralelo do presidente. Nise afirmou que nunca conversou com o ex-ministro da Saúde Henrique Mandetta, com o ministro da Economia, Paulo Guedes, ou com o filho do presidente e vereador Carlos Bolsonaro.

Suspensão

Em julho do ano passado, Nise Yamaguchi foi suspensa pelo Hospital Albert Einstein por fazer uma analogia entre o pânico da pandemia e o Holocausto - como é conhecido o genocídio de 6 milhões de judeus na Segunda Guerra Mundial.

"Você acha que alguns poucos militares nazistas conseguiriam controlar aquela massa de rebanho de judeus famintos se não os submetessem diariamente a humilhações, humilhações, humilhações...", disse a médica. Após a entrevista ser publicada, ela se desculpou.

Bate-boca

A CPI da Covid teve um novo bate boca durante os trabalhos desta terça-feira. As discussões desta vez foram iniciadas pelo presidente do colegiado, senador Omar Aziz (PSD-AM) que, após ouvir um vídeo onde a médica Nise Yamaguchi defendeu que com o tratamento precoce contra Covid-19, não seria necessário uma vacinação "aleatória" da população, pediu a população que desconsiderasse as falas da médica.

Confrontada com o vídeo, a médica voltou a afirmar que não se deve vacinar "aleatoriamente" dizendo que a vacinação contra a doença seria a única opção contra a doença. Aziz então interrompeu a médica pedindo que a população que acompanha a CPI desconsiderasse as falas da doutora com relação à vacina.

"Quem está nos vendo neste momento, eu peço que desconsidere essas questões que ela disse aqui em relação à vacina. Desconsidere o que ela está dizendo em relação à vacina, ela não está certa" disse Aziz. "A sua voz calma, a sua forma de falar, convence as pessoas como se a senhora estivesse falando a verdade. Infelizmente, doutora Nise, o que os seus colegas me falaram eu retiro completamente, eles estão totalmente equivocados em relação a senhora. A senhora está omitindo aqui muita coisa", afirmou Aziz, alertando a médica que ela será convocada novamente à CPI.


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