"Nunca o Brasil se submeteu a essa humilhação", diz Celso Amorim sobre isenção de vistos

"Nunca o Brasil se submeteu a essa humilhação", diz Celso Amorim sobre isenção de vistos

Ex-chanceler chamou medida, sem reciprocidade, de "rebaixamento descabido"

Correio do Povo

Chanceler acredita que liberação do visto para os EUA não vai aumentar o turismo no país e chama postura de "rebaixamento descabido"

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Ministro das Relações Exteriores durante 1993 e 1994, e de 2003 a 2011, Celso Amorim considera que a política do Itamaraty tem manchado a imagem do país no exterior. "Nunca o Brasil se submeteu a essa humilhação", afirma o ex-chanceler sobre a combinação da fala do deputado federal Eduardo Bolsonaro de que imigrantes ilegais são uma vergonha e a isenção de visto para turistas Estados Unidos, Austrália Japão e Canadá. Ele acredita que a medida é um "rebaixamento descabido" fundado na "depreciação da autoestima do brasileiro" e que ela não vai aumentar o turismo em território nacional. "Se você oferece tudo de graça, não é uma relação comercial. É o velho complexo de vira-lata do qual falava Nelson Rodrigues", resumiu em entrevista à Rádio Guaíba.

"O brasileiro é um candidato, segundo essa visão, a ser um imigrante ilegal, uma pessoa que já está clandestina; o americano é o bom, vem com dinheiro. É uma visão infantil e que não corresponde com a postura geopolítica do mundo. As relações internacionais se baseiam na reciprocidade. As raras exceções se tratam quando se está negociando com um país mais pobre e as condições deles são mais pobres que as nossas. No caso não é isso, é tratar o seu próprio país como de segunda categoria. É uma visão superficial e prejudicial que depõe contra a nossa própria credibilidade", completou.

Amorim comentou que "só pessoas que não entendem como é um relacionamento internacional aceitam essa postura". "Morei duas vezes nos Estados Unidos, por tempos longos. Nunca vi um americano chegar pra mim e se queixar que queria vir fazer negócios ou passear e ser impedido pelo visto. Isso é uma mentira, uma falsidade", criticou. "Não tem nada a ver com Lula, esquerdismo ou socialismo. Lembro, no governo Itamar (Franco), de uma brasileira que veio me agradecer por eu ter intercedido quando foi injustamente presa e algemada na alfândega norte-americana. É claro que isso não acontece com todo mundo, acontece eventualmente. Enquanto isso, vamos receber com flores e rapapés todos os americanos", ironizou. O ex-ministro também disse que a situação vai mudar quando um "governo normal" assumir o poder.

O ex-chanceler avaliou que "essa guinada para um alinhamento total e de declarações de amor unilateral a Washignton não é compatível com os interesses brasileiros". "Interessa ao país que sejamos mais multipolar e menos hegemônico, dependente de uma única potência. Nunca vivemos, no plano verdedeiro, uma cruzada contra determinado regime ou formas de vida e civilização. É um grande erro você colocar todos os ovos numa única cesta. É isso que estamos fazendo", concluiu.


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