Reforma da previdência de militares terá resistência

Reforma da previdência de militares terá resistência

Projeto que deve ser votado nas próximas semanas na Assembleia Legislativa desagrada parte das categorias que serão afetadas

Henrique Massaro

A proposta passa a trancar a pauta na sessão de 9 de março

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O projeto da reforma da previdência dos militares do Estado, que deve ser votado nas próximas semanas na Assembleia Legislativa, encontrará uma série de resistências por parte das categorias atingidas. Prevendo mudanças que se equiparam às que foram aprovadas para os servidores civis em 2020, como a substituição do desconto previdenciário de 14% para alíquotas progressivas de acordo com a faixa salarial, saindo de 7,5% e chegando a 22%, o texto é fortemente atacado por representantes dos servidores. No Legislativo, bancadas têm discutido o projeto. Em função do pedido de urgência, a proposta passa a trancar a pauta na sessão de 9 de março. 

Os servidores militares alegam que o projeto fere a Constituição. Segundo o presidente da Associação dos Oficiais da Brigada Militar (ASOFBM), coronel Marcos Paulo Beck, fixar as alíquotas não é uma competência do Estado, e o sistema de progressividade não está previsto para servidores militares. “Vemos isso como uma afronta, não tem outro termo para definir”, afirma Beck. Na avaliação dele, o projeto serve como plataforma política para que o governador Eduardo Leite se projete nacionalmente e, além de inconstitucional, é imoral porque comprometerá uma corporação que já vem sendo prejudicada nos últimos anos. “Nos crimes que estão sob a égide da polícia ostensiva, os resultados vêm melhorando gradualmente, considerando que o efetivo da Brigada é menos da metade do que era nos anos 1990.”

O coronel acredita e espera que o texto não passe na Assembleia. Caso seja aprovado, a resposta da categoria será judicializar a questão. “Não é ameaça, cada um de nós vai à Justiça buscar que a Constituição seja cumprida”, garante Beck. O presidente da ASOFBM ainda argumenta que é necessário um projeto de reforma que se iguale às mudanças aplicadas aos servidores civis em 2020.

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Perigo

Segundo ele, os militares têm menos direitos que o restante do funcionalismo, que tem, por exemplo, direito a greve. O coronel ainda cita que os brigadianos se submetem diariamente aos perigos do combate à criminalidade e que, em decorrência disso e de outros fatores, como a desvalorização profissional, registram altos índices de suicídio. De acordo com dados da associação, o aumento do número de militares estaduais que tiraram a própria vida desde 2018 é de 60%.

Entidades preveem possível judicialização

Para a diretora adjunta de Direito Militar do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Ariani Zanardo, o governo estadual encontra respaldo para o projeto depois que o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo, deferiu, em fevereiro de 2020, medida liminar que permitiu ao Estado manter a cobrança da alíquota de 14% dos militares estaduais sem sofrer sanções da União por não cobrar os 9,5% (2020) e os 10,5% (2021) previstos em lei federal para militares das Forças Armadas e seus pensionistas. Na prática, segundo ela, a decisão do tribunal garantiu a autonomia para o Estado fixar a alíquota de contribuição. “O Estado tem, de certo modo, uma carta na manga dizendo que poderia manter ou fixar suas próprias alíquotas”, explica. 

A ação, contudo, não decidiu sobre a progressividade, o que deve gerar novas discussões judiciais. A discordância pode partir de militares do alto escalão, que se sentem prejudicados pelo sistema proposto, já que contribuiriam mais. Para Ariani, não há inconstitucionalidade na progressão da alíquota para militares, em uma interpretação sistemática da Constituição no contexto reformista oriundo de 2019. Ela afirma que o sistema como um todo seria mais justo, pois militares contribuirão de forma mais compatível com sua remuneração. “Parece ser o ideal justamente por estarmos com um déficit que foi comprovado pelo governo quando apresentou o projeto.”

Para o coordenador geral da Associação de Bombeiros do Estado do RS (Abergs), tenente-coronel Ederson Franco, a decisão do Supremo sobre a Lei 13.945/2019 não dá ao Estado o poder de decidir sobre a alíquota, mas de aplicar os 14% sem sofrer sanções. Franco afirma ainda que os militares não estão dentro da Previdência do funcionalismo civil por conta das especificidades das funções, como dedicação exclusiva e não ter direito a greve. “Se passar esta ilegalidade, vai ocorrer um passivo, porque os militares certamente ganharão na Justiça”, garante.

Governo defende legitimidade da proposta

Apesar das críticas, o governo do Estado defende a legitimidade da proposta. Durante a apresentação do texto, que sofreu alterações na comparação com o projeto do ano passado, o Executivo assegura que as leis estaduais são autônomas para definir as alíquotas previdenciárias dos militares frente à Lei Federal 13.954, que já foi objeto de liminar do Estado junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) em fevereiro de 2020. Seria corroborada ainda por decisões da Corte a favor dos estados de Mato Grosso, em decisão plenária unânime de outubro de 2020, e do Ceará, em janeiro de 2021.

Ao defender as mudanças, o governador Eduardo Leite afirmou que a medida garantirá isonomia na contribuição entre os servidores civis e militares. Um dos argumentos para a aprovação do texto é o de que cerca de 96% dos militares ativos pagarão menos previdência em relação à sua situação atual, pois sua alíquota efetiva será inferior aos atuais 14%, beneficiando, portanto, os servidores de menor rendimento na ativa. O Executivo prevê que a mudança vai representar um acréscimo de receitas previdenciárias próximo a R$ 200 milhões anuais.


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