Cultivo e venda sob novas influências foi tema de debate no Correio do Povo na Expodireto

Cultivo e venda sob novas influências foi tema de debate no Correio do Povo na Expodireto

Atitudes da China e dos Estados Unidos se tornam decisivas para o preço como o clima e o câmbio

Danton Júnior

Debatadores constataram que reação da soja na últimas semanas não foi acompanhada por outras culturas

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A rentabilidade da lavoura é uma das principais preocupações do setor agropecuário, manifestada ao longo da 19ª Expodireto Cotrijal. Ao mesmo tempo em que o governo comemora a queda da taxa de inflação, influenciada pela redução no preço dos alimentos ao consumidor, os agricultores queixam-se da baixa remuneração de alguns produtos, que muitas vezes não chegam a cobrir sequer os custos de produção. O preço da soja teve uma reação nas últimas semanas frente à expectativa de redução de safra na Argentina. Mas produtos como o arroz, o leite, o milho e o trigo vivem momentos delicados, com produtores reduzindo área ou desistindo da atividade. As tendências de preços das commodities para o ano de 2018 foram o tema do último dia de debates do Correio do Povo Rural, na casa do Correio do Povo na Expodireto Cotrijal, em Não-Me-Toque.

Estoques altos, por um lado, e problemas climáticos, por outro, foram os principais fatores apontados pelo assistente técnico de produção vegetal da Emater Regional de Passo Fundo, Cláudio Doro. Além disso, citou questões conjunturais, como assuntos geopolíticos, câmbio e desempenho da economia. O ciclo recente de baixa nas commodities foi influenciado por um alto estoque mundial de milho (286 milhões de toneladas), trigo (186 milhões de toneladas) e soja (98 milhões de toneladas), mas começou a ser revertido com a tendência de quebra na safra de soja da Argentina, em função do clima. "Criou-se uma nova expectativa, um novo alento", resumiu. Apesar disso, a avaliação dele, a tendência no curto prazo é de uma certa acomodação dos preços, "uma vez que temos estoques reguladores bastante altos, e a demanda cresce, mas não é muito grande".



Na avaliação do professor Benami Bacaltchuk, da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Passo Fundo (UPF), uma redução na safra da Argentina tende a impactar mais no milho do que na soja, tendo em vista a menor representatividade da produção da oleaginosa do país vizinho, comparado a Brasil e Estados Unidos. Por outro lado, ele faz um alerta pelo fato de o Brasil contar com praticamente um único cliente significativo. "A minha preocupação é quanta soja a China vai buscar no Brasil", ressaltou. Em razão disso, o Brasil terá de estar atento a fatores como o crescimento do PIB chinês, a participação dos asiáticos no mercado de produtos industriais e a parcela da população que estará se alimentando melhor. A recente alta nos preços da soja, na avaliação dele, deve-se mais a fatores "emocionais", em que o mercado acaba por antecipar escassez ou oferta de um produto.

Os efeitos do protecionismo adotado pelos Estados Unidos, sob a presidência de Donald Trump, foram lembrados pelo professor Nilson Luiz Costa, coordenador da pós-graduação em agronegócios da UFSM em Palmeira das Missões. "Com a política do America First, temos um arcabouço de medidas protecionistas que estão sendo levadas a cabo e isso começa a resultar numa contraposição dos países", disse. COmo exemplo, citou a intenção do presidente dos EUA de taxar importações de aço e alumínio, o que pode fazer com que os chineses adotem o mesmo comportamento em relação à soja norteamericana. "Isso pode exercer um impacto no nosso mercado", alertou o professor. Um fator que deve impactar positivamente nos preços dos grãos é o fato de que a população dos países emergentes aumentou e se urbanizou. Como consequência, está se alimentando melhor. Sobre o momento ideal para comercializar pelo menos parte da produção, Costa destaca que o produtor precisa ter em mente a remuneração necessária para que as dívidas sejam pagas. Lembrou que, na última safra, muitos sojicultores deixaram de vender a safra no momento de melhor preço. "Produtores contraíram empréstimo para não vender. Além de pagar o juro, esse aumento não veio", destacou.

Segundo o economista-chefe do Sistema Farsul, Antônio da Luz, hoje os fatores que podem influenciar preços estão relacionados a questões climáticas, como a estiagem na Argentina e na Metade Sul do Rio Grande do Sul, além da expectativa com o que vai ocorrer com a segunda safra brasileira. "Este ano provavelmente vamos ter rentabilidade mais alta, mas por fator conjuntural muito específico: seca em algum lugar. E este não parece ser melhor caminho", ressaltou. O cenário não altera o quadro da rentabilidade a longo prazo. Projeções feitas pela própria Farsul e por outras instituições apontam que nos próximos dez anos o bushel da soja deve estar cotado entre 9 e 9,50 dólares, próximo ao patamar atual, com alguns picos em momentos pontuais. "Quando eu tenho uma tendência de preços estáveis, eu preciso voltar meu foco para os custos de produção", alertou. O que ocorre no Brasil, no entanto, é que os preços da maior parte dos insumos utilizados na lavoura estão acima dos valores pagos nos demais países do Mercosul.

Correio do Povo
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