Possível safra recorde de trigo eleva projeções de exportação do cereal

Possível safra recorde de trigo eleva projeções de exportação do cereal

Demanda internacional aquecida estimula investimento no mercado externo, mas estrutura para embarques preocupa

Patrícia Feiten

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Anunciada pela Emater/RS-Ascar na semana passada, a estimativa de plantio de 1,4 milhão de hectares de trigo – a maior área de cultivo desde 1980 – neste ano traz expectativas de aumento das exportações brasileiras do cereal, que estão em ritmo acelerado desde a safra de inverno passada. O embate entre Rússia e Ucrânia, que representam 30% das exportações globais de trigo, deve manter aquecida a demanda internacional pelo produto, estimulando os agricultores a mirar o mercado externo, avaliam fontes do setor.

De janeiro deste ano até a terceira semana de maio, os embarques de trigo já somam 2,47 milhões de toneladas, de acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Ministério da Economia. A Emater/RS-Ascar projeta que neste ano a safra gaúcha chegue a 3,9 milhões de toneladas, um crescimento de 12,53% frente à colheita de 2021.

Para o presidente da Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado (FecoAgro-RS), Paulo Pires, as altas cotações do trigo e a liquidez proporcionada pelas exportações são um incentivo para a ampliação das lavouras. “O custo de produção subiu 50% e, mesmo assim, o produtor vai aumentar em 16% a área, então ele vê viabilidade econômica nisso”, afirma Pires. A perspectiva de aumento dos embarques, porém, pode ser freada pelas limitações do Porto de Rio Grande, diz o agricultor. “Falta infraestrutura. Se tivermos de exportar 3 milhões, 3,2 milhões de toneladas em uma safra cheia de 4 milhões, teremos dificuldades”, avalia Pires.

O analista Élcio Bento, da consultoria Safras & Mercado, lembra que a quebra de safra em países produtores no ano passado favoreceu o trigo brasileiro, que se tornou uma alternativa de suprimento para nações da África, do Oriente Médio e do sudeste asiático. “Estamos num ano de preço muito elevado e, em muitos momentos, o trigo gaúcho ficou muito competitivo no mercado internacional. Não há nada que mude muito essa perspectiva para o próximo ano”, diz.

Nesse cenário de demanda aquecida, o Brasil também deve importar mais trigo. Bento observa que, ao contrário do verificado em outros estados produtores, que não são autossuficientes, os moinhos do Rio Grande do Sul não absorvem todo o trigo colhido no Estado. “O que aconteceu este ano é que se exportou mais do que o excedente. Os moinhos do RS vão ter de importar mais, porque demoraram a ir para o mercado e o trigo nacional acabou saindo”, explica o analista.

No ano passado, a indústria de moagem brasileira processou 12,6 milhões de toneladas de trigo e, desse volume, 6,2 milhões de toneladas vieram de fora do país. Segundo o presidente da Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo), Rubens Barbosa, a Argentina deve ser manter como o principal fornecedor externo para a indústria local, mas, diante do receio de que o país vizinho já esteja com os volumes destinados à exportação comprometidos, os moinhos deverão buscar mercados alternativos, como os Estados Unidos, o Canadá, o Paraguai e o Uruguai.

Até o momento, porém, Barbosa não vê risco de desabastecimento. “Agora, as indústrias estão fazendo as compras para julho, agosto, setembro. Está mais difícil de encontrar, porque o preço subiu e todo o mundo está disputando o trigo”, relata o empresário. Em meio à guerra no leste europeu, a suspensão das exportações de trigo pela Índia agravou a preocupação com a oferta. “É muito menos do que a Rússia produz, mas são 10 milhões de toneladas retiradas do mercado, é uma pressão de preço”, diz Barbosa.


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