Não é hora de procurar culpados. Dizem os culpados.

Não é hora de procurar culpados. Dizem os culpados.

O que me comove nesta enchente são as pessoas que perderam familiares, os desabrigados, os menos favorecidos financeiramente e o trabalho incansável dos voluntários

Hiltor Mombach

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Não é hora de procurar culpados. Dizem os culpados.
Logo do começo da enchente que devasta o Rio Grande do Sul cometi, em pensamento, uma frase ingênua, angelical, ao ver governos federal e estadual unidos para ajudar os gaúchos.
A frase é "não é hora de procurar culpados".
Como se uma coisa estivesse engatada na outra. Não estão. Uma coisa, a ajuda, é uma coisa; a busca pelos culpados, outra coisa.
A ficha caiu quando li uma reportagem dando conta de que a prefeitura de Porto Alegre não investiu um real sequer em prevenção a enchentes em 2023.
"A situação ocorre mesmo com o departamento que cuida da área tendo R$ 428,9 milhões em caixa. Os dados foram retirados do Portal da Transparência de Porto Alegre" diz o texto.
É mais do que possível, é muito provável, de que tanta água em tão curto espaço de tempo provocaria estragos com ou sem prevenção. Como é mais do que possível, é muito provável, de que com prevenção os estragos seriam minimizados. Como também não estaríamos contando tantos mortos.
São mais de 400 municípios atingidos. Os prefeitos destas cidades deveriam vir a publico prestar contas de quanto foi investido em presenção. Muitas destas cidades já viram catástrofes parecidas e não vai muito tempo.
"Formou-se em torno do Rio Grande do Sul um cinturão nacional de bons sentimentos. Mas o apagão de dados climáticos e as falhas na prevenção de desastres mostram que ainda falta aos gaúchos um gênero de primeira necessidade: a responsabilização dos culpados. As vítimas do dilúvio clamam pela solidariedade de um bom inquérito" escreve Josias de Souza no UOL.
Segue: "Há oito meses, em setembro do ano passado, o Ministério Público Federal instaurou um inquérito civil para apurar as responsabilidades de órgãos públicos. A investigação restringia-se às regiões da Serra e dos Vales gaúchos. Coisa de 30 municípios. No momento, com quase 90% das cidades gaúchas parcialmente submersas, diz-se agora que é hora de salvar vidas, não de buscar culpados. Tolice. Uma coisa não prescinde da outra".
Estamos um tanto acabrunhados em buscar os culpados e é compreensível: no momento a maior e único preocuçao é seguir salvando vidas e dando algum conforto, amparo, aos que perderam tudo. Porém, com escreve Josias de Souza, "uma coisa não prescinde da outra".
Nunca fui filiado a partido político. Tenho alguma aversão aos políticos. Toda vez que tento minimizar esta aversão, ela aumenta. Como agora, ao ler um texto de Caio Junqueira na CNN Brasil:
"Foram poucas horas de diferença hoje entre o principal anúncio até agora de Eduardo Leite e mais um anúncio de Lula para o combate aos efeitos das enchentes no RS.
Tem sido assim desde que a tragédia que assola o estado começou. Se Lula anuncia algo, Leite também anuncia. Se Leite anuncia algo, Lula também anuncia.
Dada a extrema gravidade em que se encontra o povo gaúcho, é óbvio que as ofertas de quem quer que seja são muito necessárias e muito bem-vindas. Isso não se discute.
Mas é possível discutir, sim, até que ponto elas são respostas que se esperam do poder público diante de uma crise sem precedentes e até que ponto são o contrário: ações político-eleitorais repletas de marketing.
Dadas as características dos principais players atuando na crise, essa segunda alternativa é mais provável."
Os políticos nunca me comoveram. O que me comove nesta enchente são as pessoas que perderam familiares, os desabrigados, os menos favorecidos financeiramente e o trabalho incansável dos voluntários. Estes podem não buscar os culpados agora. Porém, mais dia menos dia, a conta chegará.


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