Abandono afetivo: o novo fenômeno demográfico

Abandono afetivo: o novo fenômeno demográfico

O envelhecimento da população é um novo processo demográfico que traz consigo desafios sociais, econômicos e jurídicos

Guilherme Sperafico

advogada Rafaela Rojas Barros

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O envelhecimento da população é um novo processo demográfico que traz consigo desafios sociais, econômicos e jurídicos que culminam em questões como o aumento dos casos de abandono de pessoas idosas. Estas percepções são observadas pela advogada gaúcha Rafaela Rojas Barros em seu livro “Abandono Afetivo da Pessoa Idosa e Exclusão da Herança”. A publicação é fruto da pesquisa de mestrado da autora, que esclarece o entendimento jurídico sobre o abandono afetivo, especialmente no contexto da quebra do dever constitucional de amparo como motivo para deserdação. Rafaela é mestre em Direito Privado e especialista no campo da família e sucessões. Também é membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família - Comissão Família e Empresa e sócia do escritório Clóvis Barros Advogados.

Pode nos contar quem é Rafaela Rojas Barros?

Me formei em Direito na PUCRS em 2014 e mergulhei na área da família, mas minha história com esse mais sensível ramo do Direito, o Direito de Família, iniciou bem antes da minha graduação na faculdade. Nasceu quando, ainda menina, eu escutava histórias de família, contadas nos almoços de domingo pelo meu avô, Adalberto Libório Barros, que foi desembargador aqui no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, e pelo meu pai, advogado nessa área por cerca de 40 anos. Então, nasceu de perceber a preocupação e a responsabilidade do meu pai no cotidiano de seu trabalho e, mesmo na infância, de ouvir as conversas em roda de seus amigos (hoje, meus também), alguns integrantes do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM). Pessoas que eu admiro até hoje, sempre em um clima de união e de propósito de auxiliar, de proteger e de acolher com afeto.

É nesta área que a senhora é mais atuante?

Esse ano, minha atuação como advogada familiarista completa uma década. Eu me formei em 2014 e passei a trabalhar no escritório familiar – sob todos os aspectos –, Clóvis Barros Advogados, que conta hoje mais de 35 anos de atuação em Família e Sucessões no Estado. Assim que me formei, fiz especialização na área e, desde lá, me lancei aos desafios da academia e da profissão. Intensifiquei meu interesse na área, escrevendo artigos científicos ou marcando presença nos principais eventos da área. Daí, passei a ser convidada para palestrar em faculdades, congressos, no Iargs (Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul), bem como a participar assiduamente dos grupos de estudos e de pesquisa e a coordenar e moderar grupos em faculdades e na própria OAB/RS. No último ano, entreguei a minha dissertação de mestrado na FMP (Fundação Escola Superior do Ministério Público), que redundou na edição do trabalho.

O que é a área do Direito de Família e Sucessões?

A família é a primeira referência de todo e qualquer ser humano. Atualmente, podemos dizer que a família é plural e está em constante e substancial evolução. O conceito do que vem a ser família é cada vez mais aberto, agregando pessoas que estão intimamente conectadas pelo casamento, parentesco, afinidade e, precipuamente, pelo afeto.

Quais foram suas motivações para se especializar nesta área do Direito?

O Direito de Família que me escolheu. Desde muito nova, escuto, respiro e vivencio o Direito de Família. Então essa escolha foi natural.

Como surgiu a obra “Abandono Afetivo da Pessoa Idosa e Exclusão da Herança”?

Historicamente, a pessoa idosa foi objeto de discriminação e mesmo desprezo social. E, no contexto familiar, esse tratamento se apresenta ainda com mais intensidade, justamente por ser o local onde os sentimentos estão em ebulição. Pude constatar isso no dia a dia do escritório, através de alguns casos, mas de um, em especial, que me sensibilizou. Creio que a sociedade tem de estar – e essa foi uma das razões de escrita desse tema – preparada para as consequências do súbito aumento na expectativa de vida e, consequentemente, dentro desse cenário líquido e de cada vez mais relações efêmeras, desses novos casos de abandono que surgem e crescem dentro das famílias. O processo de envelhecimento no país está umbilicalmente ligado ao aumento do número de casos de abandono que, na maioria das vezes, ocorrem dentro do próprio seio familiar e acabam sendo uma realidade invisível. A falta de autonomia da pessoa idosa, no que toca ao patrimônio que amealhou, nessa quadra da existência, não pode mais ser ignorada. Especialmente em casos que o filho, neto ou outro sucessor aja de modo socialmente reprovável e merecedor de devida sanção/responsabilização.

A senhora entende que o envelhecimento da população se reflete no aumento dos casos de abandono da pessoa idosa?

Sem dúvidas. O envelhecimento demográfico, o distanciamento das relações afetivas e familiares e até mesmo uma “narcisização” das pessoas, talvez excessivamente estimulada pelo descontrole das próprias redes sociais.

Por que acha que chegamos, enquanto sociedade, a esta situação atual?

Infelizmente, vivemos em uma época de agravamento desses tipos de comportamento, de desamor e de disseminação de desrespeito, mesmo aos membros da própria família. Acredito que os casos de negligência, abandono e pressões indignas não são novos. Isso acontece há muito tempo, sendo inclusive problema tratado por Honoré de Balzac há quase 200 anos, na obra “A Interdição”. A pessoa idosa tem um histórico de tratamento discriminatório e, no campo sucessório, por exemplo, ela segue desprotegida/tolhida em sua autodeterminação e expressão de vontade.

Há necessidade de leis específicas para proteger os direitos das pessoas idosas?

Sim. Tanto no Código Civil, quanto no Estatuto da Pessoa Idosa.

Teu livro possui edição limitada. Como pode ser adquirido?

Pode ser comprado diretamente pelo site da editora.


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