As regras do jogo. Nos tempos do micuim, das rosetas e de uma felicidade absurda. Imperdível!

As regras do jogo. Nos tempos do micuim, das rosetas e de uma felicidade absurda. Imperdível!

O título remete a um mergulho na infância lá no bairro Petrópolis, entre as décadas de 50 e 60 do século passado

Hiltor Mombach

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Por Flávio Dutra
O título remete a um mergulho na infância lá no bairro Petrópolis, entre as décadas de 50 e 60 do século passado. Na confluência das ruas Montenegro e Bagé existia o que chamávamos de terreno baldio, uma nesga de terra que parecia vagamente com um triângulo escaleno, se lembro bem as aulas de trigonometria, ou seja, com todos os lados desiguais. O terreno tinha ainda um pequeno declive dos fundos em direção às ruas. Era o Triângulo, um campinho de peladas.
Não havia marcação no campinho, as goleiras eram demarcadas com tijolos ou tocos de madeira e a bola de borracha circulava tanto pelo areão como pelo lado de grama irregular e repleto de guanxumas. Mesmo assim, o Triângulo era a nossa grande arena esportiva, o Maracanã de um bando de garotos de 10, 12 anos, por aí, que morava nas vizinhanças. Ali éramos Messi e Neymar, Suárez e Alan Patrick, de pés descalços, ou para ser fiel àquele período, éramos Pelés, Garrinchas, Vavás, Nilton Santos, os campeões mundiais que tanto nos orgulhavam.
Pelo que sei, nenhum de nós virou craque, mas ficou uma lembrança gostosa que não se apaga. Uma lembrança que foi avivada por um parceiro de então, o Romano Bottin, hoje um bem sucedido engenheiro e empreendedor (o filho do seu Bottini, dono do armazém de secos e molhados nas ruas João Abott com Carazinho) que, juntamente com o primo Sérgio dava suas bicancas no Triângulo. Pois, o Romano resgatou no Facebook, de autor desconhecido, As Regras do Campinho de Futebol, que tomo a liberdade de reproduzir como um tributo a todos os que, nos triângulos da vida, se sonharam craques, e desfrutavam de uma felicidade conquistada com tão pouco — um terreno baldio, uma bola de borracha e a energia inesgotável dos meninos sonhadores.
Um timaço de craques lança em 30 de abril, terça-feira, a partir das 18h, o livro 'Viva a Várzea'. Onde? No Chalé da Praça 15 (Largo Glênio Peres, Centro Histórico).
Os textos são de Cláudio Furtado, Fernando Becker, Flávio Dutra, João Bosco Vaz, José Evaristo Villa Lobos, Júlio Sortica, Leo Iolovitch e Liliane Correa. São coautores Mário Coso, Márcio Pinheiro, Marino Boeira, Óscar Fuchs, Paulo César Teixeira, Piero D'Alascio, Ricardo Stefanelli, Sérgio Kaminski e Vitor Bley de Moraes.
Lendo “As regras do jogo” fui remetido ao passado, das peladas no campinho dos Piva, em Garibaldi. Jogávamos com noite fechada. A bola era vermelha. Ninguém via nada. Duas pedras serviam para delimitar a goleira. Rolar na grama, quando havia, era ser infernizado pelo micuim. Que jantar para os mosquitos! E as rosetas para quem não tinha um par de guides! E a felicidade absurda em saber que no dia seguinte tinha mais.

AS REGRAS DO JOGO
.• Os dois melhores não podem estar no mesmo lado. Logo, eles tiram par ou ímpar e escolhem os times.

• Ser escolhido por último é uma grande humilhação.

• Um time joga sem camisa.

• O pior de cada time vira goleiro, a não ser que tenha alguém que goste de catar.

• Se ninguém aceita ser goleiro, adota-se um rodízio: cada um cata até sofrer um gol.

• Quando tem um pênalti, sai o goleiro ruim e entra um bom só pra tentar pegar a cobrança.

• Os piores de cada lado ficam na zaga.

• O dono da bola joga no time do melhor jogador.

• Não tem juiz.

• As faltas são marcadas no grito: se você foi atingido, grite como se tivesse quebrado uma perna.

• Se você está no lance e a bola sai pela lateral, grite “nossa” e pegue a bola o mais rápido possível para fazer a cobrança (essa regra também se aplica a “escanteio”).

• Lesões como destroncar o dedão do pé, ralar o joelho, sangrar o nariz e outras são normais.

• Quem chuta a bola pra longe tem que buscar.

• Lances polêmicos são resolvidos no grito ou, se for o caso, no tapa.

• A partida acaba quando todos estão cansados, quando anoitece, ou quando a mãe do dono da bola manda ele ir pra casa.

• Mesmo que esteja 15 x 0, a partida acaba com quem faz, ganha.


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