Litoral Norte comemora boa temporada

Litoral Norte comemora boa temporada

Circulação maior de turistas movimentou os setores hoteleiros, de bares e restaurantes, comércios e serviços nestes últimos meses

Aluguéis de casas, imobiliárias e hotéis no litoral gaúcho

Por
Cristiano Abreu

É uma temporada que agrada. E a constatação vem de representantes de diferentes setores da economia gaúcha, presentes no litoral norte do Rio Grande do Sul. Do quiosque à beira-mar ao hotel de luxo, a percepção é de uma retomada a patamares de anos anteriores, deixando para trás os fantasmas da pandemia e da inflação. Os hotéis localizados na região já encaminham o fim da alta temporada e os levantamentos preliminares indicam que a circulação de turistas ficou acima do projetado. A taxa de ocupação se manteve superior a 60% entre os meses de dezembro de 2023 a fevereiro de 2024, indicando a volta dos turistas às principais praias gaúchas.

De acordo com o Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares da região, a taxa de ocupação média ficou muito próxima de 100% nos fins de semana e na casa dos 60% entre segunda e quinta-feira. Tal ocupação é ligeiramente maior que a verificada na temporada passada, aponta a presidente da entidade, Ivone Ferraz. “Ficou na expectativa, tivemos um janeiro com muita chuva. O mês de fevereiro, aí sim, a ocupação média em meio de semana em torno de 60 a 70% e fim de semana sempre perto de 100%.”

Entre hotéis e pousadas, a região conta com 22 mil leitos considerados formais. E as praias de Torres, Capão da Canoa e Tramandaí novamente registraram a maior procura dos gaúchos para a temporada. As diárias para o período variaram de R$ 250 a R$ 1,5 mil. Ainda na avaliação da representante do Sindicato, o setor investiu mais para este verão, o que representou uma retomada com mais força, recuperando espaço perdido ainda por conta da pandemia de coronavírus. A volta dos estrangeiros ao Rio Grande do Sul, principalmente dos turistas argentinos, puxou esta mudança. “É uma recuperação gradual que ainda está ocorrendo. Os estabelecimentos investiram em reformas, contratações e em qualificação de pessoal para estarem preparados”, reforça a presidente.

Para o coordenador de Marketing do Hotel Araçá, localizado em Capão da Canoa e um dos maiores do litoral Norte, a temporada que se encerra foi a melhor dos últimos anos. Rafael Loredo confirma a avaliação da associação que representa o setor e revela que a ocupação média permaneceu sempre próxima de 100% entre dezembro e fevereiro nos fins de semana. “Ficamos sempre acima de 50% nos dias de semana e praticamente lotados em sábados e domingos. Podemos dizer que o objetivo para este verão foi alcançado, depois de um período mais complicado”, conta Rafael, fazendo referência às temporadas anteriores.

O coordenador ressalta que o hotel investe em iniciativas para atrair hóspedes, mas que também trabalha na retenção deles, mirando o retorno. “A gestão investe em mídia, divulga o hotel na Internet e em outros veículos tradicionais, busca meios de fazer com que o hóspede amplie seu tempo de permanência, mas estamos sempre buscando a avaliação do cliente para entendermos como melhorar. Com uma experiência satisfatória, o hóspede retorna.”

O Araçá trabalha agora para aumentar a ocupação durante a baixa temporada. Para tanto, investe na criação de um calendário de eventos e planeja ofertar atrações fixas durante os 12 meses do ano – o chamado turismo de eventos. “Temos um hotel para o ano todo, neste ano, implantamos o passeio com a jardineira e temos ainda o day use, que abre as portas do hotel a visitantes que desejam passar o dia desfrutando da nossa estrutura, como restaurante, piscinas, bar e áreas de recreação e lazer. Nosso intuito agora é criar um calendário, fechar parcerias com produtoras de eventos e municípios da região para que tenhamos atrações mensais. O Litoral é cheio de belezas e possibilidades que queremos ampliar e oferecer”, completa Rafael.

Setor imobiliário registra bons resultados

Aluguéis de casas, imobiliárias e hotéis no litoral gaúcho | Foto: Mauro Schaefer / CP Memória

O setor de aluguéis de temporada no Litoral Norte também contabiliza bons indicadores. O mesmo ocorre com as reservas de quartos e imóveis por meio de sites especializados. E além da rotatividade habitual, muitos veranistas esticaram a permanência nas praias. A locação de temporada permanece o carro-chefe das imobiliárias, conforme o presidente da Associação das Imobiliárias e Corretores de Imóveis de Tramandaí e Imbé (Aiciti). “Sempre tem alta procura, com 100% de ocupação entre Natal e Ano-Novo”, conta Marcelo Callegaro.

O especialista no setor ainda revela uma mudança de preferência dos locatários. “Após a pandemia, cresceu a busca por casas com piscina, mas neste verão percebemos uma procura maior por apartamentos”, conta, indicando que o turista voltou a frequentar a beira-mar. A mesma opinião tem a presidente do Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Litoral Norte, Ivone Ferraz. “As pessoas estão atrás de apartamentos mais amplos, com espaço para famílias. Temos a impressão de que as pessoas querem ficar mais tempo e unidas”, ressaltou a presidente.

Callegaro lembrou também que Natal e Ano-Novo, que caíram em segundas-feiras, e o feriado de Navegantes proporcionaram três fins de semana prolongados aos visitantes, o que puxou para cima o movimento. “A temporada iniciou no pico máximo, mas Natal e Réveillon formam além do normal, parte do pessoal esticou a permanência de uma semana para outra, muitas empresas fizeram férias coletivas”, assinala.

O representante do setor também utiliza dados do comércio para demonstrar que mais pessoas estiveram no Litoral Norte nesta temporada. “É claro que a gente, na Covid-19, viveu momentos difíceis, mas a partir do ano passado temos lotação máxima. Neste ano faltou produto na cidade, porque era muita gente em todo Litoral Norte”, afirma, destacando que as praias recordistas de locações foram Tramandaí, Imbé, Capão da Canoa, Xangri-Lá e Torres.

Veranistas permaneceram mais tempo

De acordo com o Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes do Litoral Norte do Rio Grande do Sul, os períodos de permanência dos veranistas foram mais extensos neste verão, entre sete e 10 dias. Tal mudança de comportamento teria favorecido os comerciantes. “Em anos anteriores, era comum pessoas chegando nas sextas-feiras e retornando aos domingos. Neste verão, vimos um fluxo diferente”, afirma a presidente da entidade, Ivone Ferraz. Para a dirigente, desta forma, os recursos financeiros que não foram para fora do Estado migraram para as praias gaúchas.

E quem está na ponta desta cadeia econômica confirma. “Depois de pandemia, depois de tanta crise econômica, as pessoas finalmente voltaram pra praia”, celebra Joice Cavalheiro, que espera movimento em seu quiosque pelo menos até a segunda quinzena de março.

No quiosque, no hotel ou pelas ruas, a língua espanhola se fez presente, o que também ajuda a explicar esta virada econômica. Turistas paraguaios, argentinos e uruguaios retornaram ao litoral gaúcho. Dona de um restaurante em Tramandaí, Regina Santos Oliveira se diz contente com a boa frequência dos visitantes estrangeiros. “Famílias inteiras chegaram a fazer duas refeições por dia no meu restaurante. O que notei é que antes passavam por Tramandaí rumo a Santa Catarina, mas neste ano ficaram mais tempo, mesmo os que seguiram viagem”, acredita a comerciante.

Em Capão da Canoa, a dona de uma lancheria no centro da cidade até contratou garçons fluentes em espanhol para melhor atender aos visitantes. “Mais que acolher nossos clientes, os outros funcionários também são estimulados, o pessoal se esforça e atende ainda melhor”, acrescenta Solange Santos.

Levantamento da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS), publicado no início da temporada, já indicava as impressões trazidas agora pelos empresários. Os gaúchos optaram, nestas férias, por viajar para o litoral norte do RS, indo menos a Santa Catarina, e além de permanecer mais tempo, em média 10 dias, estavam dispostos a gastar mais do que no verão passado. “O gasto médio ficou entre R$ 1 mil e R$ 3 mil, o que beneficiou principalmente os setores de varejo e de serviços”, aponta a economista-chefe da Fecomércio RS, Patrícia Palermo.

A especialista destaca também o que considera uma boa rotatividade de veranistas, favorecendo sobretudo o comércio. “Este perfil sempre é interessante, pois o visitante que fica cinco dias, por exemplo, na maior parte das vezes, janta fora de três a cinco vezes, diferente do morador ou do veranista fixo, sem falar que geram ocupação maior de hotéis e aluguéis”, exemplifica.

A recuperação econômica do país também contribuiu, na visão da especialista. “Foi um verão sem os fantasmas da pandemia, da inflação e do temor derivado do cenário eleitoral, diferente do anterior. Vivemos um período com juros menores, alívio no endividamento e queda na taxa de desemprego, que certamente faz diferença”, define Patrícia Palermo.

Recuperação após anos difíceis

Os últimos anos não foram fáceis para o quiosque Ipanema, da família Cavalheiro, na praia de Capão da Canoa. Joice Cavalheiro (foto abaixo), a proprietária, relata que, após a queda no movimento em verões anteriores por conta da pandemia de coronavírus, nesta temporada, as vendas ocorrem em bom volume desde o início do ano.

“Na virada do ano foi pior que no ano passado, mas o verão em si foi melhor que o outro. Choveu, mas o mar estava mais bonito, tinha mais pessoas na praia, e mais dispostas a consumir”, entende a comerciante com 12 temporadas de experiência com os clientes que vêm ao Litoral Norte.

O fim de semana passado foi o último do ambulante Rodrigo Conceição Oliveira na beira-mar nesta temporada. Vendendo picolés há 8 anos em Torres, ele diz que foi um verão com bom número de clientes. “Depois do Carnaval deu aquela caída nas vendas, mas não dá para reclamar, o movimento foi bom desde o fim de novembro”, justificou.

E para garantir mais compradores, o vendedor de 36 anos conduz o carrinho acionando uma buzina colorida e faz paródias de músicas famosas para despertar o interesse dos banhistas. “Tento inovar para me destacar em meio aos outros”, revela Rodrigo.

Mais investimentos para atrair visitantes

De Torres a Balneário Pinhal, as praias gaúchas investiram em infraestrutura para receber os visitantes e atender às demandas dos moradores. De acordo com a Associação dos Municípios do Litoral Norte (Amlinorte), entre os meses de dezembro e março, a população do litoral norte gaúcho, que é de 420 mil pessoas (segundo o IBGE), salta para cerca de 2 milhões. E as 23 cidades que compõem a entidade trabalharam de forma conjunta para aproveitar os benefícios econômicos desta migração em direção ao mar.

Mobilidade urbana, saúde, segurança pública e serviços essenciais como energia elétrica, água e saneamento foram as demandas priorizadas. Investimentos em conservação das ruas, acessos à beira-mar e a qualificação dos espaços públicos de convivência tornam a cidade mais agradável à população e atraem investimentos, diz o presidente da Amlinorte, João Marcos Bassani dos Santos, que entende que investimentos em pavimentação e em drenagem pluvial geram mobilidade e fazem uma cidade mais organizada. Para ele, a oferta de eventos também atrai visitantes.

“A expectativa de público foi confirmada, considerando a retenção dos anos anteriores em razão da pandemia de Covid-19. O saldo é positivo para a maioria dos municípios, apesar da situação climática provocada pelo El Niño no início do verão. Ainda houve algumas preocupações com a Covid-19, com alguns municípios registrando casos isolados, porém, bem controlados pelas equipes de saúde”, afirma.

Neste verão, Balneário Pinhal apostou em infraestrutura e em atividades culturais e de lazer. O município investiu na revitalização dos acessos à beira-mar, construiu um calçadão em Magistério e inaugurou a primeira rua coberta do Litoral. No último fim de semana, celebrou a 15ª edição do Rodeio Interestadual, que reuniu aproximadamente 10 mil pessoas no parque de eventos do Túnel Verde. O retorno é considerado positivo.

“Registrou-se um aumento no número de visitantes. Em 2023 os turistas estavam ansiosos em aproveitar o litoral, vindos de um longo período de isolamento causado pela pandemia, e neste ano eles já estavam preparados para o verão”, considera a secretária da Indústria, Comércio, Agricultura, Pesca e Turismo, Veridiana Abrão. Conforme a secretária, uma extensa programação artística, cultural e esportiva foi planejada para receber os veranistas. Neste Carnaval, cerca de 30 mil pessoas festejaram no município, 10 mil a mais que em 2023. “De acordo com nossa avaliação, da Brigada Militar e dos guarda-vidas, houve aumento no número de visitantes durante toda a temporada”, destaca Veridiana.

A Amlinorte já trabalha melhorias visando o próximo verão. João Marcos Bassani dos Santos, que é prefeito de Maquiné e assumiu a entidade no início deste ano, adianta que a associação quer debater com o governo do Estado o reforço das equipes de saúde e segurança devido ao aumento constante de população nas praias. “Os orçamentos dos municípios estão cada vez mais enxutos, frente às despesas geradas pelo aumento de população, não só durante a temporada, mas a que ocupa de forma permanente a região. Com o aumento de público nas praias gaúchas, necessitamos de mais efetivo de segurança, além de recursos diante das demandas sociais e de infraestrutura”, destaca o presidente.

Para o representante dos prefeitos, é preciso mudar a concepção de que as praias do Litoral Norte são frequentadas somente na alta temporada. Santos defende que o Litoral Norte precisa ser olhado pelo governo do Estado e pela sociedade como uma região economicamente ativa durante o ano inteiro.

É cada vez mais comum que Balneário Pinhal e outras praias da região invistam em um calendário de eventos que se estende durante a baixa temporada, com foco no fomento à economia local. E é um caminho acertado, na visão da Fecomércio RS. “As propostas de cada praia variam, umas mais turísticas, outras voltadas para eventos, com público jovem e outras com veranistas de mais idade, o que abre muitas possibilidades do pequeno ao grande negócio”, analisa a economista da entidade, Patrícia Palermo, que complementa: “Entender o perfil de cada público aumenta a chance de sucesso”.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895