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Verão

Especial

"Voz de uma paisagem em coalizão constante"



João Pedro Wapler lança seu primeiro livro de poemas nesta quarta, às 19h, na Palavraria Livraria e Café.

Por Luiz Gonzaga Lopes

O lançamento do primeiro livro de um poeta é semelhante ao de um foguete ou uma nave espacial, como queiram, com a grande diferença que as agências espaciais precisam de 100% de certeza dos motores, propulsores, combustível e toda esta parafernália que permite a viagem espacial. Na poesia o voo é cego. O poeta, que é um fingidor, precisa ter uma voz concreta e ter a mínima noção da vida, da métrica, da teoria e do que ele está fazendo com seus versos, sejam livres ou não. Estou simplificando, enrolando talvez para apresentar "Translúcido" (Letra 1), o primeiro livro de poemas de João Pedro Wapler, que será lançado nesta quarta-feira, dia 15 de outubro, às 19h, na Palavraria Livraria e Café (Vasco da Gama, 165), em Porto Alegre.

Sempre que lembro de poesia me vem à cabeça o nome de Saint-John Perse, poeta francês nascido em Guadalupe em 1887, e que foi Nobel de Literatura em 1960. As imagens, metáforas e vivências em versos de Perse dispensam comentários, resumem e inebriam: "Enquanto isto a sabedoria do dia toma a forma de uma bela árvore /  e a árvore balançada / que perde uma porção de pássaros / nas lagunas do céu escama um verde tão belo que nada existe mais verde do que o percevejo de água". Pois ao ler João Pedro reconheço o poeta, o artesão das letras com o formão da transignificação da palavra.

Antes de traçar algumas considerações minhas, cedo a vez recolhendo algumas palavras da apresentação do poeta e editor Ronald Augusto para dar forma a este laivo de translucidez poética de Wapler: "O breve, porém grande livro, Translúcido, carrega em seu centro aqueles traços que a visão poundiana identifica como essenciais à boa poesia: concentração e linguagem carregada de significado. A qualidade do ambíguo, que este livro atualiza de modo preciso, cobra amorosamente do leitor uma participação colaborativa (...). A brevidade que João Pedro Wapler alcança realizar em Translúcido tem menos relação com o mínimo ou o pouco, do que com a condensação e a destilação. Por meio desse verdadeiro estilicídio imagético, o poeta extrai da substância movente e insubordinada da fala coloquial objetos de linguagem que se bastam a si mesmos (...). (...) a poesia de João Pedro Wapler põe em causa tanto os limites e as virtudes do gênero, como metaforiza lances de corrosão à moral social circundante."

Ao final da leitura de "Translúcido" me deparo com o contentamento de leitor de poesia pela agilidade do ritmo, a divisão dos poemas metricamente nas quatro sílabas do título da obra. O primeiro conjunto de versos é "Trans". É ali que está contido um dos mais belos versos que dá título a esta matéria: "sou apenas a voz de uma paisagem em coalizão constante". A segunda parte é a que eu menos gosto, mas ainda é capaz de nos remeter a algo transubtanciado do simbolista francês: "verlaines em mandarim / ressoados no aparelho / de vinil cerebral".

Em "Ci" está o grande mérito de Wapler que se mostra um excelente narrador, no sentido mais prosaicamente poético existente. Em seis pequenos capítulos, numerados à moda romana de I a VI, que exala saudade utilizando a fusão e a mudanças dos tempos verbais para nos dar uma história de afeto, de lembranças, a reflexão sobre o poeta ("escrevia para abafar a astúcia de ser humano pela metade. / o poeta é, antes de tudo, um fraco, ecoava, acordava com alma mirrada, dormia com corações incinerados, jogava dardos no asfalto, sem alvo...) e novamente o afeto, a amizade o amor, encerrando o conjunto de poemas em prosa ou verso livre com a pergunta afirmativa: "o amor só pode ser mesmo um artifício a ser bordado em pleno desespero?".

Em "Do", novamente as formas quase haikais, métrica diminuta e imagens fragmentadas de um discurso (des)amoroso: "sem não viver / quero a sua chama em minha / camiseta"(...) "abstraio essa paz / absoluta que sinto / quando penso não querer / pertencer a alguma parte / absoluta / de você", finalizando com estas duas estrofes, que também assinalam o fim da minha pequena análise, resoluto de que encontrei em Wapler um poeta com quem posso conversar num café e ver a translucidez das palavras, afetos, vozes e poética bem construída, erigida sobre um conhecer, sobre alguém que preparou muito bem os motores, os propulsores do lançamento de sua nave para o espaço dos leitores:

 

e sigo meu coração


até onde for urgente


até


onde o amor


fizer do meu corpo


sincero


 


contra parede


dos cinco sentidos


meu amor é dito


para não ser repetido