Entre as muitas consequências provocadas pela pandemia do novo coronavírus, os estragos no sistema produtivo brasileiro parecem ser irrecuperáveis. Somente na primeira quinzena de junho, a Pesquisa Pulso Empresa: Impacto da Covid-19 nas Empresas, que integram as Estatísticas Experimentais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) identificou o fechamento de 39,4% das 1,3 milhão de empresas que haviam suspendido temporária ou definitivamente suas operações. No Rio Grande do Sul os indicadores também não são muito animadores. A Sondagem de Segmentos para Vestuário, da Fecomércio-RS apontou que quatro em cada 10 lojas de roupas perderam mais de metade de sua receita e foram obrigadas a demitir funcionários. Já um levantamento feito pela Endeavor Brasil e Resultados Digitais mostrou que das micro, pequenas e médias empresas do estado, 76,8% registraram perda de receita no mesmo período. Na causa de tudo isso, a falta de recursos.
E uma das saídas pode estar em recursos vindos de instituições financeiras com sede ou administração em solo gaúcho. No Badesul, por exemplo, pela primeira vez o financiamento para capital de giro entrou na pauta de empréstimos disponibilizados pelo banco de fomento, que encerrou o ano de 2019 com um lucro de R$ 27 milhões. A presidente do banco, Jeanette Lontra, revela que são quase R$ 500 milhões para capitalização em diversas linhas de financiamento, estaduais e federais. “Revisamos nosso planejamento para 2020 e adotamos o congelamento de dívidas decorrentes de contratos por um período de seis meses”, diz a dirigente.
Mas o financiamento para projetos de inovação também faz parte das linhas de crédito da instituição. Conforme a dirigente, trabalhar com o ecossistema de tecnologia foi um processo que se acelerou durante a pandemia. Tanto que a plataforma de crowdfunding Captable, desenvolvida com o apoio do Pacto Alegre, do LAB de Inovação Financeira do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), da Comissão de Valores Mobiliários e da Associação Brasileira de Desenvolvimento, tem disponível R$ 4 milhões para projetos de startups gaúchas. “Estamos buscando projetos em áreas do agronegócio e na saúde que ofereçam inovação e tecnologia para a sociedade gaúcha. Estamos com R$ 43 milhões para o Pronampe e R$ 60 milhões para o Turismo, um dos setores mais atingidos com a pandemia”, comenta Jeanette Lontra.
Atrair projetos inovadores também faz parte das estratégias do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE). Terceira linha que mais demanda recursos dentro da instituição, a inovação tecnológica está entre as prioridades da instituição, em especial no agronegócio sustentável, juntamente com o turismo e o desenvolvimento nos municípios. Conforme o presidente do banco, Luiz Corrêa Noronha, a instituição encerrou 2019 com o melhor desempenho de sua história, inadimplência abaixo de 1% e R$ 280 milhões de lucro líquido. Isso resultado de uma diversificação operacional e de fontes de financiamento nacionais e internacionais. “Hoje nossos empréstimos estão 60% relacionados ao agronegócio, onde pretendemos crescer mais o volume de financiamentos”, diz Noronha.
Linha de crédito
Mas assim como outras instituições, linhas de crédito para capital de giro para empresas também passaram a estar presente nas operações disponibilizadas pelo BRDE. O banco trabalha com um volume de empréstimos de R$ 2 bilhões a serem liberados até o final de ano em novos empréstimos. Para enfrentar o período da pandemia beneficiando seus clientes, o BRDE concedeu sete meses de carência para empréstimos em carteira a partir de março, mesmo que em alguns casos os agentes financiadores não tenham concedido a mesma isenção. “Independentemente de estar consumindo parte do caixa da instituição, era uma decisão importante a ser tomada. Nossa expectativa é encerrar 2020 com um desempenho positivo de R$ 120 milhões de lucro líquido, com quase o dobro de operações. E esse número será uma vitória do primeiro semestre do ano”, diz Noronha.
O Banrisul prepara ainda para 2020 um modelo para abrigar startups que trabalhem para inovar e otimizar serviços do sistema financeiro, as chamadas fintechs. “Daqui para frente, o sistema financeiro vai investir muito no pagamento instantâneo. Somente no WhatsApp são mais de 120 milhões de usuários ativos no Brasil. Na China, 30% das transações são feitas pelo WeChat”, comenta o diretor de Tecnologia da Informação e Inovação do banco, Jorge Krug, referindo-se ao apliacativo similar ao WhatsApp. Conforme o dirigente, o sistema PIX que será lançado pelo Banco Central no começo de outubro deste ano vai revolucionar a forma como fazemos operações financeiras, onde as transferências, por exemplo, vão demorar menos de 10 segundos. Tudo isso associado ao Open Banking e as regras impostas pela LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados que vão mudar o mundo das transações. “É um momento muito expressivo para as fintechs que oferecerem serviços de acesso para os clientes. A partir de 2021, teremos uma série de complementos de segurança para garantir essas transações e evitar ataques cibernéticos”, comenta Krug.
No cenário de benefícios empresariais, o Banrisul aderiu recentemente ao Pronampe, uma nova linha de crédito para microempreendedores individuais (MEIs), micro e pequenas empresas com faturamento de até R$ 4,8 milhões em 2019, prazo de 36 meses para pagamento, três meses de carência e juros de 1,25% ao ano mais Selic. A empresa que escolher essa modalidade de financiamento deverá manter o mesmo número de funcionários ou superior ao registrado em 18 de maio por um período de 60 dias após a liberação dos recursos.
Já o sistema cooperativo, presente em 93% dos municípios gaúchos, sairá fortalecido no pós crise, com um crescimento de mais de 30% na captação de depósitos verificado pelo Sicredi. Com mais de 4,5 milhões de associados, a instituição cooperativa decidiu apoiar a economia e o comércio locais lançando o aplicativo Conecta e o movimento “Eu Coopero com a Economia Local”, que também oferece gerador de anúncios digitais, e-books e vídeos com dicas sobre comunicação, fluxo de caixa e atendimento entre outros temas, para apoiar empreendedores nos seus negócios durante a pandemia. “As operações digitais vieram para ficar e esse novo cenário vai transformar as relações entre as pessoas. Segundo dados do Sebrae, 41% das empresas do país nunca tinham feito vendas pela internet e o aplicativo Conecta veio para ajudá-las”, comenta o vice-presidente da Central Sicredi Sul/Sudeste, Márcio Port.
A transformação digital das cooperativas de crédito, que seguem os mesmos marcos legais e regulatórios cabíveis ao sistema financeiro brasileiro, teve início em 2016 e se estenderá até 2022. Nos planos para 2020 constavam a inauguração de 200 novas agências em todo o país, o que ficou prejudicado por conta de atrasos nas obras físicas e restrições por conta da pandemia. “Atualmente percebemos uma maior preocupação das pessoas com a poupança. Pessoas que até então não tinham aplicação financeira, têm mostrado que o hábito de poupar passou a estar presente, o que é muito positivo diante das incertezas que ainda temos pela frente”, comenta Port.
Correio do Povo