Os desdobramentos da pandemia do novo coronavírus em todo Brasil começam a ser sentidos também em outros setores da economia. Desde março, quando os primeiros casos da doença foram confirmados, o segmento do turismo perdeu R$ 87,79 bilhões, conforme estudo da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Dados da entidade apontam que o Rio Grande do Sul acumulou perdas de R$ 4,79 bilhões no setor, sendo o quarto estado com maior prejuízo por conta da Covid-19.
O estudo da CNC calculou as perdas mensais do setor desde o início pandemia em março. São Paulo lidera o ranking com perdas estimadas em R$ 31,77 bilhões, seguido de Minas Gerais (R$ 7,09 bilhões) e Rio de Janeiro (R$ 12,48 bilhões).
O economista Fabio Bentes, responsável pelo estudo da CNC, revela que o impacto do novo coronavírus tem potencial para eliminar 727,8 mil postos de trabalho no setor até junho em função das medidas de isolamento social. E destaca que essa projeção pode ser confirmada a partir de dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
Conforme Bentes, dos 21 setores da economia, o de alojamento e de alimentação - que envolve hotéis e restaurantes - foi o que mais "destruiu" postos de trabalho atingindo 11% da força de trabalho, ou seja, eliminou 211,7 mil postos formais de trabalho entre março e abril.
"Não tem na economia brasileira hoje quem esteja demitindo mais do que o setor de alojamento e alimentação. Justamente por conta dessa queda inimaginável há poucos meses atrás", observa. Ao garantir que o turismo de 'longe é o que mais sofre', Bentes afirma que o setor é o para-choque da crise econômica deflagrada pelo início da pandemia.
Crise
O economista observa que o cenário seria outro se não existisse a pandemia e o setor conseguiria se recuperar da crise enfrentada em 2015 e 2016, uma vez que as projeções apontavam para nível de volume de receitas semelhante ao de dezembro de 2014.
"Agora a gente desceu a ladeira de novo. E pior, para um ponto mais baixo ainda. A gente já pode dizer que é a maior crise do turismo não só no Brasil, mas no mundo. A indústria turística do mundo sofreu um baque esse ano sem precedentes, ninguém se salvou", justifica.
Para sair da crise, o economista sugere que o governo federal ofereça linhas de créditos 'mais audaciosas' para equilibrar fluxo de caixas das micro e pequenas empresas. Ele lembra que atualmente o setor está operando com menos de 10% da sua receita.
"Sem isso vai ser muito difícil a gente não ter uma quebradeira muito grande", alerta. Mesmo com flexibilização da quarentena, Bentes destaca que o setor deve ser um dos últimos a recuperar o fôlego, uma vez que a circulação da população está restrita. "Isso vai fazer com que esse setor seja um dos últimos infelizmente a se recuperar da recessão", afirma .
As dificuldades econômicas sem precedentes, Bentes aposta em crescimento nos próximos anos. Mas ressalta que é importante observar quando o setor vai recuperar o nível de receita de antes pandemia. "A economia vai crescer no ano que vem, provavelmente o turismo também, por conta do efeito estatístico. Como tomou um tombo enorme esse ano, a base de comparação é muito maior, então o crescimento acaba acontecendo", compara. Este ano, no entanto, as previsões para o mercado de trabalho são as piores possíveis.
Empregos
Em termos de emprego formal, Bentes destaca que o próprio governo federal admite a eliminação de 3 milhões de postos de trabalho. "Estamos falando de uma queda de 7% do mercado formal de trabalho, é muita gente. Infelizmente uma característica dessa crise é que ela vai reverberar por algum tempo, ela foi muito rápida, mas foi muito mais profunda do que foi a recessão de 2015 e 2016, que já não foi brincadeira", frisa. E destaca que antes da pandemia começar a gente o mercado de trabalho estava praticamente 'travado'.
Ao cobrar linhas de créditos para micro e pequenos empresários, uma vez que as medidas atuais "não estão surtindo efeito, são muito tímidas", Bentes explica que o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) vai oferecer R$ 16 bilhões de linha de crédito mais abrangente.
"Só que só o varejo perdeu R$ 200 bilhões até agora. Só o turismo perdeu R$ 88 bilhões, ou seja, a quantidade de recursos para salvar esses setores é muito tímida ainda", frisa. "O cenário para setor nos próximos meses é bastante sombrio mesmo, muito preocupante, não só por conta da queda de receitas mas pelo reflexo que isso vai ter no mercado de trabalho", completa.
Felipe Samuel