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Verão

Especial

Pais buscam por mais direitos de participar da vida dos filhos

No Estado, cresce número de solicitações para guarda compartilhada

Patrick propôs a guarda compartilhada quando o casamento com a mãe de Martina terminou, em 2013: "Quero curtir todos os momentos ao lado da minha filha" | Foto: Samuel Maciel
“Não quero ser um pai de selfie. Quero curtir todos os momentos ao lado da minha filha. É muito prazeroso poder aprender algo diferente com ela todos os dias. Tudo é novo para a gente e está sendo a melhor coisa do mundo”, abre o coração Patrick de Oliveira Bueno, de 32 anos, ao falar da pequena Martina, de seis. Como Patrick descreveu, faz o tipo de pai em “tempo integral”. É aquele que dá banho, faz tranças no cabelo, assiste a filmes infantis ao lado da filha, vai para a cozinha fazer a sopa e o espaguete preferidos dela. “Sempre fui eu quem deu banho, trocou fralda, fez dormir”, confessa.

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E, recentemente, esse novo perfil de pai tem ficado mais em evidência, o de pais que colaboram com o cuidado com o filho dentro de um casamento ou mesmo fora dele. Para alguns especialistas, os homens estão mais abertos - apesar de a sociedade ainda ter traços conservadores - para vivenciar abertamente essa experiência ao lado dos filhos e as mudanças na legislação favoreceram essa proximidade. Para outros, é uma compensação para uma possível ausência paterna no passado. Então, nada melhor do que refletir sobre o atual papel do pai que tem passado por grandes transformações e exerce uma função importante na formação do indivíduo.

A psicóloga e psicanalista Luciana Balestrin Redivo Drehmer, da Escola de Humanidades da PUC RS, reconhece que a sociedade contemporânea tem proposto diferentes formas e configurações nos vínculos afetivos e familiares, que trazem à tona novas formas de subjetivação. “Tem-se visto uma maior valorização do papel do pai na construção do vínculo afetivo com os filhos, desempenhando tarefas que representam a função materna, ou seja, eles se sentem confortáveis e interessados em alimentar, trocar fraldas e cantar uma canção enquanto embalam seus filhos”, avalia Luciana. Ao mesmo tempo, a psicóloga ressalta que os pais não devem só exercer funções ligadas à maternidade, mas ocupar o seu lugar de pai, como aquele que apresenta à criança novos formatos, leis e modos de relacionamento.

Divisão de tarefas

Protagonista na criação da filha, Patrick conseguiu esse papel após propor a guarda compartilhada quando o casamento terminou com mãe da Martina, em 2013. Sabendo que, historicamente, a Justiça determinava que os filhos ficassem sob a guarda materna, ele passou a estudar uma forma em que a responsabilidade fosse conjunta, igualitária.

Fez isso um ano antes de o Senado aprovar o projeto de lei que passou a dar preferência ao compartilhamento da guarda dos filhos, para garantir maior participação de pais divorciados no crescimento e desenvolvimento das crianças e adolescentes. Em dezembro de 2014, após a sanção presidencial, esse conceito passou a ser lei e ganhou prioridade nas audiências no Judiciário quando se define o futuro dos filhos após o fim do casamento.

Diferente do que muitos pensam, a guarda compartilhada não significa que a criança tenha que dividir o seu tempo entre as duas famílias – materna e paterna-, mas, sim, que os dois terão voz igual nas decisões envolvendo o filho, como, por exemplo, a escolha da escola ou um determinado tratamento de saúde. Claro que, como todas as relações humanas, a regra muitas vezes acaba se ajustando às condições e especificidades de vida de cada família. “O principal da guarda compartilhada é que reforçou a paternidade na vida dos filhos. A mudança está ocorrendo aos poucos. Na teoria, a lei é muito bonita e, na prática, ainda precisa avançar. Mesmo assim, abriu espaço para o pai ser, efetivamente, pai”, avalia a professora Letícia Ferrarini, ministrante de Direito de Família no IPA.

A advogada trabalha há mais de uma década com casos desta área e reconhece que tem crescido nos últimos anos o interesse do pai em aderir à guarda compartilhada. “Eles (os pais) querem ser protagonistas na vida dos filhos. E isso é saudável, para a evolução dos filhos, que terão o pai presente e não apenas em ocasiões pontuais”, enfatiza a professora.

Em uma visão mais crítica, a advogada especialista em Direito Familiar, Fabíola Fortes, destaca que o peso do final de uma relação pode complicar, e muito, a efetividade da guarda compartilhada. “Como atravessar essa etapa dolorosa (a separação) sem conjugar o duplo D: discutir e dividir? E quando entra o assunto filhos a situação fica ainda mais espinhosa”, explica Fabíola.

Ela lembra ainda que, na prática, a definição de guarda e regime de visitas acaba sendo permeada por sentimentos de perda e de posse. “É nesse momento que acho que esse modelo é utópico. A guarda compartilhada não divide o tempo do filho, mas as responsabilidades. Quando os pais têm uma relação adequada, é uma opção importante. Só que quando o ex-casal não dialoga, fica inviável. Vira uma disputa de poder e quem perde é a criança”, alerta.

Ela destaca que a postura do Tribunal de Justiça do RS ainda é pela guarda unilateral da mãe, sendo que a guarda compartilhada é construída e se efetiva quando há acordo entre os pais. “É preciso que seja analisado se há condições de ter esse diálogo entre os pais para que a criança não seja prejudicada”, explica. Neste conceito, está, por exemplo, a síndrome de alienação parental, quando um dos pais tenta prejudicar ou destruir os vínculos dos filhos com o outro genitor (pai ou mãe).

Nesta linha, Letícia Ferrarini reconhece os argumentos e, como justificativa, recupera o voto do ministro Paulo de Tarso Sanseverino sobre o assunto. “Esse fato, por si só, não justifica a supressão do direito de guarda de um dos genitores. Até porque, se assim fosse, a regra seria guarda unilateral, não a compartilhada. O bem-estar da criança deve ser prioridade”, sentencia.

No caso do pai Patrick, a definição do modelo de guarda compartilhada foi resultado de um acordo feito com a ex-mulher, sem o envolvimento da Justiça. No primeiro momento, cada um ficava um dia com a menina, porque moravam perto. Quando ele se mudou para mais longe, optou pela reorganização. Hoje em dia, Martina vive com o pai, de sexta a segunda-feira de manhã, em Estância Velha. Durante a semana, mora com a mãe e estuda em Novo Hamburgo.

Embora o casal tenha encontrado um denominador comum, uma das preocupações foram os conflitos criados pela diferença de posicionamentos. Para que Martina assimile bem a situação e compreenda o modelo “alternado” criado pelos pais, ela tem acompanhamento de uma psicóloga. “A orientação da psicóloga é que ela saiba definir qual é a casa do pai, qual a casa da mãe, até para que ela crie uma identidade”, explica.

Cíntia Marchi e Mauren Xavier