“No Peru, os três poderes do Estado funcionam de forma autônoma e é o Poder Judiciário que está conduzindo as investigações de eventuais delitos econômicos do ex-presidente e, por considerações estritamente jurídicas e legais (...), não concedemos o asilo político ao senhor Alan García”, disse Vázquez em coletiva de imprensa conjunta com o chanceler uruguaio, Rodolfo Nin Novoa. “Tinha que se dar uma resposta rápida.”
“No Peru ninguém tem uma coroa. Nossa democracia garante a independência de poderes e o devido processo”, tuitou em seguida o presidente peruano, Martín Vizcarra.
O chanceler uruguaio lembrou que García iniciou o trâmite de pedido de asilo com base na Convenção de Caracas de 1954, e leu um dos artigos deste tratado, no qual, reforçou, destaca-se que “não é lícito conceder asilo a pessoas que enquanto o solicitam se encontram acusadas ou processadas em tribunais competentes por crimes comuns”.
Processo envolve a Odebrecht
García, de 69 anos, pediu asilo na embaixada do Uruguai em 17 de novembro, depois que a justiça peruana proibiu sua saída do país por 18 meses, ampliando a investigação sobre supostas propinas pagas pela empreiteira brasileira Odebrecht para obter um contrato para construir uma linha do metrô de Lima em seu segundo mandato (2006-2011).
O ex-presidente é submetido a uma investigação preliminar da acusação, mas ainda não é réu. Ele está proibido de deixar o país, mas não possui mandado de prisão e fez o pedido de asilo alegando ser vítima de “perseguição política”.
O governo uruguaio considera que “não constitui perseguição política no caso de imputações relacionadas principalmente a fatos econômicos e administrativos durante suas duas gestões”. “Consequentemente, o embaixador do Uruguai foi instruído a convidar Alan García a se retirar de nossa representação diplomática”, acrescentou.
Segundo declaração lida por seu secretário particular após deixar a embaixada, García se colocou à disposição da Justiça de seu país. “Estarei em minha residência à disposição de todas as investigações e convocações que me forem feitas”, diz a declaração lida a jornalistas por seu secretário, Ricardo Pinedo.
Lei e tradição
Vázquez, em sua leitura, explicou que o Uruguai era obrigado por lei e tradição a conceder o refúgio político provisório a García até não ser definitivamente decidida a sua ação. O presidente mostrou o expediente de mais de mil páginas que lhe foi enviado pelas autoridades peruanas para argumentar contra a concessão de asilo a García.
O ex-presidente social-democrata peruano, que também governou entre 1985 e 1990, deixou a embaixada do Uruguai logo após tomar conhecimento da decisão, segundo o chanceler peruano, Néstor Popolizio, o que foi confirmado pelo embaixador uruguaio em Lima, Carlos Barros.
Vizcarra e o Judiciário peruano tinham negado que García fosse vítima de perseguição política, e organizações internacionais de direitos humanos declararam que seu pedido de asilo era uma tática para evitar a Justiça.
No Peru, o primeiro-ministro César Villanueva afirmou que compete ao Poder Judiciário agir após a decisão uruguaia. “O que acontecer a partir disso não corresponde ao político, mas a ações do Ministério Público e, em seu momento, do Poder Judiciário”, resumiu.
No caso Odebrecht no Peru também são investigados os ex-presidentes Alejandro Toledo (2001-2006), Ollanda Humala (2011-2016) e Pedro Pablo Kuczynski (2016-2018), assim como a opositora Keiko Fujimori, que está presa preventivamente há um mês.
Apoio no Uruguai
No Uruguai, líderes opositores que pediram esta decisão ao presidente Vázquez manifestaram seu apoio à resolução. “Foi uma boa decisão do governo ter negado asilo político a Alan García”, reagiu no Twitter o aspirante opositor à Presidência com maior destaque nas pesquisas para as eleições de 2019, Luis Lacalle Pou, do Partido Nacional, de centro-direita.
“Fez bem, presidente Vázquez. Dar asilo ao ex-presidente Alan García, investigado pela Justiça independente de um país democrático por atos de corrupção, nunca deveria ser uma opção em uma República como a nossa, onde manda o governo da lei”, expressou o liberal Ernesto Talvi, aspirante pelo também opositor Partido Colorado.
AFP