A arte em equilíbrio de Rogério Livi

A arte em equilíbrio de Rogério Livi

A mostra “Arte na Corda Bamba”, no Espaço Força e Luz, revisita obras do artista e imerge em sua criatividade

Letícia Pasuch

Rogério faz uma releitura do canônico readymade de Marcel Duchamp, com banco de madeira e roda de bicicleta

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Quem transita pela Rua dos Andradas e passa pelo Espaço Força e Luz (EFL) tem a atenção chamada pelo que está exposto bem à vitrine: um banco de madeira acoplado a uma roda de bicicleta, suspensa em uma corda. A obra faz parte da exposição “Arte na Corda Bamba”, de Rogério Livi, inaugurada no dia 30 de janeiro e aberta para visitação até o dia 9 de março. A mostra é uma coletânea de trabalhos produzidos e exibidos pelo artista desde 2000. Muitos deles pertencem a um acervo construído no Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul (MACRS), mas algumas obras foram atualizadas e adaptadas especialmente para o espaço expositivo do EFL. A curadoria é de José Francisco Alves, e a coordenação é de Silvia Livi, esposa de Rogério.

O banco, a obra e a roda em questão é uma releitura do trabalho do pintor, escultor dadaísta e poeta francês Marcel Duchamp (1887-1968), também conhecido por ser inventor dos ready made, objetos industrializados que foram retirados de seu contexto cotidiano e transformados em arte. Uma das primeiras obras foi a roda de bicicleta acoplada em um banco, datada de 1913. Livi inspirou-se em Duchamp para recriar uma versão contemporânea dela. Ele ouviu sobre o artista francês em uma aula do Atelier Livre Xico Stockinger, da Prefeitura de Porto Alegre – onde começou suas primeiras experimentações na arte – e pensou: "ele colocou a arte na corda bamba, e eu gosto muito de fazer trabalhos sobre equilíbrio."

O banco e a bicicleta estão suspensos à corda, presa entre um lado da parede e outro. Rogério pega um galho e posiciona na corda, e a roda de bicicleta desliza nela. Em outra obra, o artista duplica o banco de Duchamp. Unidos à roda de bicicleta, se equilibram na corda bamba. “Tem um equilíbrio, tem igualdade. Tem o preto e o branco, o bem e o mal", exemplifica Livi. E para essas dualidades, ele defende, precisa haver um equilíbrio.

Entre as artes expostas, há, também, dois vídeos na sala de exposição: “Animando o Pampa: 12 mil anos do bioma Pampa e da ocupação humana no RS” (2023), de 14 minutos, relacionando criação de certos objetos com a história de ocupação do Rio Grande do Sul; “A arte do efêmero” é uma apresentação do artista no TEDx em que explica sua técnica com bolhas de sabão como um processo minucioso, leve e de experimentação. No vídeo, ele cita o artista brasileiro Hélio Oiticica quando diz que “a arte é um exercício experimental de liberdade”.

Vida

Em apenas cinco minutos de conversa, é perceptível como Rogério sente apreço por contar histórias, e como relaciona cada obra sua com um momento de sua vida – em todos eles, garantiu um aprendizado para si. Em “O Difícil Equilíbrio” (1998), uma garrafa de vinho contém uma rolha com três garfos espetados. Livi pensou na arte após frequentar uma aula em que se discutia o difícil equilíbrio da comida e bebida. Os garfos, que encontrou no Brique da Redenção, lembravam os que haviam na casa de sua avó. Na série “Microvariações sobre um tema II” (2008), Rogério traz resultados de experimentação com bolhas sobre o papel, que foram feitas com solução de detergente e glicerina. Rogério colocou-as em um nanquim e imprimiu o desenho do papel. Há, também, registros fotográficos das bolhas prestes a explodirem, e em outros bolhas que, estouradas, deixaram o "desenho" no papel.

Em muitas obras, ele usou galhos de bergamoteira, como em “Vida 7” (2022), que estão envoltos em chapas de acrílico. “Reanimação 1/24” (2024) também foi produzida com galhos de bergamoteira e arame. Brincando com o equilíbrio e a gravidade, as pessoas podem interagir batendo levemente no galho, que balança preso no arame. Em “Voo” (2016), é feita uma composição com galhos de pitangueira finos, encurvados por linhas de algodão e recobertos por papel de seda japonês, e são tão leves que balançam apenas com um sopro.

A física

Muitas das obras são interativas e, para envolver o equilíbrio e o movimento cinético, o artista envolve sua extensa trajetória na física: foi doutor, professor titular e pesquisador no Instituto de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). Desde 1998, Livi começou a se dedicar à escultura, desenho, história da arte e fotografia, passando a produzir a partir dos cursos do Atelier Livre. Com suas produções e pesquisas na área, passou a se integrar e construir sua referência na arte contemporânea, não se limitando a categorias da arte tradicional. Já teve participação em diversas exposições coletivas no país e também no Mercosul. Também coleciona prêmios como o Açorianos de Artes Plásticas e Artista Revelação. O artista até tentou não manifestar a física em seus trabalhos. Em vão. “Me dei conta: como vou fazer isso? Está no meu sangue”, diz. Para Rogério, arte e vida se confundem.

De acordo com Verônica Fernandez, diretora-executiva do Espaço Força e Luz, a exposição foi pensada especialmente para a sala O Arquipélago, situada no primeiro andar do Força e Luz. Verônica também lembra do trabalho dos mediadores da exposição: o núcleo cultural é composto por uma gestora e dois mediadores, que estiveram com o artista narrando seus processos e experiência através dos seus trabalhos, auxiliam o público a entender quais técnicas estão por trás da arte e qual experimento complexo resultou naquele trabalho, dando a dimensão da trajetória artística de Rogério. “Cada obra é resultado de uma sequência longa de experiências com materiais, com técnicas, com tempos diferentes, aplicações diferentes, e isso tudo precisa ser contado”, complementa Verônica. A exposição está aberta para visitação com entrada franca de segunda a sexta-feira, das 10h às 19h. Nos sábados, o espaço fica aberto entre 11h e 18h.

*Supervisão de Adriana Androvandi


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