Carlos Saura: entre o realismo social e o flamenco

Carlos Saura: entre o realismo social e o flamenco

Expoente do cinema espanhol morreu de de insuficiência respiratória nesta sexta-feira, 10

AFP

Cineasta dirigiu mais de 50 filmes em sua carreira

publicidade

Figura de destaque do cinema europeu, o espanhol Carlos Saura, que morreu nesta sexta-feira, 10, aos 91 anos, produziu uma obra prolífica que vai do realismo social aos longas-metragens musicais, com especial homenagem ao flamenco.

Frequentemente citado entre os grandes nomes do cinema espanhol, junto com Luis Buñuel e Pedro Almodóvar, Saura dirigiu cerca de 50 filmes ao longo de sua carreira de mais de meio século, durante a qual conquistou vários prêmios.

De estética sofisticada e um estilo que ia do lírico ao documental, inicialmente Saura destacou os males da sociedade e suas vítimas.

Como parte de sua visão crítica, retratou, por exemplo, personagens da burguesia atormentados por seu passado ou vivendo em um sufocante ambiente conservador.

Uma vez instaurada a democracia na Espanha, após a ditadura de Francisco Franco (1939-1975), este amante da música e da dança mudou de foco e começou a expressar seu amor ao tango, ao fado, ao folclore argentino e à jota, e sobretudo ao seu amado flamenco, tornando-se, um tanto a contragosto, um embaixador da cultura espanhola.

Fama internacional

Saura nasceu em 4 de janeiro de 1932 em Huesca, Aragão (nordeste), em uma família de artistas. Sua mãe era pianista e seu irmão, Antonio, se tornaria um conhecido pintor. Durante sua adolescência se apaixonou pela fotografia, antes de começar a estudar cinema.

Depois que seu curta documental "Cuenca", recebeu uma menção especial no Festival Internacional de Cinema de San Sebastián (norte da Espanha), Saura estreou nos longas-metragens com "Los golfos", sobre um grupo de jovens da periferia de Madri, apresentado no Festival de Cannes em 1960.

Em 1966, obteve seu primeiro grande reconhecimento internacional, o Urso de Prata de melhor direção por "A Caça", sobre três amigos que se reúnem para um fatídico dia de caça, um filme que a crítica reconheceu como uma metáfora de uma Espanha ferida pela Guerra Civil (1936-1939).

Em seguida, rodou "Peppermint frappé" (1967), que lhe rendeu novamente o Urso de Prata em Berlim e foi o primeiro de nove filmes com Geraldine Chaplin, que se tornaria sua musa e mãe de um de seus filhos.

Devido à censura franquista, o cinema de Saura neste período era repleto de metáforas, elipses e imagens simbólicas para atacar os pilares do regime, a Igreja, o Exército e a família, como em "O Jardim das Delícias"(1970) e "Ana e os lobos" (1972).

Trilogia flamenca

Em 1975, realizou aquela que para muitos é uma de suas obras-primas, "Cría Cuervos", prêmio do júri em Cannes, uma alegoria da ditadura que sufocava seu país. Uma das músicas do filme, "Porque te vas", interpretada por Jeanette, foi sucesso internacional.

Carlos Saura retorna aos seus temas favoritos de memória e morte com "Elisa, vida minha" (1977) e "Mamãe Faz 100 Anos" (1979), história sobre as neuroses da sociedade pós-franquista, indicada ao Oscar de melhor filme estrangeiro e prêmio especial do júri em San Sebastián.

Nos anos 80 produziu sua trilogia flamenca: "Bodas de sangue" (1981), "Carmen" (1983, outra indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro) e "Amor Bruxo" (El amor brujo, 1986), junto com o bailarino Antonio Gades.

Na década seguinte, dirige "Sevillanas" (1992), "Flamenco" (1995) e "Tango" (1998, terceira indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro).

Em 2002, trabalha com a dançarina Aida Gómez em "Salomé".

"A dança, sobretudo o flamenco, tem algo mágico. Nenhuma dança no mundo é tão clara e evidente, principalmente nas mulheres: ela levanta as mãos e ali está, em seus dedos, o próprio céu, o esvoaçar das pombas. Da cintura para baixo é a terra", afirmou ao jornal El País em setembro de 2020.

"Fui escolhido"

Em sua fase mais musical, Saura não esqueceu o cinema de ficção. Em 1990, dirigiu "Ai, Carmela!" que obteve 13 prêmios Goya, entre eles, de melhor filme.

Fotógrafo ao longo da vida, Saura, casado várias vezes e pai de vários filhos, colaborou com inúmeras revistas especializadas e participou de diversas exposições. Em 1992, dirigiu o filme oficial dos Jogos Olímpicos de Barcelona, "Marathon".

"Tive sorte. Sempre digo: fui escolhido porque fiz o que gostava de fazer, tive muita convivência social, economia suficiente para continuar vivendo e sete filhos. Não posso reclamar", disse Saura ao El País em 2020.


Mais Lidas

Guia de Programação: a grade dos canais da TV aberta desta terça-feira, dia 30 de abril de 2024

As informações são repassadas pelas emissoras de televisão e podem sofrer alteração sem aviso prévio

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895