Para além do beijo: Histórias de amor que começam no carnaval

Para além do beijo: Histórias de amor que começam no carnaval

Casais que se conheceram na folia apoiam campanhas contra o assédio 

Rafael Rangel Winch

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Quem disse que o carnaval é uma festa apenas para curtição e desapego? Histórias provam que paixões iniciadas em bailes e bloquinhos no período da folia podem se tornar relacionamentos duradouros. O Correio do Povo conversou com três casais que evidenciam como aquele beijo de carnaval pode ser o começo de uma relação amorosa marcada por muito companheirismo. Além da parceria na vida, eles também reforçam a importância das campanhas contra o assédio, destacando as diferenças entre uma paquera saudável e comportamentos que perturbam e ameaçam o próximo. Na maioria dos casos, as mulheres são as pessoas importunadas em abordagens ofensivas e desrespeitosas. 

Em 2008, Airton Gontow, 61, Maria Gontow, 59, se conheceram num baile de carnaval repleto de marchinhas e sambas-enredos. O evento em questão foi organizado pelo próprio Airton, em São Paulo. Na ocasião, ele trabalhava na festa quando foi incentivado pelo dono do estabelecimento a também aproveitar o baile. Assim que entrou no salão, Airton viu, pela primeira vez, Maria, que estava acompanhada da irmã. Após algumas trocas de olhares, os dois começaram uma conversa, sem imaginarem que a partir daquele momento viveriam anos juntos. "De repente olhei para a saída e ela estava deixando o local, já nas escadinhas que davam para a rua. Fui rapidamente. Ela estava no último degrau, quase na calçada. Aproximei-me e chamei-a. Ela virou e eu disse: ‘Oi’. Ao que ela respondeu ‘oi’, falei: ‘não sei dançar, mas sou bom de papo. Tu aceitas tomar um café comigo?’ Ela olhou para a irmã e disse: ‘sim’! Ficamos horas conversando no café e já marcamos um novo encontro. Desde então não nos desgrudamos mais", detalha. 

Foto: Arquivo Pessoal 

Segundo Airton, aquele momento foi decisivo para a vida dos dois e a abordagem inicial fez toda a diferença, uma vez que a paquera aconteceu de modo natural e consentido. "Embora seja uma linha tênue, ela é visível. É perceptível. De modo geral a cantada é mais delicada, sutil, inteligente. Às vezes até engraçada. O assédio costuma ser mais agressivo e trata o outro como se fosse um objeto a ser pego e agarrado", ressalta Airton, criador do Coroa Metade, o primeiro site de relacionamento para as pessoas maduras. "É sempre emocionante quando alguém escreve que está saindo do site por ter encontrado o amor no Coroa Metade. É meio piegas contar, mas na maioria das vezes fico tão emocionado que até choro", relata.

Giovanni Carneiro de Oliveira, 44, e Flávia Guimarães de Oliveira, 39 anos, também lembram do período carnavalesco como um marco na história do casal. A história deles começou no carnaval de 2002. Neste ano, ele decidiu curtir a folia em Senador Firmino, município com 8 mil habitantes, situado na Zona da Mata Mineira. Porém, os dois já se conheciam cerca de três anos antes, pois a irmã de Giovanni já era amiga de Flávia. O primeiro beijo deles aconteceu nesse carnaval, no entanto, no dia seguinte, ela não quis beijá-lo, receosa do passado de curtição dele. Respeitando o momento dela, como um bom mineiro, Giovanni conseguiu conquistar Flávia. 

Foto: Arquivo Pessoal 

Para além da folia ter sido decisiva na formação do casal, Flávia recorda que o carnaval está no sangue da família desde 1975, quando a avó dela, Leonor Benedito, criou a 1ª Escola de Samba em Senador Firmino, além de ter sido uma mulher que lutava pela igualdade e dignidade para todos. "Nasci e cresci em meio a plumas e paetês e encarei o fato de me envolver com o Giovanni em um carnaval como um sinal dos céus, da nossa Estrela Guia. Hoje, fazemos questão de retornar à mesma cidadezinha com nossos filhos, Theo e Matheus, para curtir o carnaval que nos últimos anos contou com a reinvenção da Escola de Samba através do Bloco Saca Rolha", conta.

Ao lembrar da forma como conheceu a esposa, Giovanni destaca o apoio do casal às ações contra o assédio no carnaval. "Tanto eu quanto a Flávia apoiamos a campanha contra o assédio. Dá para um homem chegar em uma mulher – e para uma mulher chegar em um homem – de forma respeitosa e com muita atenção ao que o outro quer. Se a campanha já existisse, teríamos nos aproximado e nos apaixonando da mesma forma". A relação do casal foi muito além da folia, os dois namoraram por uma década até se casarem, em 2012. Quatro anos depois, a família aumentou com a chegada do primeiro filho, Theo. Mais quatro anos e veio o segundo filho, Matheus.

Há exatamente 40 anos, Dalton, 57, e Alexandrina, 58, se conheceram num baile de carnaval. Ele conta que os dois se apaixonaram rapidamente quando passaram a época festiva numa casa alugada entre amigos. Uma semana após o primeiro contato, eles já estavam inesperáveis, compartilhando vários momentos, como ir ao cinema. No ano seguinte, Dalton e Alexandrina se casaram. No entanto, para eles, o carnaval também infelizmente é lembrado, em partes, por uma tragédia. Um dos filhos do casal faleceu ainda bebê no momento em que Dalton, como radialista, narrava a festa numa avenida. "Hoje temos a Nathália com 33 anos e o Pedro com 25 e decidimos comemorar e pular o carnaval todos os anos, para lembrar de nosso filho com alegria e não com tristeza. É um pacto que fizemos", explica Dalton. 

Foto: Arquivo Pessoal 

O casal também se posiciona contrário a qualquer tipo de prática abusiva nos momentos de folia. Ao relembrar o primeiro encontro, Alexandrina diz não se arrepender de ter conhecido o marido no carnaval. "Foi algo com muito respeito, uma coisa muito séria. Em dois anos de relacionamento nos casamos. Valeu muito a pena e eu começaria tudo de novo. Nos conquistamos com a seriedade que um teve com o outro", relata. Dalton acrescenta: "essas campanhas vieram para ajudar a tornar as festas mais seguras e com mais respeito a todos, especialmente em relação às mulheres.”

Para comemorar as quatro décadas de romance, Dalton e Alexandrina escolheram a capital da Argentina, Buenos Aires. Mesmo fora do Brasil por agora, o casal jamais esquece da força do carnaval em suas trajetórias como parceiros românticos. Aliás, os dois ainda participam da folia sempre que podem, provando, assim como tantos outros casais, que amores de carnaval podem formar famílias e gerar experiências inesquecíveis. 

Não é não! Carnaval não é terra sem lei

Todo ato não consentido, inclusive durante a folia, é considerado crime. A Lei 13.718, em vigor desde 2018, criminaliza os atos de importunação sexual e divulgação de cenas de estupro, nudez, sexo e pornografia. Em termos legais, a importunação sexual é definida como a prática de ato libidinoso contra alguém sem a sua anuência. O beijo, por exemplo, só pode ocorrer com o consentimento de todos os envolvidos. 

Na edição de 2020, a última publicada antes da pandemia da Covid-19, o Instituto Inteligência Ibope realizou uma pesquisa sinalizando que 48% das mulheres brasileiras alegam já ter sofrido algum tipo de assédio no carnaval. As formas de assédio são variadas e incluem desde olhares constrangedores, insultos, perseguições, gestos intimidadores, comentários acerca de atributos físicos e toques sem permissões. 

Situações de assédio podem ser denunciadas de variadas maneiras. Num primeiro momento, é possível comunicar esse tipo de situação aos policiais ou seguranças do local que abriga o evento. Além disso, ocorrências podem ser registradas em uma delegacia ou mesmo no site da Polícia Civil. Por fim, também há a opção de ajuda via ligação. 

Telefones para fazer denúncia de assédio:

Brigada Militar: 190
Disque Denúncia: 181
Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher de Porto Alegre: (51) 3288-2172


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