Cinema gera gentileza

Cinema gera gentileza

Festival Santa Cruz de Cinema demonstra para que existe: a reflexão

Caroline Guarnieri *

A abertura do festival aconteceu no auditório da Unisc na terça-feira, 24

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Na noite de terça-feira, 24, teve início a 6ª edição do Festival Santa Cruz de Cinema, com uma cerimônia de abertura que lotou o auditório da Universidade de Santa Cruz (Unisc), de aproximadamente 700 pessoas, incluindo alunos de sete escolas públicas da região, trazidos especialmente para assistir aos filmes. A solenidade contou com representantes da prefeitura, do setor de cultura do município e do estado e de instituições apoiadoras e mantenedoras do festival. 

A apresentação ficou por conta de Rafael Tambini, ator, dublador e dono do Brás 1532, um dos bares que apoiam o festival, e de Maiara Fantinel, produtora e organizadora do evento. Em seu discurso, Tambini fez questão de citar Kléber Mendonça Filho, diretor brasileiro que voltou aos holofotes recentemente após o sucesso do seu último filme, “Retratos Fantasmas” (2023). “Uma sala assim lotada de pessoas que querem conhecer as tantas formas de ser brasileiro é um momento marcado pela gentileza”, disse o apresentador.

E não foi só gentileza que brotou do público durante a primeira sessão. O três curta-metragens da mostra “Olhares Daqui”, dedicada a produções locais de Santa Cruz do Sul, junto dos 18 filmes da mostra nacional, foram divididos em três noites de exibição, todas gratuitas e abertas ao público geral. As temáticas geraram diferentes reações no público.

Logo na primeira sessão, foi possível perceber a diversidade na escolha dos competidores deste ano. Foram mais de 600 inscritos, um recorde na história do festival. Esse total passou por uma curadoria em duas etapas por uma equipe de 15 profissionais para, enfim, ser reduzido aos 18 selecionados. As obras concorrem ao Troféu Tipuana, prêmio que será entregue na cerimônia de encerramento, na sexta-feira.


Foco no diferente

Entre os escolhidos, os exibidos na quarta-feira foram: “Já é tarde?”, de Luís Alexandre, na mostra “Olhares Daqui”; e “Buscapé” (RS), de Fred Luz, “Remendo” (ES), de Roger Ghil, “Sabão Líquido” (RS), de Fernanda Reis e Gabriel Faccini, “Coletâneas de Histórias Extremamente Curtas” (SP), de Pedro Fraga Villaça, “Travessia” (RJ), de Gabriel Lima, e “Ela Mora Logo Ali” (RO), de Rafael Rogante e Fabiano Barros, na mostra nacional. Após o encerramento da sessão, os realizadores foram convidados a participar de uma roda de debate, aberta para perguntas do público.

Os curta-metragens, cada um da sua forma, tocam no âmago de problemas urgentes da atualidade. A violência e a perspectiva de vida nas comunidades das favelas voltou à tona com “Buscapé”, spin-off do conceituado “Cidade de Deus”, de 2002, com os mesmos atores duas décadas depois. As barreiras enfrentadas no dia a dia por pessoas não alfabetizadas foi tema de “Ela Mora Logo Ali”, um dos filmes que veio mais de longe para a mostra, trazendo a visão do norte do país. “Sabão Líquido”, com seu silêncio marcante, abordou com delicadeza a complexa cadeia do trabalho análogo à escravidão - e como ele pode estar inserido em situações cotidianas sobre as quais nem chegamos a refletir.

A urgência em representar tantas situações diferentes pode ser atribuída, inclusive, ao formato do cinema feito pelos realizadores. O curta é o foco do Festival de Santa Cruz desde a sua criação, como comenta Rudinei Kopp, professor do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) e um dos idealizadores do festival. 

“O curta-metragem tem a capacidade de contar rapidamente o que está acontecendo num país, ele tem uma capacidade de traduzir artisticamente com muito mais velocidade que um romance ou um longa”, acredita o publicitário. “Um fenômeno social ou uma questão cultural que tenha chamado atenção num ano, no próximo ano já é capaz de ter sido transformado em curta”.


Mosaicos

Pela versatilidade do seu tamanho, esse tipo de filme permite que o evento conte muitas histórias em uma noite só. Kopp afirma que a organização “consegue trabalhar com essa ideia de mosaico cultural, que é um dos objetivos do festival”. A diversidade de temas e linguagens contribui para a formação de plateia, especialmente entre os habitantes da cidade.

Se o cinema gera e demonstra gentileza, ele também inspira. O protagonista de “Travessia”, vivido por Caio Blat, é um escritor que tenta fugir do mundo externo e de si mesmo em um barco no mar aberto. Ele escuta que “falta água” no seu livro. Na narrativa, marcada por um texto denso e poético, a água carrega a analogia de ser capaz de afogar e ao mesmo tempo libertar. O personagem de Blat se questiona sobre porquê ele passa a vida sem conseguir se importar com perdas, golpes e ganhos. 

O curta nos convida a refletir, a olharmos para dentro. Ele ressoa para além da tela, tocando em pontos que extrapolam os fatos retratados ali. A verdade é que todos os filmes da mostra de Santa Cruz fazem o mesmo: ao exibirem diferentes formas de existir, somos convidados a pensar sobre a nossa própria. No final do seu discurso de abertura, Rafael Tambini respirou fundo, emocionado, e disse: “estamos aqui porque queremos saber quem somos, dizer quem somos e principalmente nos conhecer”.

Após três noites de programação intensa, o festival vai revelar seus destaques. A cerimônia de encerramento e premiação acontece na sexta-feira, 27, às 19h, no auditório da Unisc. Todos os eventos são gratuitos e abertos ao público.

*Sob supervisão de Luiz Gonzaga Lopes


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