Espetáculo “Seis” resgata o protagonismo feminino na história

Espetáculo “Seis” resgata o protagonismo feminino na história

Na apresentação do grupo Música e Cena, antigas rainhas da Inglaterra competem pela liderança de uma banda pop

Caroline Guarnieri *

O grupo Música e Cena trouxe o espetáculo "Seis" para o Teatro do Sesc ontem e na quinta-feira

publicidade

“Separou, degolou, morreu; separou, degolou, sobreviveu”, canta a rima que abre o mais novo espetáculo musical de Porto Alegre. A estreia oficial de “Seis - O Remix da História” foi em outubro do ano passado, em São Leopoldo, mas foi só nessa semana que o público da capital pôde ver ao vivo a saga das seis rainhas esposas do rei Henrique VIII da Inglaterra. O Correio do Povo compareceu à primeira apresentação, na quinta-feira.

Em 1h15min de apresentação, o grupo Música e Cena contou os sonhos e decepções de Catalina de Aragón, Ana Bolena, Jane Seymour, Anna de Cleves, Katherine Howard e Catherine Parr, com direito às principais referências do mundo pop atual espalhadas pelas danças e interpretações. No palco, as seis rainhas formam uma banda e competem para decidir quem será a líder, baseadas em quem sofreu mais no seu casamento. 

Foram cerca de 700h de ensaio entre 2019 e 2022, sob a direção de Vinícius Kaiser, para levar as 12 atrizes (dois elencos completos) aos palcos. A formação de quinta-feira contou com Mônica Freitas, Júlia Lucas, Carol Gonzatto, Aline Centeno, Érica Ribas e Anne Greif. 

O preparo e a dedicação da equipe estavam escancarados em cada detalhe. Com um humor ácido, sagaz e perspicaz, as rainhas reivindicaram o direito de contar sua própria história, colocando as mulheres em evidência. E conhecer o passado da Inglaterra não é um pré-requisito: é possível entender tudo pelas letras e falas. 

Pode parecer um pouco difícil enquadrar uma história europeia do século XVI no Brasil de 2023, mas a adaptação do grupo deu conta disso – e muito bem. A produtora e tradutora Anne Greif e a coreógrafa Mônica Freitas foram responsáveis por trazer influências brasileiras para a peça. Passinhos de funk eram acompanhados de memes das redes sociais para situar o público no coração do país. Cada personagem tinha sua música solo, além de algumas outras cantadas pelo grupo todo.

Da esquerda para a direita: Mônica Freitas (Catalina de Aragón), Júlia Lucas (Ana Bolena), Carol Gonzatto (Jane Seymour), Aline Centeno (Anna de Cleves), Érica Ribas (Katherine Howard) e Anne Greif (Catherine Parr) | Foto: Ricardo Giusti / CP

Os passos inspirados nas touradas da Espanha no solo da rainha espanhola Catalina de Aragón incluíam um toque sutil de samba no pé. O “I’m like, dead” de Ana Bolena no original virou “aí eu fui de arrasta pra cima” na versão brasileira. Jane Seymour trouxe a plateia às lágrimas por retratar a dor de uma mãe que não viu seu filho crescer, na linguagem universal do amor. 

No meio da peça, somos oferecidos uma pausa bem-humorada na competição para contextualizar um dos lugares em que a história se passa: a “Haus do Holbein”, casa do pintor suíço Hans Holbein. A música é a garantia de que a peça consegue arrancar uma risada do público, principalmente pelos adereços neon usados pelas personagens e seus passos de dança nada convencionais.

Seguindo os solos, o sotaque alemão de Anna de Cleves na Grã-Bretanha deu lugar ao modo de falar dos imigrantes alemães nas colônias gaúchas, com um pouco de funk carioca. Katherine Howard canta “and I was thirteen, going on thirty” no original, uma referência ao filme “De Repente 30” (“13 going on 30”), de 2004; na tradução do grupo, é “eu tava na quinta \[série\], mas de repente 30”. Catherine Parr encerra a competição com uma carta de amor ao namorado que precisou abandonar para casar com Henrique VIII.

A arte também é uma ferramenta educativa. A ideia de trazer um contexto histórico com referências musicais da atualidade não começou com “Seis”. Talvez seja uma tendência do teatro musical, uma nova aposta para renovar o público do gênero e trazer jovens para o teatro. Um exemplo notório é “Hamilton”, musical original de Lin-Manuel Miranda sobre Alexander Hamilton e as demais figuras que lutaram pela independência dos Estados Unidos. Com um sucesso imprescindível, a peça debutou na Broadway, em Nova York, em 2015 – e rendeu um Prêmio Pulitzer ao criador, além de diversos Tonys para a equipe.

A realidade é que “Seis” faz um belo trabalho de nos lembrar do protagonismo feminino já existente na história, que muitas vezes é apagado quando os livros são escritos por homens. No final, elas imaginam como suas vidas teriam sido caso não fossem obrigadas a casar com o rei. Entre morar em conventos, cantar músicas com os filhos e escrever histórias, os sonhos são diversos, e grandes como suas determinações. As personagens são decisivas quando cantam: “eu não escolhi, então roubei o microfone; quem conta a história hoje sou eu”. A plateia foi convidada a ouvir as histórias delas – e também inspirada a sempre contar as suas.

Sexta-feira

  • O elenco da segunda apresentação teve a repetição de Aline Centeno e Érica Ribas, além das outras integrantes Luísa Bergonsi, Camila Mendonça, Micaela Zambon e Fefa Bergonsi.

*Sob supervisão de Luiz Gonzaga Lopes


Mais Lidas

Guia de Programação: a grade dos canais da TV aberta desta segunda-feira, dia 29 de abril de 2024

As informações são repassadas pelas emissoras de televisão e podem sofrer alteração sem aviso prévio

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895