Itamar Vieira Junior e Jeferson Tenório têm conversa inspiradora na Feira do Livro de Porto Alegre

Itamar Vieira Junior e Jeferson Tenório têm conversa inspiradora na Feira do Livro de Porto Alegre

Escritores ganhadores do Prêmio Jabuti marcaram presença no Espaço Petrobras Carlos Urbim em mesa mediada por Nathallia Protazio

Leticia Pasuch *

A mesa “Conversas Inspiradoras” foi mediada pela escritora pernambucana Nathallia Protazio

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A forte chuva da tarde desta quinta-feira, dia 2, feriado de Finados, não foi um empecilho para que o Espaço Petrobras Carlos Urbim, na Praça da Alfândega, em Porto Alegre, lotasse. O motivo foi a presença dos escritores Itamar Vieira Junior e Jeferson Tenório, acompanhados de Nathalia Protazio, que mediou a mesa “Conversas Inspiradoras” na 69ª Feira do Livro de Porto Alegre. Do lado de fora da tenda, pessoas com guarda-chuvas abertos ouviam os autores com atenção, em uma conversa de 1h sobre suas relações com a literatura, construção de suas obras e identidade. Entre eles, uma mesa continha suas obras premiadas empilhadas.

Nathallia Protazio é pernambucana, farmacêutica e escritora. Foto: Eduardo Fernandes/Feira do Livro Porto Alegre

A voz de Nathallia disputava com a chuva, em meio a perguntas instigantes. Representando o coletivo de escritores negros de Porto Alegre, a pernambucana iniciou a conversa percebendo a presença de poucas pessoas da periferia no espaço, e refletindo sobre o central e periférico na literatura.

Tenório, ganhador do Prêmio Jabuti de 2021, ressaltou o quanto a leitura mudou sua vida. “A coisa mais transgressora que aconteceu na minha vida foi virar leitor”, diz. “A leitura me deu a possibilidade de imaginar e inventar um futuro”. Defendeu que a imaginação é um modo de resistência, e que o exercício de imaginação é o maior papel da literatura, que tem o poder inventar e imaginar futuros possíveis.

Itamar, ganhador do Prêmio Jabuti de 2020, disse que a literatura é o seu espaço de busca de referências, carregadas de reconhecimento do lugar onde veio e nasceu, no nordeste. “Elas aparecem na minha literatura como algo inescapável”, resume. 

O autor comentou, também, sobre a relação que tem com os personagens de suas obras, e como essa relação ultrapassa a ficção. "Preciso acreditar nas personagens como existências reais, senão não consigo falar delas. Elas existem em toda a sua inteireza para mim", revela. Sonhando acordado com os personagens, ele afirma que elas existem no plano da imaginação. “O sonho é o nosso primeiro gênero literário”, diz.

Foto: Eduardo Fernandes/Feira do Livro Porto Alegre

Perguntado se o que é mais dolorida é a vida ou a literatura, quando se pensa nas trajetórias de seus personagens em uma luta pela dor, Tenório escolhe a vida, mas diz que a escrita não é um sofrimento, e que, nesse seu processo de longas horas, dá o melhor de si. Também defende que a literatura provoca coisas, mas não traz respostas. “Eu não acho que a literatura deva nos ensinar alguma coisa, que deva tornar alguém melhor, mas acho que a literatura deve nos dar vontade de viver”, diz.

Nathalia trouxe à discussão a carência da literatura em Pernambuco, e que havia encontrado um livro de Itamar, às vezes sendo o único do gênero em uma livraria. O autor fala sobre a capacidade que a narrativa tem de se ligar às pessoas de forma direta. Surpreso quando encontra suas obras onde não esperava encontrar literatura, Itamar lembra que essa leitura tem chegado a lugares distantes, e que isso o satistaz profundamente. Afirma que escreveu um livro que deve ser acessível a muitas pessoas, ainda que ele, no sentido econômico, seja objeto de luxo para muitos. “Acho que esse é o melhor prêmio, chegar ao coração dos leitores”, diz. Ele ainda ressalta que a escrita sempre está direcionada a um corpo, mas que é importante não idealizá-lo, mas que seja livre e de qualquer leitor.


Itamar Vieira Junior, autor de "Torto Arado" (Todavia, 2019) e Salvar o Fogo (Todavia, 2023). Foto: Eduardo Fernandes/Feira do Livro Porto Alegre

Tenório afirmou que a "Estela sem Deus" foi a obra que mais deu trabalho para escrever, por ser voltado a questões de gênero, e porque tinha receio de cair em determinado estereótipo ao trazer a personagem. Escrevendo e reescrevendo até a exaustão, afirmou também que, quando terminou a obra, sentiu uma espécie de luto.

Jeferson Tenório, autor de "O Avesso da Pele" (Companhia das Letras, 2020), "Pela Hora da Morte" (Jandaíra, 2022) e Estela Sem Deus (Companhia das Letras, 2018). Foto: Eduardo Fernandes/Feira do Livro Porto Alegre

Nathallia diz que a literatura já a salvou, e que ela é uma espécie de liberdade. Perguntado como se constrói a liberdade com a literatura, Itamar é categórico: “O príncipio da literatura já guarda o sentido do que é e liberdade”.

Ao final da conversa inspiradora, a tenda esvaziou-se imediatamente para a sessão de autógrafos de ambos os autores, a qual formou-se uma grande fila.

* A cobertura do Correio do Povo na Feira do Livro de Porto Alegre 2023 é um oferecimento de Banrisul

* Supervisão de Luiz Gonzaga Lopes


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