Ficção especulativa é destaque no Rastros do Verão

Ficção especulativa é destaque no Rastros do Verão

Mesa deste sábado do festival literário, que segue até segunda, homenageando João Gilberto Noll, tratou de obra de Taiasmin Ohnmacht

Luiz Gonzaga Lopes

Jeferson Tenório, Taiasmin Ohnmacht e Paula Sperb falam sobre 'Uma Chance de Continuarmos Assim', de Taiasmin

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Nos dias finais da quinta edição do Festival Literário Rastros do Verão, um dos destaques do evento, no fim da tarde deste sábado, foi a mesa com Taiasmin Ohnmacht, centrada em toda a sua obra, mas principalmente em “Uma Chance de Continuarmos Assim”, da Diadorim Editora, uma ficção especulativa tendo como embasamento a escrita afrofuturista. A mediação foi do escritor Jeferson Tenório (“O Avesso da Pele”) e da jornalista Paula Sperb. A conversa foi realizada na Livraria Taverna, no Centro Histórico da Capital.

No livro de Taiasmin, que trata com profundidade o racismo estrutural e também o machismo, Paula e sua amiga Marcela desenvolvem um dispositivo que permite o deslocamento no tempo. O leitor é convidado a transitar entre futuros possíveis, distopias, utopias e fragmentos imprecisos. O livro é uma ficção especulativa na qual afeto, tempo e memória são indissociáveis. Indagada por Paula Sperb e Jeferson Tenório, Taiasmin destacou que a obra dialoga diretamente com o livro de 1979, “Kindred – Laços de Sangue”, de Octavia E. Butler, que teve mais de meio milhão de exemplares vendidos no mundo todo. O fato de a personagem principal, Dana, ser uma mulher negra nos Estados Unidos dos anos 70 e aos 26 anos se vê em uma realidade distópica na Maryland do século XIX em um lugar muito inseguro para uma mulher negra. “O diálogo do meu livro é com os filmes de ficção dos anos 70 e 80 e ao ver esta mulher negra dos anos 1970 eu fiquei encantada com esta autora e também angustiada quando vivemos a distopia, que parecia apocalíptica, com a pandemia, com os rumos daquilo tudo. Pensando em como a gente iria estar. Foi este conjunto de coisas que me fez pensar que uma ficção especulativa poderia ser um caminho para a obra”, lembrou Taiasmin.

Jeferson ressaltou que o livro traz um ambiente acadêmico, mostrando mulheres negras pesquisadoras em uma área predominantemente de homens e perguntou se seria de a literatura negra contar cada vez mais histórias de negros na universidade, pesquisadores, doutores, personagens que quebram os estereótipos. “Eu escuto muito a gurizada que está na universidade com esta demanda, de ver personagens negras em outros contextos. A gente não pode postar no apagamento da memória. O divisor de águas na minha vida foi a universidade pública. Me formei em uma universidade privada, nos anos 90. E quando fiz o mestrado na Ufrgs foi um ano depois da ocupação da Ufrgs, quando os alunos negros se organizaram. De uma certa forma, a Paula e a Marcela são uma homenagem a aqueles alunos daquele momento, que batalham por uma utopia, por uma ruptura”, contou Taiasmin, lembrando que a literatura negra atual tem no livro dela, em “O Avesso da Pele”, do Jeferson Tenório, e em muitos autores negros a aposta no afrofuturismo e em tecnologias ancestrais com algo futuro.

Paula Sperb destacou o texto da sua resenha para o jornal O Globo com o tema “Romance faz do racismo estrutural um tema para a ficção especulativa”. SegundoTaiasmin, uma das coisas que ela pensou foi que a personagem principal precisava ser afetada pela viagem no tempo. “Um dos jeitos que eu pensei foi que ela fosse uma personagem atormentada e que mostrasse isto de algum jeito, narrasse em primeira pessoa. A minha formação em psicanálise ajudou um pouco a contar esta história, mas em linguagem literária e não psicanalítica. Sempre tive medo da questão ética, das pessoas acharem que eu estava tirando uma história do consultório, mas era ficção. Em ‘Vozes de Retratos Íntimos eu conto a história da minha família, mas é uma ficção”, disse Taiasmin ao que Jeferson respondeu que “às vezes a gente rouba a experiência dos outros, com algum material autobiográfico tendo sempre o filtro da linguagem literária”. Paula Sperb enfatizou que a construção da percepção dos demais personagens, que não as protagonistas Paula e Marcela, são muito bem estruturadas e que o livro tem um apelo audiovisual muito forte, que serviria muito bem para uma adaptação ao que Taiasmin disse que o livro foi pensado de forma a ter um apelo audiovisual.

A quinta edição do Festival Literário Rastros do Verão segue até segunda-feira, dia 25 de março. O evento idealizado para homenagear a memória e o legado literário de João Gilberto Noll e difundir a produção literária local mais recente está ocorrendo em sete livrarias da cidade e na Casa de Cultura Mario Quintana, com a presença de cerca de 70 autores e autoras. O evento seguiu na Taverna no início da noite com uma mesa sobre Noll, com Marcelino Freire e Valéria Martins, mediados por Flávio Ilha e João Nunes Jr.

Logo mais, às 19h30min, na Livraria Macun (Octávio Corrêa, 67), ocorre o Lançamento e sessão de autógrafos do livro “Torrão”, com Escobar Nogueira, seguido de um Sarau para João Gilberto Noll, com Helena Meireles (Preta Guardiã) e Nathallia Protázio, e as participações de Marcelino Freire e Escobar Nogueira (20h), encerrando com show com Pâmela Amaro, às 21h30min. Na segunda-feira, às 18h30min, na Clareira (Henrique Dias, 111), haverá bate-papo com Edgar Vasques sobre os 50 anos do “Rango 1” (primeiro álbum), com mediação de Guaraci Fraga e Roger Lerina, seguida da abertura de exposição com originais do Rango.


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