Literatura nigeriana vira a página para o passado com novos autores e enredos

Literatura nigeriana vira a página para o passado com novos autores e enredos

Publicações cada vez mais se afastam das temáticas da era pós-colonial

AFP

Nova obra de Olumide Popoola é um exemplo dessa modernização literária

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Mencione a literatura nigeriana e os primeiros nomes que provavelmente surgirão são Chinua Achebe, autora de "O mundo se despedaça", ou o venerável prêmio Nobel Wole Soyinka. Contudo, a nação mais populosa de África tem uma nova safra de escritores cujo trabalho está muito longe da era pós-colonial de seus estimados predecessores. Essas novas obras viram a página para o passado, como a novela de Olumide Popoola "When We Speak Of Nothing", que conta a história de um adolescente gay que procuram o pai que nunca conheceu na cidade petrolífera de Port Harcourt. Além disso, o livro, que foi publicado no início deste ano, está escrito numa linguagem que mistura o pidgin africano com gírias de Londres e inclui descrições cômicas.

Para Emeka Nwankwo, da editora nigeriana Cassava Republic Press, romper convenções e expectativas sobre a literatura é uma maneira de refletir como o país mudou. "Estamos procurando uma maneira alternativa de contar histórias africanas, histórias engraçadas e subversivas. O que está acontecendo agora na Nigéria é muito fascinante. Novas vozes estão sendo ouvidas depois de um longo período de silêncio", analisa. A mais famosa delas, e que ganhou destaque no cenário global nos últimos anos, é a romancista Chimamanda Ngozi Adichie, que fez seu nome com "Meio Sol Amarelo" (2006) e "Americanah" (2013). Ambas as histórias já foram traduzidas para dezenas de idiomas, enquanto a primeira foi adaptada para o cinema em 2013, estrelando os atores Thandie Newton e Chiwetel Ejiofor.

Sede de literatura

Lançada em 2006 na cidade de Abuja e agora com um escritório em Londres, a Cassava Republic Press está liderando a revolução literária com outras editoras locais, como a Farafina e a Bookcraft. Em pouco mais de uma década, publicou cerca de 50 livros. O best-seller "In Dependence", de Sarah Ladipo Manyika, vendeu 1,7 milhão de cópias na Nigéria e no exterior. Nenhum gênero é excluído pela empresa, que edita desde livros de ficção científica até obras que exaltam o erotismo humano. "Season of Crimson Blossoms", de Abubakar Adam Ibrahim, conta a história de um caso improvável entre uma viúva de 55 anos e um jovem traficante de drogas no norte do país, de maioria muçulmana. Em vez de provocar um escândalo, o romance ganhou o ano passado o maior prêmio literário do país, o Prêmio Nigéria de Literatura e o autor recebeu 100 mil dólares.

Em outra categoria, tem-se "Longthroat Memoirs: Soups, Sex and Nigerian Taste Buds", uma ode excêntrica para a culinária local e suas supostas propriedades afrodisíacas. Com capítulos evocativos como "Afang Soup and Hairy Legs" e "Eating Dog", o autor Yemisi Aribisala revela o poder sensual dos inhame e do peixe bem cozido, amados pelos nigerianos. Outros, como Leye Adenle ("Easy Motion Tourist") levam o leitor a uma jornada pela capital Lagos, palco de encontros com corrupção, prostituição e drogas.

O renascimento literário na Nigéria ocorreu mais nas livrarias em áreas da classe trabalhadora e centros comerciais em todo o país, mas ambém está decolando online: o aplicativo para leitura de livros digitais Okadabooks tem cerca de 200.000 usuários e um milhão de downloads. "Há uma sede de literatura na Nigéria e as editoras agora estão respondendo", argumenta Lola Shoneyin, que organiza o Festival de Ake anualmente em novembro. O evento, realizado em Abeokuta, tornou-se uma espécie de parada obrigatória para casais, muitos deles com menos de 30 anos.

A expansão da literatura na Nigéria na década de 60 e 70 foi conduzida por editores britânicos, explicou Shoneyin, que também é poeta e escritor. Mas os sucessivos governos militares naquela época "frustraram a indústria do livro", sufocando a criatividade com "políticas anti-intelectuais", acrescentou. Os desafios atuais enfrentados pelos editores são diferentes, mas não menos assustadores. A maioria das impressões, por exemplo, é feita a baixo custo na China ou na Índia, embora algumas editoras estejam começando a trazer a produção de volta para casa devido à melhoria da qualidade. Os livros não são imunes aos fatores que afetam o setor cultural, do cinema à música: aqueles mal fotocopiados ou com problemas na impressão são vendidos nas ruas ou nos mercados.

A distribuição também permanece "uma experiência desafiadora", afirma Bibi Bakare-Yusuf, fundadora da Cassava Republic Press. Entretanto, ela vê a situação com um inabalável otimismo: "a falta de infraestrutura também pode ser uma oportunidade, pois permite que você pense de forma mais criativa e flexível sobre como enfrentar desafios, ao invés de ser dificultado por estruturas existentes e muitas vezes desatualizadas que lutam para se mover com o tempo e responder a novas compras e padrões de consumo ", finaliza.

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