Mesa “Memórias do Cárcere” reúne escritores atingidos pela ditadura, na Flip

Mesa “Memórias do Cárcere” reúne escritores atingidos pela ditadura, na Flip

Encontro da tarde deste sábado teve Marcelo Rubens Paiva, Bernardo Kucinski e Persio Arida

Luiz Gonzaga Lopes / Correio do Povo

Mesa reuniu Marcelo Rubens Paiva, Bernardo Kucinski e Persio Arida

publicidade

A mesa Memórias do Cárcere - 50 anos do Golpe realizada no início da tarde deste sábado na Tenda do Autores da 12ª Flip, em Paraty, foi esclarecedora, manteve a esperança por mais informação e principalmente por justiça, mas os integrantes do painel reconheceram que a ditadura continua, de certa forma, pois a democracia não avançou no sentido de punir os culpados por mortes e desaparecimentos durante a ditadura militar de 1964 a 1979.

Sob mediação de Lilia M. Schwarcz, a mesa reuniu o jornalista e dramaturgo Marcelo Rubens Paiva, o jornalista e escritor Bernardo Kucinski e o economista Persio Arida, todos com histórias ligadas a desaparecimento ou morte de familiares ou que vivenciaram a tortura e prisão na pele, como é o caso de Arida.

O primeiro grande momento da mesa foi quando após ouvir um áudio da Rádio Nacional de 1964, de um pronunciamento do pai Rubens Paiva pró-João Goulart, legalidade e reformas de base, Marcelo Rubens Paiva leu uma crônica dele publicada no início do ano no Estadão, quando exaltou que quem combateu a ditadura militar foi a sua mãe, Eunice, sobre quem está escrevendo um livro, destacando a prisão do pai e também da mãe por 13 dias em 1971 e a célebre data de 23 de fevereiro de 1996, quando eles receberam o atestado de óbito do pai. Durante e após a leitura, Marcelo chorou e o público o aplaudiu de pé por dois minutos. "O desaparecimento é a segunda tortura, você continua ser torturado até hoje. Jamais tem um fim. A família não é a única vítima. O país e a humanidade são as vítimas. Quando vi na capa de O Globo que o torturador estava pisando na cara do meu pai. O pior de tudo é que os militares ainda queriam durante muito tempo mostrar o seu poder. Estamos apostando mais no Ministério Público do que na Comissão da Verdade, numa forma de circular a Lei da Anistia e enquadrar alguns destes militares nos crimes de desaparecimento de cadáver e formação de quadrilha", declarou Paiva.

Bernardo Kucinski, que teve a irmã Ana Rosa e o cunhado Wilson Silva desaparecidos em 1974, leu o trecho "Imunidades, um Paradoxo" do seu livro "K." (Cosac Naify) sobre um pai, o seu próprio, mas recriado ficcionalmente que sente-se imune, intocável, pois a busca da filha justifica empunhar cartazes, desdenhar da polícia e a não temer mais nada. "Sobre este livro, decidi não dar uma de jornalista investigativo. Escrever com as minhas memórias e as coletivas, da família, e rechear com ficção. São ainda poucos os livros que tratam sobre o tema. Eu não tenho esperança nos resultados da Comissão da Verdade. As Forças Armadas não repudiaram as atrocidades do passado. A estratégia da abertura lenta e gradual dos militares deu certo, pois a ditadura continua, substituíram a militar pela midiática, substituíram a indignação pelo consenso", frisou.

Preso e torturado em 1970, quando aos 18 anos era filiado à Vanguarda Armada Revolucionária de Palmares, Persio Arida leu um trecho de um artigo seu publicado na revista piauí especial da Flip. No texto, fala da estratégia do pai e da mãe de proteger o filho numa garconière (termo francês de apartamento para encontros amorosos) que o pai dividia com um amigo, mas que custou brigas familiares e a própria censura da mãe ao artigo. No final, o importante era que os dois se uniram para salvar a vida do filho. "Eu fiquei desaparecido, mas o fato de descobrir que alguém sabia que eu estava lá acabava me confortando que não iria ser morto. O Brasil é um país de pouca memória. Estes livros, artigos e uma maior informação são importantes para as novas gerações, pois este desconhecimento é parte do desconhecimento de quem somos e de nossa própria história. A luta armada não tinha ideais nobres, o nosso ideal era o proletariado no poder, o mais importante da lição para as novas gerações é o sacrificar o individual por um bem maior, o desprendimento por uma causa", ressaltou Arida.

Bookmark and Share

Mais Lidas

Guia de Programação: a grade dos canais da TV aberta desta quarta-feira, dia 1 de maio de 2024

As informações são repassadas pelas emissoras de televisão e podem sofrer alteração sem aviso prévio

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895