"Mudanças em Cuba são lentas, mas significativas", afirma Leonardo Padura
Autor da tetralogia "Estações Havana" comentou recentemente o momento político da ilha
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No ano passado, a ilha esteve em recessão e o vencedor do Prêmio Princesa das Astúrias de Letras 2015 não sabe como superar economicamente todas as necessidades que vêm se acumulando ao longo dos anos. Para o autor, a partir do restabelecimento das relações entre Cuba e Estados Unidos praticamente não aconteceu nada. "Nesse momento, muitos americanos viajam para Cuba com vistos especiais, ainda não podem viajar como turistas, (mas) o embargo continua existindo, portanto não pode haver um comércio normal e uma relação normal entre Cuba e Estados Unidos e isso realmente influenciou muito pouco na realidade cubana", explica.
Padura, conhecido internacionalmente por seus romances policiais como "Máscaras", "Paisagem de Outono","Ventos de Quaresma" e "O Rabo da Serpente", protagonizados por seu popular detetive Mario Conde, se mostra cauteloso com a eleição de Donald Trump no país vizinho e diz que é preciso esperar para maiores conclusões sobre o governo do Republicano. "Trump apenas se referiu a Cuba, fez isso muito pontualmente, mas muito superficialmente e não tomou nenhuma medida específica, nem para aprofundar as medidas tomadas por Obama, nem para derrubá-las". Nascido na capital Havana, o escritor acredita que, para fazer Cuba avançar mais rapidamente até uma abertura, "faltam mudanças econômicas mais radicais, que não sei como irão organizar porque não sou economista". A chave de tudo, de acordo com o escritor, estaria na economia.
Entretanto, esta não é sua principal preocupação no mundo atualmente. Aos 61 anos e com barba grisalha, ele se diz intrigado pela "eterna estupidez humana". "Creio que temos demonstrado ao longo de toda a história da civilização que somos uma espécie com um alto sentido de estupidez, e o desenvolvimento tecnológico, científico, humanístico não nos salvou disso e continuamos sendo uns estúpidos capazes de destruir o que temos, o belo, o necessário sem o qual não podemos viver", conta, enquanto gesticula.
Em "O Homem que Amava os Cachorros", Padura reconstruiu a história de Leon Trotsky, o que era para ele "uma grande ignorância" que acabou lhe despertando curiosadade. "Em Cuba, a política sobre Trotsky foi a mesma da ex-União Soviética, (era) como se não tivesse existido, desaparecido das fotos", explica. Em sua primeira vez ao México, foi à casa onde o revolucionário russo viveu exilado, em Coyoacán no ano de 1989. "Depois soube que (seu assassino) Ramón Mercader viveu vários anos em Cuba e morreu em Cuba, e tudo isso foi pouco a pouco se acumulando até que chegou o momento em que estive em condições de poder escrever esse livro", analisa.
Sobre seu processo de escrita em uma sociedade ainda fechada, Padura relata que escreve e se atém às consequências. "Até agora as consequências não têm sido especialmente graves nem violentas, mas sofro a consequência de ser quase invisível em Cuba". O autor não aparece nunca na televisão, não sai nos jornais. "Sou quase invisível, ganho prêmios internacionais e não são mencionados. Mas bom, é o preço que pago por escrever como escrevo, é o meu espaço de liberdade e eu o pratico", avalia.