"O cinema é importante para tratar de questões sociais", diz diretora da Cinemateca Paulo Amorim

"O cinema é importante para tratar de questões sociais", diz diretora da Cinemateca Paulo Amorim

Mônica Kanitz defende a importância da difusão do cinema alternativo

Leticia Pasuch *

Mônica Kanitz conta sobre a relação com o cinema e a atenção que dá às produções alternativas na programação

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Ao passar pela porta da Cinemateca Paulo Amorim, tão logo é possível avistar um projetor de 35mm ao lado de uma grande moviola, antiga mesa de montagem e edição de filmes. A sétima arte teve seus avanços, mas os equipamentos presentes revelam a história que o espaço carrega na cinematografia no Estado. Há 10 anos, Mônica Kanitz faz parte dessa história da Cinemateca, trabalhando como programadora e, desde o início deste ano, oficialmente como diretora do espaço, subordinado ao Instituto Estadual de Cinema (Iecine), da Secretaria de Estado da Cultura (Sedac).

Ligada à cultura desde criança, Mônica transitava seus interesses pela música, teatro e cinema. Chegou a iniciar a faculdade de Música na UFRGS, mas sempre sonhou em trabalhar com o Jornalismo Cultural, e desenhou sua carreira profissional na área: após se formar na mesma Universidade no curso de Jornalismo, em 1995, entrou na editoria de cultura no Jornal do Comércio, onde trabalhou por 14 anos. Mergulhou no universo artístico e conheceu a parte da gestão cultural no estado com seu primeiro editor, o conceituado crítico de cinema na época Jeferson Barros, e com Hélio Nascimento, crítico que escreve até hoje para o veículo. Na mesma época, passou em um concurso para a Secretaria da Cultura.

Seu gosto pela cinematografia cresceu ainda mais quando viajou para a França em 2009. “Foi um verdadeiro ano sabático dedicado ao cinema”, conta. Com centenas de filmes em cartaz em dezenas de cinemas espalhados pelo país, a cinematografia francesa é reconhecida pela originalidade e dinamicidade, valorizando principalmente os filmes alternativos – assim como a Cinemateca Paulo Amorim, que, de acordo com Mônica, prioriza produções alternativas, independentes e autorais, ao contrário do cinema comercial.

“Não estamos preocupados com o que circula nos shoppings. Trazemos filmes alternativos, e nossa preocupação é sempre trazer uma programação mais diversa”, explica.
Quando retornou da França, Mônica recebeu o convite do então diretor do Iecine, Luiz Alberto Cassol, para ser programadora da Cinemateca Paulo Amorim. Para ela, era um grande desafio. “Mas abracei com muito carinho e responsabilidade”, diz. Está lá até hoje.

Retrospecto

A história da Cinemateca carrega um capítulo importante na cultura cinematográfica do estado. Em 1984, no antigo Hotel Majestic, foi inaugurada a sala de Cinema Mario Quintana, idealizada pelo então subsecretário de Estado da Cultura, Paulo Amorim. Quando ele faleceu, a sala foi batizada com seu nome, em 1986, como a Cinemateca Paulo Amorim. 

O primeiro programador da Sala de Cinema foi Romeu Grimaldi – quem, conta Mônica, trouxe o perfil dos filmes independentes e de outros lugares para a programação do espaço. Quando estava na faculdade, ela marcava presença constante na Cinemateca, e ainda guarda lembranças das grandes conversas com o programador. 

Em 1987, quando a Casa de Cultura Mario Quintana já estava aberta, além da sala Paulo Amorim foi inaugurada a sala Eduardo Hirtz. Cineasta alemão, Hirtz foi pioneiro da cinematografia gaúcha e dirigiu o primeiro filme de ficção no estado. Em 1995, foi inaugurada a terceira sala, Norberto Lubisco, em homenagem ao fotógrafo porto-alegrense que marcou a produção cinematográfica gaúcha por décadas, e foi um dos diretores de fotografia mais premiados no Festival de Gramado.

Uma diversidade de filmes e horários para assistir é o mote da Cinemateca, atesta Mônica. “É frequente as pessoas me dizerem que sabem que vão chegar aqui e vai ter um filme que vão gostar”, relata. A presença e a faixa etária do público costuma alternar nas salas dependendo do dia e horário. “Às vezes, de tarde só aparecem cabecinhas brancas”, comenta. A diretora destaca a parceria com as distribuidoras de do Rio de Janeiro e São Paulo – como a Vitrine Filmes, que estreou “Noites Alienígenas”, longa-metragem produzido no Acre e que está na Cinemateca atualmente.

Como programadora, Mônica busca atualizar constantemente os filmes em cartaz, mas alguns permanecem por mais tempo – como “Aftersun”, que entrou na programação em 15 de dezembro de 2022 e saiu apenas no final de fevereiro deste ano. “Sempre tinha muita gente para assistir”, justifica. “Marte Um” permaneceu por mais tempo: de 25 de agosto de 2022 até janeiro deste ano. “Tirei por duas semanas porque tinha outros filmes para colocar, e o pessoal reclamou e pediu para eu colocar de volta. No que colocamos, lotou a sala”, conta Mônica. “O filme fica em cartaz o tempo que ele tiver que ficar. Enquanto tiver público, vai ficando”, diz ela sobre avaliar a permanência da programação conforme a presença do público.

Além da programação pensada semanalmente, a Cinemateca também promove sessões especiais – como a que ocorrerá em abril para comemoração aos 15 anos da Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (ACCIRS). Os festivais também estão na coletânea: a diretora destaca o Fantaspoa, o Festival de Filmes Italianos, a Mostra Eco Falante, o Festival de Roteiro Audiovisual de Porto Alegre (FRAPA), Cinema Negro em Ação, entre tantos outros idealizados em conjunto com o Iecine.

Mônica projeta para o segundo semestre deste ano atividades educativas para crianças de escolas estaduais com filmes voltados à infância e adolescência. Destaca as sessões acessíveis, com audiodescrição, por exemplo. E seguir pensando em uma programação que traga "outro olhar para o cinema".

Em 2019, a Sala Eduardo Hirtz passou por reformas, através de um projeto da Lei Federal de Incentivo à Cultura (Lei Rouanet), por meio da Associação dos Amigos da Cinemateca Paulo Amorim (AACPA). Foram revitalizados o sistema de projeção digital, carpete e poltronas. Recentemente, foi a vez da Sala Paulo Amorim, que reabriu em março, mas ainda passará por substituição das poltronas. Restará a reforma na sala Norberto Lubisco, que acontece em breve, projeta a gestora.

Feliz pela confiança na atividade que assumiu há 10 anos, Mônica deseja seguir oferecendo um "bom cinema" ao público, e sempre aberta a novos parceiros nas salas, públicas, de cinema voltadas para a produção cultural alternativa. E complementa: "o fato de termos muitas mulheres nas coordenações valoriza o potencial que a gente tem. Todas são gestoras super competentes, e já fizeram muito pela cultura do Rio Grande do Sul", diz, destacando o papel da secretária de Cultura Beatriz Araujo quem, nas palavras de Mônica, "veio com um olhar muito querido para todas as instituições".

Para a diretora, o cinema, além de entretenimento é reflexão, e leva as pessoas para lugares que possivelmente jamais conheceriam. “O cinema é tão importante para tratar de preconceitos, questões sociais, de poder, relações interpessoais. Tudo isso o cinema coloca em debate e vai se apropriando, com temas que até anos atrás não apareciam”. Ele traz, enfim, sensações que só a tela grande pode proporcionar.

 Programações da Cinemateca Paulo Amorim para abril e maio

  • Abril

05/04 - Estreia de "O Pastor e o Guerrilheiro", com direção de José Eduardo Belmonte. Programação de comemoração aos 15 anos da Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul.
13/04 - Sessão especial em comemoração aos 75 anos do Clube de Cinema de Porto Alegre.
14 a 30/04 - Fantaspoa 2023.

  • Maio

Estreia de dois longas-metragens gaúchos:
"A Primeira Morte de Joana", com direção de Cristiane Oliveira
"Olha pra Elas", com direção de Tatiana Sager

* Sob supervisão de Luiz Gonzaga Lopes


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