Show de metal cancelado aconteceria hoje

Show de metal cancelado aconteceria hoje

A banda Mayhem iria tocar para tocar no Bar Opinião, mas show foi suspenso devido à polêmica sobre nazismo

Caroline Guarnieri *

Banda norueguesa de black metal Mayhem que teve seu show de hoje no Opinião cancelado por protestos antinazistas

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O grupo de black metal norueguês Mayhem estava com show marcado para hoje no Bar Opinião, na Cidade Baixa. Após uma série de postagens nas redes sociais, inclusive com envolvimento do deputado estadual Leonel Radde (PT), indicando que a banda teria envolvimento com posturas de apologia ao nazismo, o show foi cancelado. Em nota, as produtoras envolvidas declararam que não queriam colocar o público, a banda e a equipe em risco. 

Na última terça-feira, 14, o professor de filosofia Renato Levin Borges, ou Judz, como é conhecido nas redes sociais, denunciou a banda no seu perfil, citando eventos que poderiam provar a ligação do Mayhem com o neonazismo. Já na quarta-feira, Radde publicou um vídeo resumindo os fatos e pedindo o posicionamento da Ablaze Productions, que trouxe a banda à cidade, e da Opinião Produtora, responsável pelo Bar Opinião. A publicação viralizou nas redes sociais e recebeu apoio de coletivos antifascistas, além de críticas de fãs.

Na noite de quinta, 16, as produtoras cancelaram o show, em notas publicadas nas redes sociais. A banda também escreveu uma nota, enviada à redação. O caso gerou polêmica na internet e divide opiniões de especialistas e apreciadores do gênero musical.

Histórico da banda

A Mayhem, criada em 1984, é considerado uma das bandas que fundou o black metal norueguês, ou black metal por excelência, como conta Gustavo Matte, doutor em literatura da PUCRS e professor do curso on-line “A história do metal: formação da cultura metaleira e sua estética musical”, de 2022. 

Ele explica que o metal surgiu dentro do rock a partir da decadência das pautas da juventude hippie da década de 1960. Jovens europeus que viviam nos subúrbios de cidades industriais trouxeram uma “energia catastrófica” para a cena, formando um som com linguagem própria. Ao longos da década de 1980, o metal se tornou cada vez mais famoso nos países de ancestralidade germânica, principalmente na Península Escandinava.

Esses países tinham uma memória mais viva das tradições pagãs porque foram influenciados pelo cristianismo mais tarde do que o resto da Europa. Matte explica que “o metal entra como forma de veicular uma ideia de pertença folclórica”.

O black metal, por sua vez, costuma ter expressões mais extremas. Desde a sua fundação, o Mayhem acumula polêmicas. O professor de antropologia da PUCPR e pesquisador de heavy metal Leonardo Campoy conta que a história dos astros está marcada por suicídio, assassinatos e outras atitudes criminosas.

O antigo vocalista Dead, que entrou em 1988, cometeu suicídio em 1991. Euronymous, guitarrista e fundador da banda, encontrou seu corpo e tirou uma foto, que posteriormente virou capa de um disco do grupo. Dois anos depois, Varg Vikernes, também da banda, assassinou Euronymous a facadas. 

Vikernes é o único músico que já participou da banda que é declaradamente nazista. Ele saiu da formação quando foi condenado a 21 anos de prisão. O baixista tem envolvimento com discursos neonazistas até hoje. Burzum, outra banda da qual fez parte, é considerada parte do movimento NSBM (“national socialist black metal”, designação dada a bandas de extrema direita que combinam crenças fascistas, antissemitas, racistas e homofóbicas).

O resto da banda, porém, nunca fez declarações assumindo explicitamente um posicionamento nazista, pelo menos até onde os pesquisadores sabem. Os símbolos utilizados pelo grupo em roupas e decorações, e considerados apologia ao nazismo, serviam somente como “provocação estética e artística”, segundo os próprios membros. Foram essas atitudes que Judz e Leonel Radde apontaram em suas manifestações.

Leonardo Campoy acredita que é um erro “fazer associação explícita e direta” da banda com o nazismo. O pesquisador ressalta, porém, que a situação é mais complexa do que pode parecer na superfície. “Se por um lado a gente não pode cravar que a banda é nazista, membros da banda deram essas declarações em momentos diferentes da história da banda”. Ele crê que isso não ficou completamente no passado.

O historiador e antropólogo Alexandre de Almeida, pesquisador de direitas underground, foca o seu trabalho no supremacismo das bandas skinheads do Brasil. Ele comenta que esse tipo de manifestação era comum na cena da época. “O nazismo ganhou relevância para alguns desses jovens, embora também houvesse membros que simpatizassem com a esquerda radical”, explica.

Movimentos sociais fizeram protestos com cartazes contra a banda no final da semana passada defronte ao Opinião | Foto: Victória Farias / Divulgação / CP

A apologia ao nazismo − ou a não negação da mesma − carrega seus próprios perigos. Cecilia Cohen, educadora de história da arte e mediadora do Museu Yad Vashem (Museu do Holocausto), em Jerusalém, concorda. “Com a apologia ao nazismo, você normaliza o discurso de ódio contra minorias, ele vira aceitável, você banaliza a violência”. Ela explica que até hoje existem vítimas do nazismo.

O assunto está longe de alcançar um consenso. Leonardo Campoy resume: “até que ponto o acionamento estético de elementos acaba não sendo também um acionamento político e social?”. 

Shows

Com duas datas da turnê pela América Latina anteriormente previstas para o Brasil, depois do cancelamento do show em Porto Alegre, resta apenas a apresentação do Mayhem em Brasília, prevista para amanhã, 22. O Ministério Público do Distrito Federal entrou com um pedido para suspender o evento. O cancelamento não havia sido oficializado até o fechamento desta matéria.

Confira as notas

  • Opinião Produtora
  • Ablaze Productions

  • Banda Mayhem

O Mayhem é uma entidade não política com milhares de fãs ao redor do mundo, com todos os tipos de experiências e todos os tipos de crenças, idéias e preferências, e todo fã do Mayhem é tratado com o mesmo respeito. Nem a banda ou nenhum de seus membros apoiam o racismo, a homofobia ou qualquer outro “crime de ódio”. Cada pessoa nesse mundo vive e tem que responder por seus atos, ações e ideias e serão julgados de acordo; qualquer forma de julgamento meramente baseada na vivência de uma pessoa, na sua cor de pele, preferência sexual ou qualquer coisa que eles não possam ter o controle a respeito é um ato de fraqueza e será rejeitado pela banda.

Qualquer fã de Mayhem é bem-vindo nos shows, independente de suas vivências, crenças ou orientação, desde que eles não perturbem os outros. O Mayhem acredita em maximizar seu potencial e libertar sua mente de pensamentos e ideias opressivas. Qualquer um ou qualquer coisa que diminua você é seu verdadeiro inimigo. Conceitos mundanos e questões sociais estão abaixo da liberdade da mente.

Jan Axel & Mayhem

Repercussão

A família do deputado Leonel Radde (PT) recebeu ameaças após a denúncia acerca do show. Ele compartilhou nas redes sociais a mensagem que a sua filha recebeu. A família já prestou queixa à polícia e o caso está sendo apurado pelas autoridades. Confira:

* Sob supervisão de Luiz Gonzaga Lopes


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