Teatro documentário “A Noiva da Lagoa” estreia na Sala Qorpo Santo

Teatro documentário “A Noiva da Lagoa” estreia na Sala Qorpo Santo

Espetáculo aborda a violência contra a mulher e o feminicídio a partir de uma lenda urbana

Leticia Pasuch *

A peça, com direção de Xico de Assis e cenografia de Lilian Maus, tem seu fundamento na lenda da noiva da Lagoa dos Barros, que remete a um importante caso de feminicídio do Rio Grande do Sul

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O espetáculo de teatro documentário “A Noiva da Lagoa” estreia nesta sexta-feira, 16, e segue em cartaz nos dias 22, 23, 29 e 30 de junho, às 19h30min, na Sala Qorpo Santo, no Campus Central da Ufrgs (av. Paulo Gama, 110). As apresentações gratuitas contam com a direção de Xico de Assis e dramaturgia de Laura Retamar, Luiza Escandiel e Verônica Becker. A peça tem seu fundamento na lenda da noiva da Lagoa dos Barros, que remete a um importante caso de feminicídio do Rio Grande do Sul.

Sobre o caso

 Era 17 de agosto de 1940. A estudante de Artes Maria Luiza Haüssler, de 16 anos, estava decidida a terminar o relacionamento com seu namorado Heinz Werner João Schmelling, então com 19 anos. Em um baile de gala na Sociedade Germânia, a jovem dançou com vários rapazes, e o namorado, com ciúmes excessivo, a chamou para ir embora consigo do baile. No dia seguinte, Heinz foi encontrado com um tiro de raspão na lateral do peito, e Maria Luiza estava desaparecida. Ele acabou declarando à polícia que a namorada havia tentado o matar e, após, cometido suicídio. Ele, então, teria ocultado seu corpo na Lagoa dos Barros, entre Santo Antônio da Patrulha e Osório. Mas, com as investigações da época, o cadáver da jovem foi encontrado amarrado com tijolos, com a descoberta de que Heinz era o autor do crime premeditado.

O caso estampou as matérias dos jornais da época e chocou a população do Estado. Com a repercussão da história real, surgiu a lenda que, nas águas turvas da misteriosa Lagoa dos Barros, onde Luiza foi encontrada morta, uma noiva vestida de branco aparecia para pescadores e caminhoneiros que percorriam as margens da BR-101.

O diretor do espetáculo, Xico de Assis, relata que a ideia surgiu a partir de uma disciplina de atuação no Departamento de Artes Dramáticas da Ufrgs. Juntou-se a Lilian Maus, artista visual e cenografista da peça, que tem uma trajetória de pesquisa sobre o caso.

A montagem da peça contou com uma ampla pesquisa documental, principalmente do jornalista Rafael Guimaraens, autor da obra “A Dama da Lagoa”. Em formato de teatro-documentário, modalidade que une documentos históricos de fatos reais à encenação e dramaturgia da lenda, a peça conta com relatos de mulheres acolhidas pelo Projeto Borboleta, grupo do Foro Central de Porto Alegre, que promove o apoio a vítimas de violência doméstica. Verônica Becker, uma das atrizes da peça, conta que o espetáculo passou a ser visto como um instrumento de voz para outras mulheres além de Maria Luiza. “Como mulheres, a gente se identifica muito com uma série de questões da vida uma da outra, inclusive sobre as questões de abuso”, relata. 

As três atrizes da peça alternam os papéis dos personagens da história e interpretam três versões de cada um. Foto: Eliza Pierim / Divulgação

A cena

As três atrizes alternam os papéis entre os personagens da história, que terão três versões de cada. Para Verônica, a experiência de transição ao incorporar até a figura do assassino, proporciona uma visão mais ampla da história. “Sair do lugar da personagem que é a vítima e entrar no personagem abusador, o algoz, é um processo bem forte. Tem que virar a chave rápido, e a gente entende melhor a Maria Luiza por também interpretarmos o Heinz”, relata.

Para a criação do cenário e do figurino, a artista Lilian Maus, frequentadora e pesquisadora da Lagoa dos Barros, inspirou-se na paisagem do local onde aconteceu o crime de 1940. De acordo com a cenógrafa, a realidade e a fantasia da lenda urbana são costuradas, e leva o espectador a enfrentar o tema da violência contra a mulher, que atravessa os tempos. Prevalecem os tons azuis-esverdeados, da região, passando para o vermelho sangue e os tons mais pesados. “As metamorfoses em cena são dinâmicas e o figurino traz essa versatilidade e espanto ao palco, sensibilizando e convidando o público a reconstruir as pistas para desvendar os mistérios dessa lenda urbana”. A iluminação, de Carmem Salazar, intercala sombras, ângulos insólitos e tons noturnos com momentos de luz documental, branca e fria.

O processo criativo do cenário e figurino partiu de parcerias com profissionais colaboradores de causas sociais e ambientais. Os materiais artísticos são, em sua maioria, formados por restos de tecidos, roupas de brechó e redes de pesca. Máscaras denominadas neutras ou mortuárias são usadas pelas atrizes em alguns momentos da encenação para reforçar os aspectos fantasmagóricos da peça. Para o diretor, com a ausência da expressividade facial, as expressões corporais auxiliam o espectador a induzir e estimular a imaginação.

Em julho, serão realizadas apresentações em Santo Antônio da Patrulha e Osório, cidades que dividem a Lagoa dos Barros, além de Alvorada, Canoas e Guaíba. O projeto, que conta com o financiamento Pró-Cultura – RS FAC, terá, ainda, um eixo educacional com seminário sobre prevenção da violência contra a mulher e oficinas de Teatro Fórum sobre o tema do feminicídio e prevenção da violência doméstica.

* Supervisão de Luiz Gonzaga Lopes


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