Vinil na porta de casa

Vinil na porta de casa

Primeiro clube destinado a apreciadores do bolachão embarca em um mercado em ascensão

Rafa Martins

O conjunto da obra no trabalho com a Banda do Mar: vinil exclusivo e a revista especial

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Fazer uma assinatura, pagar mensalidade e receber um disco de vinil escolhido a dedo por uma curadoria. Em tempos de disseminação da música digital através dos cada vez mais acessíveis serviços de streaming, a proposta pode parecer bastante arriscada. Contudo, após duas edições de sucesso pleno, o Noize Record Club, o primeiro clube de vinil da América Latina, vem ganhando diversos adeptos pelo país, mergulhando de cabeça em um mercado em notável ascensão.

Lançada em setembro do ano passado, a primeira edição do projeto trouxe o disco “Antes que tu conte outra”, dos gaúchos da Apanhador Só. O trabalho, editado em CD em 2013, figurou entre listas e mais listas dos melhores discos daquele ano. “Sempre tivemos vontade de lançar esse álbum em vinil, mas acabávamos limitados pelo alto investimento que o formato exige”, revela Felipe Zancanaro, guitarrista da banda, que viu no clube a oportunidade que faltava para viabilizar o desejo. O resultado foi acima do esperado, já que as 320 cópias da tiragem encomendada esgotaram em pouco tempo.

A aceitação imediata do público é bem compreensível. Além do ineditismo da ideia no país, a comodidade aliada a uma curadoria de peso são ingredientes poderosos para quem percebe a música como experiência. Na prática, para se tornar sócio, o assinante paga R$ 204 e tem direito a três edições, que são trimestrais. O conjunto, recebido na porta de casa, contém um LP selecionado pela curadoria do clube e uma revista destrinchando a obra. E apesar do termo “clube” remeter a uma interpretação excludente, nada tem a ver com a intenção do projeto. Tanto que o leitor tem a opção de comprar apenas o título de seu interesse, sem a assinatura. Nesse caso, o preço por edição sobe para R$ 88, que ainda assim é um valor competitivo em relação ao praticado em lojas especializadas, que giram em torno de R$ 100.

• Bolachão para iniciantes

Rafael Rocha, diretor de criação da Revista Noize, publicação gaúcha responsável pelos lançamentos, explica que a escolha dos títulos é feita por uma equipe do núcleo editorial da revista, que já circula há oito anos em Porto Alegre. São eles que também trabalham na concepção do material complementar. “Muito mais do que a banda, damos atenção à obra, pois o conjunto tem que ter um conteúdo interessante", informa.

Para o segundo lançamento, em dezembro do ano passado, o clube quase dobrou o número de exemplares em relação ao primeiro e investiu em um artista já contratado de uma grande gravadora, a Banda do Mar. A versão em bolachão do primeiro disco do trio, formado por Marcelo Camelo, Mallu e Fred Ferreira, repetiu o feito da Apanhador Só e esgotou em tempo recorde. Rafael sabe que os dois discos, sendo exclusivos, ganham uma notoriedade natural, mas nem por isso descarta outras possibilidades de lançamentos: “Os dois álbuns lançados eram inéditos em vinil, mas temos a intenção de trabalhar também com reedições, inclusive de artistas estrangeiros”, antecipa. Ele ainda afirma que o conceito também está borbulhando entre as bandas em ascensão, que têm procurado a revista para lançar seus trabalhos através do clube. “O interesse desses artistas é importante, pois a nossa proposta também envolve trabalhar com bandas que, mesmo tendo uma gravadora, como a Banda do Mar, tenham uma postura independente”.

Em casa

O conceito de receber a revista e o disco na porta de casa caiu no gosto de muitos amantes do vinil espalhados pelo país. Hoje o Noize Record Club já conta com 350 assinantes, incluindo o paulista Raul Azurduy, de 23 anos. Ele ficou sabendo do clube pela internet e, mesmo sem conhecer a revista, apostou na ideia. “O que mais me chamou a atenção foi a possibilidade de descobrir músicas novas no formato antigo", comenta o estudante de arquitetura, que fica na expectativa por cada lançamento. “Rola um receio de receber algo que não agrade, mas se você está com a mente aberta para sons novos, é incrível. E a música não acaba quando o disco termina, pois você ainda tem a revista para complementar!”. Já Paula Marinho, 26 anos, que mora em Santa Catarina, elogia a curadoria por sua diversidade e enxerga o clube como uma alternativa para sair da mesmice. “A experiência em si é bem legal, acaba tirando um pouco da zona de conforto, sendo uma forma de consumir música boa de fontes diferentes”, garante.

Bolachão em alta

O sucesso do Noize Record Club pega carona em um mercado em vertiginoso crescimento. Em 2014, a venda de vinis atingiu o ápice nos Estados Unidos desde o seu revival: 9,2 milhões de unidades vendidas, o que significa um aumento de 52% em relação ao ano anterior. “Lazaretto”, de Jack White, alcançou a soma de 60 mil exemplares comercializados no país, marca que havia sido atingida pela última vez com “Vitalogy”, do Pearl Jam, duas décadas atrás.

Por outro lado, os serviços de streaming como o YouTube e o Spotify também seguem a todo vapor, com evolução de 54% no ano passado. Em um cenário onde dois extremos se destacam, é natural para o artista o interesse em trabalhar com ambos formatos. “Sempre tivemos a postura de liberar nossos discos na rede, o que não impede que um lançamento em vinil seja interessante”, comenta Zancanaro, que enxerga essa multiplicidade de opções como um ponto a favor no cenário musical. “Acredito que um formato acaba complementando o outro, dependendo do modo como o público se relaciona com a música e com o artista”, conclui.

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