Heróis anônimos

Heróis anônimos

Por Gilberto Jasper*

Gilberto Jasper

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Sou leitor assíduo dos obituários de jornal. Não sou mórbido ou sádico. É que nesta seção é possível descobrir heróis anônimos, pessoas que honraram a condição humana, fizeram o bem e que, por isso, deixaram saudades através do exemplo. Certamente todos tinham defeitos, mas as virtudes ganharam de goleada. Há poucos dias conheci a história de dona Glória Prass, de Maratá , no Vale do Caí. Ela nos deixou aos 80 anos de idade. O texto de jornal revelava que ela tinha facilidade para alfabetizar, o que já constitui um dom raro. Tamanha paixão pelo magistério fez com que ela lecionasse até os 70 anos. 

A breve biografia revela que fora da sala de aula ela ensinava as crianças a nadar, levando a gurizada para uma cachoeira da região. Dona Glória, além disso, era uma pessoa muito religiosa, catequista e ministrava aulas de crisma. Seus filhos relatam que ela levava turmas da escola para ajudar no ajardinamento da gruta Nossa Senhora de Lourdes, local de visitação pública.

Arrisco dizer que dona Glória jamais foi agraciada com alguma medalha ou qualquer outra honraria em vida, apesar dos inúmeros talentos e generosidade que deixou como legado. Talvez algum vereador ou prefeito corrija esta injustiça ao propor uma rua ou avenida com o nome desta heroína como homenagem.

A família também revela que dona Glória adorava datas como Natal e Páscoa, quando por certo ela fortalecia seus talentos. Já aposentada, mantinha inúmeras atividades, como a dedicação à pintura de panos de prato para a igreja e de casinhas para pássaros espalhadas pela cidade. Levava uma vida simples, longe dos holofotes da fama, como todos os heróis da vida real.

Provavelmente a nossa personagem era pouco conhecida fora dos limites da comunidade em que viveu discretamente por oito décadas. Os privilegiados que conviveram com Glória Prass viam, todos os dias, uma pessoa comprometida somente em fazer o bem, espalhando generosidade para mostrar que vale a pena, sim, ser “uma pessoa do bem”.
Longe de notoriedade ou ânsia por reconhecimento público, tão comum neste mundo das redes sociais, a octogenária de Maratá passou pela vida para deixar um rastro de inspiração. Nestes tempos em que viceja a intolerância, dona Glória é grata exceção que conheci, mesmo que à distância, graças à leitura de seu obituário. 

*Jornalista


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