O secretário, o Estado e a guerra

O secretário, o Estado e a guerra

Por Marcello Vernet de Beltrand*

Marcello Vernet de Beltrand

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Ciclos históricos são dinâmicos e imprevistos. Mundo afora, peritos em cenários se sucedem em prever o futuro. No século 21, a liderança global segue tema tonitruante no xadrez internacional. E o aluno mais aplicado da classe na “escola” da liderança ainda atende pelo nome de Estados Unidos. Motivos sobejam. Um deles está no século 20, quando os EUA se tornaram um império global, título que já foi da Inglaterra. Sendo império, cuidar das relações de poder e dos negócios nas colônias é imposição, jamais escolha.

Desde o final de 1940, série histórica de secretários de Estado plasmou a geopolítica. Titulares da segunda cadeira na estrutura de poder dos EUA – alguns dizem a primeira – magnetizaram os holofotes por onde andassem. É fácil ter uma short-list do time: George Marshall, no final dos anos 40, Henry Kissinger (astro na função), George P. Shultz, James Baker, Colin Powel, Condoleezza Rice e John Kerry. Todos frequentaram os sofás do poder global. Republicanos ou democratas ocuparam a cena política, ora duelando na guerra fria com a Rússia, ora em conflitos bélicos por territórios e suprimentos de energia no Oriente Médio, temas que aturdiram o planeta.

O último capítulo da série está na Ucrânia, onde o império deparou com um consórcio de forças no norte da Europa, na Rússia, e no centro nervoso econômico da Ásia, na China. Embaraçando o cenário, a Índia, por sua estatura demográfica, aponta no retrovisor. As outrora colônias alinhadas já têm autodeterminação para mover suas peças.

Um fator sobrepesa a favor do modo americano de liderar. O pensador austríaco Peter Drucker, que fez a vida qualificando o conhecimento estadunidense sobre excelência empresarial, ensinou que “a cultura almoça a estratégia no café da manhã”. Cultura como modelo mental, cujas raízes alcançam a arte, cinema, literatura, música, arquitetura, educação e inovação. Assuntos em que os EUA têm protagonismo.

Há fatos novos no tabuleiro. Nunca tantos jogadores de elite entraram no clube da luta sob uma diplomacia empalidecida e com a faca nos dentes. Organismos multilaterais e líderes ocidentais perderam a força e já são olhados de lado por Sergei Lavrov, o austero chanceler de Putin.

É forçoso lembrar que Pedro, o Grande, ergueu São Petersburgo, em 1703, de frente para Europa, como a buscar os ventos do Velho Mundo, continente que Vladimir Putin já olha com desídia. Enquanto isso, o dragão chinês observa a tudo da muralha. Com um olho no gato, outro no rato e os dois no mercado. O teatro da guerra ferve.

Jornalista e mestre em Administração*


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