Por que os médicos escrevem

Por que os médicos escrevem

Por: André Pereira*

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Os médicos traçam muitos diagnósticos na tentativa de explicar a caudalosa linhagem de escritores de jaleco no Brasil e particularmente no Rio Grande do Sul, onde pontificam os nomes de Moacyr Scliar, Dyonélio Machado, Aureliano de Figueiredo Pinto, Cyro Martins, Mário Totta e Ramiro Barcellos, entre outros de reconhecimento nacional e mesmo além-fronteiras. O cardiologista Waldomiro Manfroi, que lançou a 11ª obra na 68ª Feira do Livro de Porto Alegre, no dia 14, é cirúrgico na definição da escolha pelo segundo ofício. "Os médicos são perdedores", diz ele. "Porque perdem vidas de pacientes e assim escrevemos ficção para criar personagens que se imortalizam”. A sua própria experiência pessoal contribuiu fortemente para a decisão de assumir a carreira de escritor aos 55 anos, deixando definitivamente de sufocar a paixão pela literatura do menino nascido em Nova Bréscia há 85 anos.

Conta ele que escapou "de uma terrível situação de saúde que, segundo meus colegas, eu não teria volta. Ao não morrer, decidi: ou realizo meu sonho de escrever ficção ou minha vida será incompleta". Agora, brinda os leitores com o romance "Sempre foi assim. Assim sempre será?", que a escritora Jane Tutikian define como "uma excelente leitura para quem quiser tocar na parte “submersa das geleiras” (lembramos aqui Piglia). É porque os melhores textos são esses que nos sugam para dentro da realidade representada e da nossa própria realidade. É um texto instigante e prazeroso".

Se possui uma tese consolidada sobre os motivos que obrigam um médico a escrever, Manfroi é generoso divulgador dos colegas de sina literária. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras e orador oficial da Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina, faz frequentes alusões às vocações alheias, valorizando os doutores que publicam livros. Na obra "Médicos Escritores" (Editora Buqui, 2013), ele lista 41 autores daqui (e d’além-mar, como o inspirador pioneiro Hipócrates) que compartilham a atividade na área da saúde e consistente jornada literária nos gêneros romance, conto e teatro. Entre os gaúchos, ele elege contemporâneos, como Blau Fabrício de Souza, Nilson Luiz May, Roberto Gastal Xavier, Gilberto Schwartsmann, Franklin Cunha, Carlos Henrique Menke, que muitos pacientes só conhecem nos consultórios e nos hospitais.

*Jornalista


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