O mito antes da fama

Quando decidiu fazer um filme sobre Renato Manfredini Jr., conhecido como Renato Russo, da banda Legião Urbana, o cineasta Antônio Carlos da Fontoura se viu frente a vários desafios. Entre eles, a trilha sonora, visto que se tratava de um filme sobre um músico que ganhou fama de mito no rock nacional. Ao entrar em contato com Carlos Trilha, que trabalhou na produção de CDs de Renato Russo na sua fase solo, recebeu uma exigência. Trilha disse que só aceitaria o trabalho se todas as canções apresentadas no filme fossem captadas ao vivo. Ou seja, todos os atores envolvidos teriam de tocar os instrumentos e cantar em cena. Nada de playback. E assim foi feito.
Este é, certamente, um dos pontos em que a produção acertou. As músicas interpretadas ganharam veracidade e ajudaram a “contaminar” a equipe com a atmosfera do período. O filme conta cinco anos da vida do artista, de 1976 a 1982, tempo anterior à sua fama. Por isso, não pode ser considerado uma biografia, mas sim um recorte em sua adolescência. O próprio ator que o interpreta, Thiago Mendonça, admite: “Renato é muito mais do que o filme mostra, era muito intenso”.
Neste ponto de vista, o filme atinge seu objetivo, visto que não seria possível em duas horas contar todas as faces de um artista tão complexo. O longa-metragem consegue captar um pouco da mescla que fez a banda Legião Urbana ser um sucesso. O som influenciado pela energia do punk e do rock britânicos encontrou eco em uma geração que vivia sob a ditadura ou no período da abertura política. Ao mesmo tempo, a poesia de Renato também falava de temas como amor, medo e justiça social. Os músicos contemporâneos de Renato na Legião Urbana, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, não estão em cena, mas leram o roteiro e apoiaram o projeto. O filho de Dado Villa-Lobos, Nicolau, faz o papel do pai. “O filme foi feliz em retratar aquele momento”, opinou Bonfá.
A melhor amiga de Renato no filme, Ana Cláudia, vivida pela ruiva Laila Zaid, não é inspirada em uma pessoa real. Mas resultado de uma mistura de três amigas do artista.
As imagens iniciais do filme, que mostram carros antigos na capital federal, são reais e foram obtidas de um documentário que o diretor fez em 1982, “Brasília Segundo Alberto Cavalcanti”. Exceto cenas de estúdio, o longa teve várias sequências rodadas em Brasília ou Paulínia.

Curiosidades

- Antes de formar o grupo Legião Urbana, Renato Russo formou a banda Aborto Elétrico em Brasília, ao lado dos irmãos Flávio e Fê Lemos, influenciados especialmente pelo punk da banda britânica Sex Pistols.
- Quem interpreta Fê Lemos no filme “Somos Tão Jovens” é o ator, cineasta e músico Bruno Torres. Fê Lemos fazia camisetas, que vendia na universidade, e cartazes da banda de modo praticamente artesanal. Para “entrar no personagem”, Torres declarou, em entrevista, que também aprendeu a fazer serigrafia. Por isso, no figurino, ele usa camisetas feitas por ele mesmo, ao estilo da época ou pelo próprio Fê Lemos.
- Um embate de temperamentos explosivos ou, como alguns interpretam, uma disputa pela liderança da banda entre Renato Russo e Fê Lemos fez com que o Aborto Elétrico acabasse. Seus membros deram origem a duas bandas, que se tornaram emblemáticas do rock brasileiro nascido em Brasília: Capital Inicial (ainda em atividade) e Legião Urbana.
- Quem faz o papel do guitarrista Dado Villa-Lobos é o seu filho na vida real, Nicolau Villa-Lobos. “Não sou ator, mas foi legal participar do projeto”, disse Nicolau, 25 anos, que estuda Cinema no Rio de Janeiro e é jogador de pôquer profissional. Ele ensaiou um pouco com o pai.
- O filme “Somos Tão Jovens” teve apoio da família de Renato Russo, que ajudou a reconstituir a casa e o quarto onde o cantor viveu a adolescência (este repleto de cartazes e fotos de bandas). A irmã do músico, Carmen Manfredini, faz uma ponta no início do filme, como uma transeunte que o socorre quando o personagem cai de uma bicicleta. No filme, ela é interpretada pela atriz Bianca Comparato.